Entrevista | Hélvia Paranaguá | secretária de Educação do DF

Volta às aulas sem celular e com desafio para ampliar educação integral e creches

Secretária de Educação, Hélvia Paranaguá, pede apoio da família para o cumprimento da restrição de uso do telefone na sala de aula e reconhece que o maior desafio de 2025 é ampliar educação integral e universalizar atendimento em creches

Pablo Giovanni
postado em 09/02/2025 06:00
Hélvia Paranaguá, secretária de Educação do DF -  (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
Hélvia Paranaguá, secretária de Educação do DF - (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

As aulas na rede pública de ensino começam na segunda-feira (10/2) com uma mudança significativa em relação aos anos anteriores: a proibição do uso de celulares por alunos dentro da escola, tanto em sala de aula quanto nos intervalos. A medida, agora prevista em lei federal, recebeu elogios da secretária de Educação, Hélvia Paranaguá. Em entrevista ao Correio, a gestora avaliou as perspectivas para 2025, destacando a inauguração de novas escolas e o combate à violência dentro de sala de aula, além da meta de zerar a fila de espera por vagas em creches.

Como a Secretaria de Educação se preparou para o início do ano letivo? Houve mudanças para 2025?

O início do ano letivo é sempre um período tenso para nós, porque nunca temos um número exato de novos alunos. Hoje (na última quinta-feira), por exemplo, recebi o pedido de matrícula de três irmãos que migraram para o Distrito Federal, na região de Água Quente, vindos do interior de Goiás. Ou seja, por mais que planejemos com antecedência, sempre somos surpreendidos. Por isso, deixamos a última parcela de matrículas para o fim de março ou início de abril, pois muitas famílias chegam a Brasília ao longo do ano, e os alunos precisam ser integrados à rede pública. A migração para o DF é muito intensa, o que dificulta o planejamento, mas, ainda assim, considero nosso planejamento muito bem estruturado. Em relação à infraestrutura, os livros didáticos já estão nas escolas. Usaremos o mesmo material do ano passado, mas, em 2026, haverá a renovação por meio do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD). Quanto à merenda escolar, os gêneros alimentícios já foram distribuídos, e os perecíveis — como legumes e verduras da agricultura familiar — começam a ser entregues nesta segunda-feira (amanhã), garantindo alimentos frescos para os estudantes.

E quanto à inauguração de novas escolas?

Neste início de ano, entregaremos a Escola Sede Mangueiral e a nova escola bilíngue do Plano Piloto. Atualmente, só há uma escola bilíngue, em Taguatinga, o que dificulta o acesso para famílias que moram em regiões como, Sobradinho, Planaltina e São Sebastião. Com a nova unidade no Plano Piloto, os pais terão a opção de matricular os filhos lá ou mantê-los em Taguatinga, dependendo do que for mais conveniente. Pretendemos iniciar o ano com mais de 30 alunos na nova escola, que está belíssima. Além disso, a unidade de Taguatinga passou por uma reforma para melhorar ainda mais a estrutura.

Qual foi o investimento em infraestrutura, materiais e formação de professores para este ano?

Desde 2021, investimos R$ 1 bilhão em infraestrutura, incluindo reformas, ampliações e construção de novas escolas e creches. Em 2024, o valor investido foi de aproximadamente R$ 200 milhões, sendo R$ 80 milhões destinados à aquisição de módulos escolares, essenciais para garantir mais espaço e conforto aos alunos. Também estamos avançando no programa Horizontes Digitais, que nasceu a partir das dificuldades enfrentadas durante a pandemia. Naquela época, nossos professores não tinham formação para gravar videoaulas, não contávamos com um centro de mídias e muitos alunos precisavam do celular dos pais para estudar. Alguns até recebiam tarefas por motoboy, devido à falta de internet em casa. Hoje, temos um centro de mídia estruturado, onde produzimos videoaulas para apoiar a aprendizagem. Além disso, estamos investindo pesado na modernização dos laboratórios de informática. Antes, dependíamos de doações de computadores antigos, que ajudavam, mas não eram suficientes. Agora, queremos oferecer tecnologia de qualidade nas escolas. Vale lembrar que, no DF, o uso de celulares foi proibido em sala de aula por uma lei federal, o que reforça ainda mais a necessidade de investimento em tecnologia educacional.

Como está a capacidade de atendimento das escolas?

O deficit de vagas continua sendo um desafio, especialmente em regiões de crescimento acelerado, como São Sebastião, Recanto das Emas e Água Quente. Apesar da entrega de novas escolas, ainda não é suficiente para atender a toda demanda. No Plano Piloto, a situação é diferente. Como a população da região envelheceu, a procura por vagas diminuiu. Muitos estudantes que frequentam escolas no Plano moram em cidades como Sobradinho, Guará e Águas Claras, cujos pais trabalham no centro de Brasília. Mas sabemos que o ideal é que as crianças estudem perto de casa. Por isso, estamos buscando terrenos para novas construções, principalmente em áreas de ocupação recente, que muitas vezes não preveem espaços para escolas, postos de saúde ou delegacias. Nessas situações, acabamos precisando transportar os alunos para outras regiões, porque garantir a educação é um dever do Estado.

