“Estão mandando o filho de vocês para a escola?”, questiona uma mãe em um grupo virtual que reúne outras 98,7 mil mulheres responsáveis por alunos e alunas do Distrito Federal e do Entorno. A pergunta tem sido feita com frequência desde o mais recente ataque de um estudante contra colegas em uma escola de Santa Tereza de Goiás, na manhã de terça-feira (11/4) — mais um episódio de violência escolar que se soma a outros três que abalaram o país nas últimas três semanas.
- Adolescente que atacou escola em Goiás foi apreendido pela polícia.
- Dino exige de redes sociais retirada de mensagens de ameaça a escolas.
- Ministério da Justiça cria canal para denúncia de ameaça em escolas.
As respostas nas publicações revelam um cenário de pânico e medo entre os pais. “Não estou mandando meus filhos e não vou mandar até essa situação melhorar”, respondeu uma mãe. Outras dizem que estão prestes a deixar de enviá-los ao ambiente escolar por medo dos ataques. “Estou tendo crise de ansiedade”, disse outra mãe.
Professores, diretores e coordenadores de escolas públicas e particulares confirmam que a segurança do ambiente escolar tem sido colocada em dúvida pelos pais e responsáveis, que têm cobrado respostas das instituições. “Existe todo um clima de tensão, surge em grupos de Whatsapp com conversas entre eles e vira uma crescente. Alguns deles vão à escola no meio do dia para ver como estão os filhos”, relata um diretor de uma escola com 750 alunos da educação infantil até o 5º ano em Planaltina.
Para combater a insegurança de pais, responsáveis e alunos, as instituições escolares começaram, nesta semana, um movimento de aprimoramento de protocolos de segurança e de apaziguação dos ânimos dos familiares dos estudantes.
Ao menos cinco escolas de ensino particular já formalizaram uma série de medidas para elevar o nível de segurança dentro das instituições. Uma delas, que oferece ensino fundamental e médio com unidades em Taguatinga e na Asa Sul, informou que a equipe de segurança passou por um novo treinamento para situações de emergência e que a portaria da escola passará a ser monitorada por uma equipe específica.
Os alunos que estudam no contraturno são aconselhados a permanecer dentro da escola apenas nos horários das atividades. Além disso, os espaços coletivos passaram a ser restritos para estudantes e colaboradores, como a cantina escolar.
Medida parecida foi tomada por uma rede de ensino particular, que abrange o berçário ao ensino médio, presente em Samambaia, Taguatinga e Asa Norte. Em um comunicado obtido pelo Correio, a instituição restringiu o fluxo de pais e terceiros dentro da instituição. Os responsáveis foram vetados de deixar o aluno na porta da sala de aula e as visitas de novas famílias para conhecer o local foram vetadas por tempo indeterminado. Haverá ainda uma cobrança rigorosa de apresentação de identificação escolar na entrada da escola, monitoramento contínuo de câmeras e um trabalho conjunto entre colaboradores e docentes para evitar o bullying e promover a socialização dos estudantes. O reforço no policiamento também foi feito.
Uma terceira escola, na L2 Sul, informou que limitou até mesmo o recebimento de mercadorias e serviços de tele-entrega, como deliverys, assim como também terá mais rigor na identificação e entrada de fornecedores e prestadores de serviço. Além disso, oferecerá momentos de diálogo e orientações com estudantes sobre cultura do cuidado e cultura da paz.
Outras duas escolas, do Sudoeste e de Santa Maria, anunciaram uma parceria próxima com o Batalhão Escolar da região. Além disso, a instituição de Santa Maria informou que passará a realizar uma conferência nas mochilas dos estudantes no momento da entrada na escola.
As medidas são vistas como assertivas pelo Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinepe-DF). A presidente da instituição, Ana Elisa Dumont, afirma que o sindicato “tem estado diariamente e intensamente com os órgãos do Estado e com o governo, responsável pela segurança pública, para estabelecermos melhores estratégias para atendermos melhor os estudantes e as família”.
“Acreditamos que não é uma questão pontual, mas é uma questão complexa, de saúde da sociedade, de saúde emocional e que precisa de um esforço coletivo e não somente de algumas ações pontuais. Não acreditamos que apenas medidas paliativas e de momento serão efetivas. Precisamos tratar o problema na raiz, e isso significa dar atenção aos nossos adolescentes e jovens e cuidar para que as famílias estejam presentes e entendam as necessidades dos seus filhos”, pontua Ana.
