O ensino médio registra um dos maiores índices de evasão escolar no Brasil. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 6,5% dos estudantes dessa etapa escolar na rede pública abandonaram a escola em 2022. E essa realidade se deve, além dos fatores socioeconômicos, ao fato de que o ensino médio ainda é pouco atrativo para os estudantes, seja por falta de estruturas adequadas nas escolas, como laboratórios de ciência ou informática, seja por pouca flexibilidade e adaptação nos currículos.
Na busca de soluções para esses desafios, foi feita, em 2017, uma série de mudanças na etapa escolar. "O aumento da carga horária e a possibilidade de os estudantes escolherem parte das disciplinas que querem cursar, os chamados itinerários formativos, formam os principais pontos de mudança do 'antigo' para o Novo Ensino Médio (NEM)", explica Beatriz Cortese, diretora executiva do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec).
O Novo Ensino Médio amplia a carga horária mínima de 2,4 mil para 3 mil horas e possibilita aos estudantes a escolha de itinerários formativos que condizem com seus gostos ou projeto de vida. As discussões sobre essa reforma ocorreram em meio ao debate sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que estabelece um conjunto de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas escolares.
Mudanças
O documento destinado especificamente ao ensino médio foi aprovado em dezembro de 2018 e estabeleceu que a etapa fosse dividida em quatro áreas do conhecimento: Linguagens e suas Tecnologias, Matemática e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias, Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. O documento também prevê que o ensino seja aliado aos interesses do estudante, sendo transmitidos por meio de oficinas, observatórios, laboratórios, núcleos de estudos e criação artística.
Entretanto, na prática, o Novo Ensino Médio resultou em promessas não cumpridas e algumas incertezas. Segundo Beatriz Cortese, alguns dos pontos delicados da reforma são a ausência de formação das equipes para lidar com a mudança curricular e, muitas vezes, a falta de professores com conhecimentos específicos.
As promessas de escolha, interdisciplinaridade, flexibilização e maior atratividade, embora almejadas, não se tornaram realidade. "A realidade, as expectativas, os desejos e as possibilidades dos jovens brasileiros são muito diferentes, dependendo do território onde vivem, do gênero, nível socioeconômico, raça, cor entre outras variáveis. O Novo Ensino Médio parece não ter considerado, também, todas essas questões", pontua a especialista.
Desafios
A professora Catarina de Almeida Santos, da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB), reflete que a adoção do modelo nas escolas não tem sido acompanhada por investimentos suficientes para garantir condições de acesso e permanência dos estudantes, o que contribui para um efeito contrário ao esperado: aprofundamento das desigualdades de acesso ao ensino.
"A propalada promessa de os alunos poderem escolher seus itinerários se mostrou completamente enganosa, sobretudo pela falta de oferta, o que restringe os itinerários formativos disponibilizados pela escola, e que nunca abrangem a totalidade de possibilidades das redes de ensino", avalia a professora.
Especialistas avaliam que, pelo fato de a reforma desconsiderar as especificidades de cada região do país, poucas escolas têm conseguido se adequar ao Novo Ensino Médio sem que estudantes e professores vivenciem uma sensação de "perda do conteúdo". Nesse sentido, parece haver um consenso no meio educacional de que o modelo anterior da etapa escolar precisava de mudanças, mas que a reforma que entrou em vigor precisa de um significativo aprimoramento.
"Há uma concordância que o modelo anterior não mobilizava os jovens para que se mantivessem conectados às escolas e aos aprendizados dos conteúdos escolares. No momento, é preciso acompanhar de perto os movimentos do MEC e das redes para entender as diretrizes e, ao mesmo tempo, entender como as escolas e suas equipes docentes têm lidado com essa questão. Muito provavelmente é da observação do que acontece nas salas de aula que vamos encontrar os melhores caminhos", ressalta Beatriz Cortese.