Os recentes casos de bullying em escolas públicas do Distrito Federal reacenderam a importância de que professores, orientadores e coordenadores estejam preparados para prevenir e enfrentar esse tipo de situação dentro do ambiente escolar. De acordo com a última Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE, de 2019), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na rede pública do DF, 22,1% dos estudantes entre 13 e 17 anos já sofreram algum tipo de provocação ou intimidação.
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Como forma de instruir os docentes sobre o tema, a Secretaria de Educação (SEEDF) e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) ministraram um curso de capacitação aos profissionais. "É fundamental abrir essa discussão para sabermos o que é, de fato, o bullying. O curso auxiliou bastante esse ponto aos professores, coordenadores e orientadores que participaram, mas desejamos atingir mais docentes, porque infelizmente sabemos que essas e outras questões dentro do ambiente escolar tendem a acontecer. Não queremos atuar depois dessas situações, mas desejamos trabalhar de uma maneira preventiva", explica a diretora de Serviços de Apoio à Aprendizagem, Direitos Humanos e Diversidade da SEEDF, Patrícia Melo.
Além do bullying, outras preocupações foram abordadas na capacitação, realizada em abril, de forma híbrida, que contou com a participação de 160 profissionais. Patrícia acrescenta que, a partir do segundo semestre, a pasta disponibilizará guias e vídeo na plataforma interna da secretaria, para instruir os professores que não puderam acompanhar a primeira etapa do curso. "É importante que todos os profissionais tenham acesso. O vídeo é intuitivo e auxiliará os profissionais da educação sobre como identificar o que é bullying, para poder intervir e promover a paz nas escolas", completa.
Saúde
A chefe do Grupo de Apoio à Segurança Escolar do Ministério Público (Gase/MPDFT), Caroline Resende, ministrou o curso em nome do MP. Ela destaca que as ações relacionadas ao bullying não podem ser feitas de maneira "intuitiva" nas escolas. "A implementação das medidas de prevenção deve ser realizada de forma técnica, periódica e coordenada, por toda a equipe de profissionais de educação. Quanto ao enfrentamento, as ações devem ser imediatas, assertivas e efetivas, a fim de interromper a violência e evitar a reincidência da prática", disse à reportagem.
Caroline relembrou que, em agosto de 2019, a Promotoria de Justiça de Defesa da Educação (Proeduc) expediu uma recomendação à SEEDF para que a pasta realizasse, anualmente, um curso de capacitação. A ideia é que haja a discussão e a promoção de ações educativas, e a implementação de campanhas de conscientização, no sentido de prevenir todos os tipos de violência no ambiente escolar.
"Os efeitos desastrosos do bullying vão desde a queda do rendimento do aluno até atos de extrema violência. Por ser uma violência praticada reiteradamente contra a integridade, a dignidade e os direitos fundamentais da pessoa, há uma deterioração da saúde física e mental da vítima e dos demais envolvidos", salientou ao Correio.
Respeito
A professora associada da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB), Catarina Santos, lembra que crianças, adolescentes e jovens passam a maior parte da vida dentro do ambiente escolar. Para ela, se forem dadas condições aos educadores para combate ao bullying e outras violências, tende a ser positivo o resultado. “A formação é essencial, não simplesmente para combater o bullying, mas para que faça com que o bullying não aconteça. A maneira ideal é que nossos profissionais estejam preparados para trabalhar pelo respeito às diferenças", afirma.
Catarina acrescenta que quanto mais escolas trabalharem pelo respeito às diferenças, maiores serão as chances de casos de bullying e outras violências não ocorrerem no ambiente escolar. “Não aprendemos que as diferenças nos educa, nos constitui e faz a riqueza do que nós somos. A formação que esses profissionais estão tendo precisa trabalhar com as diferenças. Isso passa por pensar esses elementos na cultura da escola, nos símbolos da escola, materiais didáticos, nos livros. Todas as ações do projeto pedagógico precisam estar voltadas para isso”, completa.
Para a doutora em educação Olga Freitas, não restam dúvidas de que a formação não apenas de professores, orientadores e coordenadores, mas também de gestores e famílias dos estudantes é uma das mais importantes estratégias para o enfrentamento ao bullying e às violências na escola. “A prevenção ao bullying começa pelo conhecimento. É por meio da formação que se torna possível desconstruir crenças que naturalizam o fenômeno como característica inerente às interações humanas, e exercício para a aprendizagem das normas sociais”, analisa.
Olga complementa que, mais do que debater o tema do bullying, é preciso agir, criar estratégias não dissociadas das dinâmicas gerais da escola, que levem em conta o coletivo, a plena participação de toda a comunidade, e não apenas de vítima e agressor. “Aliás, o confronto entre vítima e agressor sem ações concomitantes de sensibilização e ações concretas tem se demonstrado ineficazes na mitigação do problema e gerado mais insegurança para a vítima. Em geral, a prática do bullying ocorre entre indivíduos com diferentes níveis de poder no ambiente escolar e acontece, muitas vezes, para reforçar a popularidade e o poder do agressor sobre os demais”, afirma.
“Para que seja eficaz na proteção de crianças e adolescentes na escola, é preciso garantir formas de implementação, com investimento, fomento, orientação e fiscalização. Mas o maior investimento precisa ser em educação, para que não seja necessário punir”, destaca a especialista.
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