Apesar de não ter uma diretriz única da Secretaria de Educação do DF, gestores de escolas públicas também têm mantido uma postura de tranquilizar pais e responsáveis. Gestores de instituições escolares de Planaltina e Ceilândia afirmam manter contato próximo por meio do Whatsapp para desmentir fake news e acalmar os pais. Uma coordenadora de uma escola de Ceilândia afirmou ao Correio que a unidade organiza uma palestra com um delegado à frente da Delegacia da Criança e do Adolescente para orientar pais e responsáveis sobre como supervisionar os filhos nas redes sociais e perceber sinais de perigo.
Família parceira
Para o sociólogo e consultor de segurança pública Antônio Flávio Testa, o ideal é um “pacto” entre a escola e os pais para combater o cenário de pânico e a insegurança que os ataques estabeleceram nas instituições escolares, principalmente por meio da circulação de notícias, boatos e imagens dos crimes. "É preciso, então, que as escolas conversem com os pais e estabeleçam um pacto para minimizar o abalo psicológico por meio da redução de exposição da comunidade familiar a essas informações. É preciso controlar o acesso à internet, por exemplo”, cita o especialista.
O acesso à internet também é visto por Alexandre Veloso, presidente da Associação de pais e alunos das instituições públicas e privadas do Distrito Federal (Aspa/DF), como um tema sensível e importante na luta contra a violência escolar que deve ser levado à sério pelos pais. Isso porque os ataques ocorridos mostraram que os agressores mantinham um envolvimento com comunidades extremistas que incentivaram o crime. “Chamamos os pais à responsabilidade para, principalmente, o monitoramento das redes sociais. Com a pandemia houve uma aceleração no acesso à tecnologias e é responsabilidade da família monitorar o uso do celular”, pontua.
“Não existe essa questão de privacidade, intimidade, usada por adolescentes e crianças para não compartilhar o que fazem virtualmente com os pais. Não existe isso, enquanto a criança e o adolescente estiver sobre os cuidados do pai, ele tem sim que conversar e controlar o uso da tecnologia deles”, defende Alexandre.
A presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinepe-DF), Ana Elisa Dumont, concorda que a parceria com a família é a chave para o sucesso no combate à violência. “Temos orientado que as escolas estabeleçam um diálogo com as famílias e as famílias sejam parceiras das escolas. Pq não, as famílias adotarem como medida de prevenção, verificar a mochila dos filhos antes de irem pra escola? Isso já traz uma maior segurança para a instituição, outros alunos, funcionários e colaboradores”, destaca.
Ana também aconselha os pais a terem um olhar atento para as mudanças comportamentais e virtuais dos filhos. “Um adolescente não acorda do dia pra noite e decide fazer um massacre, existe um planejamento, e isso pode se perceber em todos os casos que ocorreram no brasil e nos EUA”, pontua.
Estado em ação
Em nota, a Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF) anunciou que “permanece em constante diálogo com a Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP-DF) para a elaboração de melhores políticas em prol da segurança de toda comunidade escolar” e que colabora com as ações anunciadas pela pasta, como o aumento do policiamento em 60 escolas com maior registro de ocorrências de qualquer tipo de violência.
A SEEDF também informou que está em vigor o Plano de Urgência pela Paz nas Escolas, que prevê um conjunto de ações para promover o diálogo e a conscientização entre os alunos, além do reforço dos policiais do Batalhão Escolar. “As ações para a promoção da cultura de paz nas escolas estão sendo feitas por meio de equipe de psicólogos, profissionais especializados em mediação de conflitos e comunicação não violenta através de ações nas escolas, além de apoio a saúde emocional da comunidade escolar, tanto estudantes, como professores e servidores, assim também com acolhimento e sessões de escuta solidária em projetos de gerenciamento de estresse”, detalha a nota.
O Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro-DF) confirma a importância do Batalhão Escolar, que promove a vigilância na porta das escolas e acompanha a entrada e a saída dos alunos. No entanto, em nota, o órgão afirma que o combate à violência passa pelo investimento na estrutura escolar. “As escolas precisam ser atrativas para os estudantes, com bibliotecas, laboratórios e quadras de esportes. Também é necessário a contratação de profissionais e a criação de projetos para trabalhar no turno contrário (ao de aula). Mas, hoje, vivemos uma situação de abandono por parte do governo. As salas de aula estão lotadas e a biblioteca, para muitos estudantes, ainda é um sonho. Tem aluno que, até hoje, não recebeu nenhum livro didático”, alerta Samuel Fernandes, diretor do Sinpro-DF.
Colaboraram Aline Brito, Arthur de Souza, João Carlos*, José Limão*.
*Estagiários sob supervisão de Pedro Grigori
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