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Enem Digital

Estudantes relatam que Enem Digital estava mais fácil que o impresso

Segundo professores, a prova manteve o mesmo nível de dificuldade, mas com abordagens diferentes e participantes da versão impressa não serão prejudicados

Depois que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) liberou os cadernos de prova do primeiro dia do Enem Digital, aplicado no último domingo (31/1), inscritos na versão impressa compararam as questões e, nas redes sociais, muitos demonstraram acreditar que o teste feito no computador foi mais fácil.

Assim, há estudantes que temem ser prejudicados na nota ao concorrerem com participantes que fizeram a versão digital. Cerca de 34,5 mil pessoas (apenas 32% do número de inscritos) participaram do primeiro dia do Enem Digital, quando foram aplicadas as questões de linguagens e ciências humanas, além da redação, feita por escrito.

O coordenador da Secretaria de Vestibulares do Centro Educacional Católica de Brasília (CECB), Luiz Otávio Marques, tranquiliza os candidatos com relação à pontuação. Apesar de as duas provas serem bem diferentes, a Teoria de Resposta ao Item (TRI), método de correção do Enem que considera o nível de dificuldade dos itens, faz com que as avaliações sejam proporcionais entre os estudantes que fizeram as duas versões.

"A TRI proporciona uma forma de correção que traz para o examinador a possibilidade de comparar o desempenho dos participantes. A ideia é de você medir a proficiência na prova, não só o número de acertos", observa o professor. Isso deve equilibrar os resultados, e o mesmo vale para as outras versões do Enem, como a reaplicação e a aplicação para pessoas privadas de liberdade (PPL).


Arquivo pessoal - A estudante Victória Caroline fez o Enem digital e acredita que o método trouxe mais facilidade para a prova

A estudante Victória Caroline dos Santos, 18 anos, fez o ensino médio no Colégio Atheneu Sergipense de Aracaju, está entre os participantes do Enem Digital e ficou satisfeita com o teste de domingo. “Eu estava esperando uma prova muito boa, muito interessante e minhas expectativas foram bem atendidas", conta.

Para ela, os itens mais difíceis foram os de geografia e os de gramática. Além disso, Victória conta que amou o tema da redação, que foi sobre o desafio de reduzir as desigualdades entre as regiões do Brasil. "É algo que a gente vive diariamente, então eu tinha muito a argumentar", explica.

Por estar acostumada com o uso da tecnologia, por ter começado a estudar a distância durante a pandemia, não sentiu dificuldades para fazer a prova no computador. "Acho até mais fácil do que fazer um teste em papel e não precisei perder tanto tempo marcando gabarito", comenta. A jovem avalia que o modelo otimizou o tempo dos participantes, que não tiveram de reservar um período para passar as alternativas escolhidas para a folha de respostas.

Victória quer usar a nota do Enem para passar em uma graduação de letras-inglês. Ela tem boa expectativa para o próximo domingo (7/2), quando serão aplicadas as provas de ciências da natureza e matemática. 


Cobrança de história do Brasil chamou atenção

 

Arquivo pessoal - Luiz Otávio Marques é professor de história e coordenador da Secretaria de vestibulares do Centro Educacional Católica de Brasília (CECB).

Professor de história e coordenador da Secretaria de Vestibulares do Centro Educacional Católica de Brasília (CECB), Luiz Otávio Marques faz as provas do Enem desde 2017 para avaliar as questões. Ele acredita que o "Enem Impresso foi menos conteudista em relação aos assuntos de história". 

Temas como Primeira Guerra Mundial, Era Vargas e ditadura militar, muito esperados nas avaliações, não apareceram no Enem Impresso. No entanto, houve cobrança de história do Brasil nos itens do Enem Digital. Internautas não deixaram de comentar o assunto nas redes sociais e demonstraram insatisfação pela diferença entre as duas versões.

Confira alguns comentários de candidatos nas redes sociais:

 

Diferentes conteúdos, mesmo estilo

 

Arquivo pessoal - Candice de Almeida, assessora pedagógica de Redação do Centro de Inovação Pedagógica, Pesquisa e Desenvolvimento do Colégio Positivo (CIPP)


Em relação à prova de linguagens, Candice de Almeida, assessora pedagógica de Redação do Centro de Inovação Pedagógica, Pesquisa e Desenvolvimento do Colégio Positivo (CIPP), afirma que a elaboração da prova se deu de forma muito parecida entre as duas versões do exame.

