Com imagens de batalhões de choque, protestos gritarias em vídeos que mostram tantas cenas acontecendo ao mesmo tempo que é impossível saber para qual detalhe se atentar. A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) foi, na tarde de terça-feira (21/5), cenário de um violento episódio para as organizações estudantis. Uma manifestação organizada por entidades contra o Programa Escola Cívico-Militar terminou de forma inesperada, com oito estudantes, sendo dois menores de 18 anos, presos.
“Primeiramente, eu me sinto muito humilhada, nós nunca pensamos que falar nossa opinião nos levaria a isso”, relata Luiza Martins, 21 anos, presidente da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (Upes) e uma das estudantes que precisou passar a noite na delegacia. Momentos antes de serem detidos, eles visitavam gabinetes para conversar com os parlamentares, mas, segundo a jovem, algo já estava estranho desde a entrada. “Eles queriam revistar até o que estava escrito nas nossas bandeiras.”
Ao saber que a pauta entraria na Ordem do Dia, alguns jovens correram para o Plenário, onde iriam colocar uma faixa em protesto, foi quando as cenas registradas aconteceram. Luíza e mais quatro manifestantes conseguiram adentrar o local. Segundo ela, um deles foi derrubado e “arrastado” para um canto, outro, imobilizado por cinco policiais. “Nessa hora, eu puxei o celular para gravar, até que uma policial chegou por trás e me puxou”, diz.
Do lado de fora, nos corredores da assembleia, manifestantes estavam frente a frente com tropas do Batalhão de Ações Especiais de Polícia (Baep).
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP-SP) afirmou que equipes da Polícia Militar acompanhavam os protestos “para garantir a segurança dos participantes do ato e de pessoas no plenário, quando um grupo tentou invadir uma área restrita”.
“Houve tumulto e oito pessoas foram detidas, entre elas, seis adultos e dois adolescentes. Eles foram conduzidos à delegacia, onde foram ouvidos. Os menores foram liberados aos seus responsáveis, e os maiores permaneceram presos. Eles foram encaminhados para audiência de custódia, na manhã desta quarta-feira (22), e mais detalhes devem ser verificados com a Justiça. A Polícia Militar analisa as imagens da ação e toda denúncia será apurada”, escreveu a pasta.
Estudantes algemados
“A policial me arrastava para um canto e eu tentava resistir porque ouvi os gritos do meu amigo e temia que algo acontecesse comigo também”, conta Luiza. De acordo com ela, no entanto, a aparição de deputados no local mudou a situação. “Eles ficavam dizendo o tempo todo ‘não faz cena que aqui não tem câmera’, e quando os deputados chegaram eles pararam de nos xingar”.
Os oito jovens apreendidos foram encaminhados para o 27º Distrito Policial da capital paulista. De acordo com o advogado criminal Paulo César, um dos responsáveis pela defesa dos estudantes, os profissionais tentaram defender que não havia a necessidade da homologação da prisão em flagrante, mas a delegada decidiu por manter os jovens no local até audiência de custódia no dia seguinte.
No boletim de ocorrência, policiais relatam que foram agredidos fisicamente e verbalmente pelos manifestantes. Os militares também afirmaram ter sido necessário o uso de algemas em três detidos para “fins de proteger a integridade física dos policiais e dos próprios detentos, uma vez que estavam com comportamento agitado e agressivo”.
Os estudantes foram autuados por lesão corporal, resistência, desacato, desobediência, associação criminosa e corrupção de menores.
Audiência criminal
Os seis maiores de idade foram libertados após audiência de custódia, que concedeu liberdade provisória, na tarde dequarta-feira (22/5). A sessão, que aconteceu no Fórum Criminal da Barra Funda, na capital paulista, decidiu que os estudantes podem responder em liberdade.
Luiza relata que, ao chegar ao local, os jovens foram submetidos à revista padrão. “Tivemos que tirar toda a roupa, abaixar na frente do espelho, foi humilhante”, detalha. Ela conta que os próprios agentes de segurança do local ficaram surpresos quando souberam porque os jovens estavam ali. “Eles ficavam tentando acalmar a gente, dizendo que ia dar tudo certo.”
O advogado Paulo César explica que os detidos foram soltos após ser constatado que eles não apresentavam risco para a sociedade ou para a investigação. “As acusações em si chamam muito a nossa atenção pela falta de juízo de proporcionalidade”, relata o defensor, que se refere às acusações de associação criminosa. “Não tem como a gente falar que estudantes organizados em seus grêmios, nas suas reuniões municipais, nas suas entidades mais variadas estão associados para cometer crimes.”
A defesa afirma ter a esperança de que o Ministério Público, ao receber o relatório, constate conduta desproporcional da delegacia.
Na quarta-feira (22/5), entidades estudantis emitiram manifesto em repúdio às prisões. No texto, organizações denunciam que conduta policial é uma "grave violação dos direitos fundamentais" e pede apuração dos fatos. O manifesto criticou ainda o bloqueio da conta da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) no Instagram, que continua indisponível desde quarta-feira.