Como a senhora vê a proibição do uso de celulares nas escolas?

Acredito que essa foi uma decisão muito positiva do governo federal. O DF já tinha uma lei de 2008 que proibia o uso dentro da sala de aula, mas permitia no recreio. Agora, com a proibição total, os alunos terão mais interação e socialização durante o intervalo. As escolas terão autonomia para definir a melhor forma de aplicação da lei, seja recolhendo os aparelhos ou adotando outras medidas. Em unidades com 1.500 alunos por turno, por exemplo, a logística de recolhimento pode ser inviável. Por isso, apostamos mais na conscientização e no envolvimento das famílias para garantir o cumprimento da norma. Vamos precisar muito dos pais, porque é importante que eles participem disso. A família tem o seu papel na educação. Ele (a criança) tem que aprender em casa também os valores, aprender virtudes, a obedecer, a respeitar o professor, o diretor da escola, a tia da merenda, o da limpeza. Os pais precisam olhar a mochila do filho e saber o que eles estão levando para a escola. O que o seu filho está levando para a escola? Tem menino que chega na escola com arma branca. Então, os pais, o núcleo familiar, precisam participar para que a lei seja cumprida.

Há programas para combater o bullying nas escolas?

Sim. Desde o pós-pandemia, observamos um aumento na violência entre os alunos, reflexo do isolamento prolongado. O bullying se intensificou, mas estamos atuando fortemente na cultura de paz. Temos uma coordenação específica para formar professores e promover palestras para os alunos, em parceria com a Delegacia Especializada em Crimes Cibernéticos. O programa Na Moral, coordenado pelo Ministério Público, também trabalha questões de ética, cidadania e combate ao bullying. Além disso, elaboramos uma cartilha para orientar professores e estudantes sobre o tema. Em 2024, já percebemos uma redução significativa dos casos. Solicitei à Polícia Civil um levantamento dos últimos anos para avaliar se nossas ações estão surtindo efeito.

Os alunos podem esperar novidades na merenda escolar?

Sim. Estamos introduzindo bebidas lácteas no cardápio e diversificando as proteínas oferecidas, que incluem carne de boi, frango, peixe, queijo, ovos e carne suína. Lembro que, quando a tilápia foi incluída na merenda, houve certa resistência, pois algumas crianças não tinham o hábito de comer peixe. Mas, com o tempo, elas se acostumaram, e hoje adoram. Nossas nutricionistas inovam nas receitas, como moqueca, tornando a alimentação mais atrativa. Atualmente, são mais de 60 itens no cardápio escolar.

Como está a distribuição de material escolar e uniformes?

O programa Cartão Material Escolar atende a estudantes de baixa renda cadastrados no CadÚnico, garantindo R$ 320 para alunos dos anos iniciais e R$ 230 para os do ensino médio. Isso permite que as crianças escolham seus materiais, promovendo inclusão e dignidade. Já o uniforme é distribuído a 100% dos alunos da rede pública. Atualmente, 60% das peças já foram entregues às escolas, e seguimos avançando na distribuição.

Como está a situação do transporte escolar?

Todas as regiões administrativas do DF contam com transporte escolar, operado pela TCB e pelos ônibus amarelinhos da frota própria. No entanto, ainda precisamos expandir a oferta, pois algumas regiões não têm escolas suficientes para atender a toda a demanda local, forçando os alunos a estudar em outras cidades. Nosso objetivo é continuar construindo escolas para que as crianças estudem mais perto de casa e reduzam a necessidade de deslocamento.

Quais são os principais desafios da educação pública em 2025?

O maior desafio é ampliar a educação integral e universalizar o atendimento em creches. Desde 2019, reduzimos a fila de espera de 24 mil para cerca de 3 mil crianças. A meta do governador Ibaneis Rocha é zerar essa fila até o meio do ano, com a entrega de 15 novos Centros de Educação da Primeira Infância (Cepi) e a construção de mais 11 unidades. Além disso, estamos ampliando o ensino integral, pois cada vez mais famílias querem os filhos na escola em período estendido, participando de atividades que contribuem para seu desenvolvimento.

Como a rede de ensino está estruturada para atender a alunos com deficiência ou necessidades especiais?

Tenho muito orgulho de dizer que somos pioneiros no Brasil por ser um local muito inclusivo. Já recebi gente de muitos estados que vieram para cá. Tem gente que veio morar em Brasília por causa da inclusão, pela forma como nós atendemos as crianças aqui. Temos duas escolas bilíngues de surdos e centros de ensino especial espalhados pelos mais diversos cantos de Brasília, e a gente ainda precisa construir mais alguns, porque há demanda na região de São Sebastião, na região do Paranoá e em Araponga. Então, a gente dá ao pai a possibilidade de ter esses centros, porque, às vezes, a criança precisa de um suporte maior, que o centro tem essa capacidade de oferecer. A inclusão é muito forte no Distrito Federal. Nós temos salas recebendo alunos com as mais diversas necessidades especiais desde o transtorno de deficit de atenção com hiperatividade (TDAH), até crianças com síndrome de Down. Assim, estamos preparados para qualquer deficiência, seja ela física, seja motora. A rede é muito acolhedora, e nossos profissionais são muito preparados.

 


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