Os testes impresso e digital abordaram questões sociais diferentes seguindo a mesma estrutura. Para ela, enquanto, na versão impressa, houve grande foco em questões sobre a mulher e gênero; na digital, os temas foram mais diversos. “Nesse sentido, foi um pouco diferente, mas a cobrança dos conteúdos é muito parecida.”

Sobre a redação, a docente avalia que a prova manteve o mesmo nível de dificuldade entre os dois temas. O Enem Impresso teve como tema do texto "O estigma associado às doenças mentais na sociedade brasileira". Já, na versão digital, o assunto cobrado foi "O desafio de reduzir as desigualdades entre as regiões do Brasil".

“Claro que um aluno pode dizer 'eu prefiro falar sobre doença mental, porque é mais fácil para mim do que falar sobre desigualdade’, mas aí a gente entra em um viés individual”, ressalta.

Arquivo pessoal - Nataly Vargas achou o tema da redação do Enem Digital mais complexo que o do impresso por, segundo ela, ser menos abordado na mídia

De São José (SC), a estudante Nataly Vargas, 19, inscrita no Enem Digital, considera que o primeiro tema de redação foi mais simples por, segundo ela, estar mais presente na mídia. “Acho que de certa forma mascaram o tema da desigualdade, já o tema da saúde mental é uma situação que ano passado foi muito abordada porque, bom, ninguém estava bem mentalmente”, relata. 

Nataly também acredita que a temática do adoecimento mental é mais frequentemente abordada e em obras audiovisuais em plataformas como a Netflix do que as desigualdades regionais do Brasil. A jovem fez ensino médio integrado ao técnico em comunicação visual no Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC). Ela ainda não sabe o que fará com a pontuação do exame. "Vou ver a nota primeiro para me decidir, mas as minhas principais opções de curso superior são gastronomia, jornalismo e teatro", conta.

A estudante escolheu fazer o Enem Digital pela "praticidade". Comparando a prova impressa com a que ela fez no domingo, Nataly reparou que a primeira quase não teve questões de história e teve muita interpretação. Como costuma ter melhor desempenho em ciências humanas e linguagens, ela está mais preocupada com a prova do próximo domingo.


Arquivo pessoal - Para o professor de geografia Robson Lucas, os conteúdos de história e geografia foram melhor distribuídos no Enem Digital

 

Na opinião do professor de geografia Robson Lucas Caetano, do Colégio Sigma, o Enem Digital teve melhor distribuição entre questões de história e geografia. A geopolítica, que não apareceu no impresso, foi mais abordada na última prova. “Não é que o impresso estava mais difícil, mas ele fez com que o participante tivesse que saber um pouco mais de conteúdo”, explica.

Desafios do novo modelo

Como todo “protótipo”, houve curiosidade e receio envolvidos na primeira edição do Enem Digital. Segundo o Inep, o modelo veio para ficar. A expectativa é de que o número de inscritos na prova feita em computador aumente ao longo dos anos.

Segundo Luiz Otávio Marques, o Enem é uma avaliação de “performance”, mais que de conteúdo. Por isso, na hora de fazer a inscrição, o aluno deve levar em consideração qual modelo se encaixa melhor com a maneira que prefere fazer a prova, seja rabiscar no papel, seja marcar no computador.

As desigualdades regionais que foram tema da redação do Enem Digital também afetam esse formato, pois a inclusão computacional afeta o desempenho no modelo. Enquanto o estado de São Paulo teve 28.625 inscritos e 216 locais de prova na versão da prova feita em computador, Roraima contou com apenas 49 estudantes em dois locais.

Para o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Alexandre Lopes, o instituto começou a “escrever uma nova história do Enem” a partir desta primeira edição do teste digital. Ele acredita que os principais avanços serão nos âmbitos pedagógico e logístico. “A gente pode melhorar a forma como avaliamos nossos participantes, fazendo questões melhores e trazendo toda a riqueza do mundo digital para a avaliação”, afirma.

*Estagiária sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa