O acesso à educação é um direito básico de todo cidadão. Entretanto, seja para trabalhar ou por falta de interesse nas aulas, muitas pessoas interrompem os estudos. Identificar os alunos que deixaram de frequentar a escola e garantir a permanência de crianças e adolescentes são um dos principais desafios da educação pública brasileira. Segundo o professor Bernardo Kipnis, da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB), a evasão escolar é um problema antigo que deve ser enfrentado. De acordo com dados da pesquisa feita pelo Serviço Social da Indústria e Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Sesi/Senai), divulgada nesta sexta-feira (26/5), apenas 15% dos brasileiros acima dos 16 anos estão matriculados em alguma instituição de ensino.
”Os dados são fortes. Só 15% da população atualmente estuda. É claro que, na idade escolar, o número sobe para 53%”, explica o diretor-geral do Senai e diretor-superintendente do Sesi, Rafael Lucchesi. O levantamento também mostra que entre os jovens que não estudam atualmente, apenas 38% alcançaram a escolaridade que desejavam e 57% não tiveram condições de continuar os estudos por diferentes motivos — sendo que a necessidade de trabalhar para ajudar a família é a principal motivação para 47% dos entrevistados.
Outros 18% apontaram gravidez ou nascimento de uma criança como fator decisivo para abondonar a sala de aula. Além disso, a distância e a falta de interesse nas aulas são fatores apontados pelos entrevistados. Para o professor Bernardo, o processo de evasão escolar é consequência da desigualdade social. "Essa situação se agravou, sem dúvida, com a pandemia da Covid 19, o fechamento das escolas e a substituição atabalhoada para o ensino remoto. Se não conseguimos universalizar o acesso, não garantimos a permanência", diz.
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"Podemos entender os fatores que levam à evasão como aqueles gerados por questões externas à escola, outras de responsabilidade da escola e outras relacionadas aos alunos e alunas. Sem dúvida, a desigualdade social existente influencia principalmente aquelas crianças e jovens de famílias de baixa renda, com necessidade de entrada prematura no mercado de trabalho para sustento familiar. Esse corte da desigualdade também pode ser observado em termos de raça e etnia. Portanto, esses são os perfis mais afetados: negros, pardos e indígenas", emenda o especialista.
O levantamento do Sesi e do Senai, em parceria com o Instituto FSB Pesquisa, foi feito com 2 mil pessoas acima de 16 anos em todas as unidades federativas. Os entrevistados foram ouvidos entre 8 e 12 de dezembro do ano passado.
Necessidade de aprimorar a educação
A falta de interesse nas aulas é influenciada pela ausência de atratividade do ensino e o distanciamento entre a teoria e o cotidiano dos alunos. "Existem fatores diretamente ligados à escola, principalmente em relação ao currículo oferecido. Sem dúvida, as pesquisas vem demonstrando que a principal razão da não permanência é o desinteresse do aluno por uma escola que não consegue associar o que é estudado com as práticas e necessidades do mundo do trabalho e da própria sociedade. Sem dúvida, a escola naquilo que ela pode atuar, precisa mudar, buscando estratégias pedagógicas mais inovadoras e um currículo que faça sentido para o jovem, de forma a prender o interesse", ressalta Bernardo Kipnis.
O levantamento do Sesi e do Senai apontou que 30% dos brasileiros consideram a educação pública como ótima e boa, enquanto que para 23% o ensino é visto como ruim ou péssimo. "Não podemos ter um projeto de país, para o desenvolvimento social e econômico, sem considerar a educação. Conhecer os motivos e o perfil dos jovens e adultos que interromperam os estudos, e consequentemente sua evolução profissional, é indispensável para criar oportunidades e reduzir desigualdades", alerta Rafael Lucchesi.
Um sonho realizado
Voltar à escola e ter a oportunidade de concluir os estudos são vistos como uma grande realização para muita gente. A empregada doméstica Fortunata Feitosa, 59 anos, conta que durante a infância teve a possibilidade de realizar apenas o ensino primário, não chegando ao fundamental. Morando na área rural, em Cavalcante de Goiás, Fortunata só teve a chance de voltar aos estudos aos 53 anos, no Centro de Educação de Jovens e Adultos da Asa Sul, mesmo morando em Águas Lindas. Embora seja um desafio, a distância não impediu que a mulher frequentasse a escola. Mas, durante a pandemia, Fortunata precisou dar uma pausa, por não ter facilidade com a tecnologia para acompanhar as aulas remotas.
Hoje, ela avalia que ter concluído o ensino médio foi um sonho realizado. "Fiquei muito feliz, foi maravilhoso, educação é tudo na vida do ser humano", diz. Mãe solo de um jovem com síndrome de Down, Fortunata continua frequentando o Centro de Educação de Jovens e Adultos diaramente para levar o filho Saulo, de 22 anos. "Mesmo sendo longe, acho que vale a pena. Ele se desenvolveu na leitura, na escrita e também no comportamento", ressalta. E o professor Bernardo chama atenção para o fato de que apoio dos pais é fundamental para evitar casos de evasão escolar. "Um dos suportes aos alunos é a família. Pesquisas revelam que alunos acompanhados pelos pais ou responsáveis tendem a evadir menos."
Bons resultados
Um dos impactos da evasão escolar é a redução da produtividade no trabalho. E na busca por uma melhor projeção no mercado, jovens e adultos decidem voltar à sala de aula para concluir os estudos. Segundo o diretor do Centro de Educação de Jovens e Adultos da Asa Sul, Reus Antunes, o acolhimento e apoio do Estado são essenciais para que essas pessoas obtenham êxito na caminhada, já que continuam enfrentando dificuldades ao conciliar as aulas e o trabalho. "A gente precisa mais para poder continuar, principalmente uma parceria maior com o próprio Estado. Precisamos de incentivo para que esse jovem trabalhador volte a estudar", destaca.
"A nossa escola já emplacou alunos que conseguiram alcançar cursos na Universidade de Brasília, e isso para a gente é um sucesso muito grande. Outros que já viveram aqui a vida acadêmica conseguiram se posicionar no mercado de trabalho. É uma escola que funciona desde 1973, está comemorando o jubileu agora em junho, as histórias são diversas, a escola faz parte da história de Brasília. Foram vários os estudantes que passaram por aqui e a escola ainda tem muito para dar", frisa Reus.
Acesse a íntegra da pesquisa do Sesi e do Senai.
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