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Pré-escola

Centro-Oeste lidera desigualdade entre crianças brancas e pretas

Média de alunos brancos no Distrito Federal e no Mato Grosso é superior a de crianças negras, representando o maior índice de desigualdade no país, segundo pesquisa do Unicef e Undime

O número de crianças brancas matriculadas na pré-escola na região Centro-Oeste do Brasil, principalmente no Distrito Federal e no Mato Grosso, é superior ao de crianças negras, representando o maior índice de desigualdade no país, revela a pesquisa Desigualdades na garantia do direito à pré-escola, lançada pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime).

De acordo com o estudo, as crianças brancas na pré-escola no Centro-Oeste representam 89,4% enquanto crianças pretas são apenas 80,6%. Em relação aos estados da região, destaca-se, Mato Grosso (91,3% e 80,0%) e Distrito Federal (89,4% e 80,6%). No Centro-Oeste, 89,2% das crianças dessa faixa etária frequentam a pré-escola, índice abaixo da média nacional, de 94,1%.

O estudo mostra que o Brasil vinha avançando lentamente no acesso à pré-escola nas últimas décadas. Em 2019, 94,1% das crianças brasileiras frequentavam a pré-escola, deixando 5,9% fora dela — apesar da previsão de universalização desta etapa até 2016 pelo Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024.

Com a pandemia da covid-19, o cenário se inverteu. Embora não haja dados consolidados para os últimos anos, uma análise das taxas de matrícula durante a pandemia, revela que ocorreu, apenas em 2021, uma queda de 275 mil matrículas na pré-escola.

“Infelizmente, nós ainda não tivemos acesso aos dados consolidados de 2019 para cá, mas nós já temos estudos que indicam uma queda dramática das matrículas dessas crianças na pandemia, o que torna o cenário ainda mais preocupante e demanda uma ação coordenada das três esferas de governo com as famílias e as redes de ensino nesta volta às aulas, identificando e localizando essas crianças que não estão tendo seu direito assegurado”, avalia Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.

Além de todas as crianças não terem o direito assegurado, a pesquisa traz outro alerta importante: crianças pretas, pobres e filhas de mães jovens e de baixa escolaridade são as que têm maior risco de não frequentar a pré-escola. Há também desigualdades regionais, estaduais e entre crianças do campo e das cidades.

Mudança de cenário

Mudar esse cenário é urgente e demanda ações concretas, voltadas ao enfrentamento da exclusão escolar. Sabendo que a Educação Infantil é ofertada, prioritariamente, nas redes municipais de ensino, a pesquisa recomenda aos gestores municipais planejar a expansão de vagas, com especial atenção aos públicos mais vulneráveis identificados neste estudo; identificar e localizar as crianças que não estão matriculadas na pré-escola, utilizando estratégias como a busca ativa escolar; sensibilizar as famílias para a importância da educação infantil; articular ações intersetoriais, integrando saúde, assistência social e educação para a promoção do direito à pré-escola às crianças; e contribuir para a efetivação do regime de colaboração, conhecendo quais programas e políticas federais e do seu estado estão ativos para a educação infantil e em quais seu município pode ser participante, além de demandar destes entes uma maior participação no regime.

"Essas recomendações são importantes e merecem atenção, sobretudo quando falamos de ações conjuntas, em regime de colaboração envolvendo União, estados e municípios. Temos governadores que foram empossados recentemente e é estratégico que essas recomendações cheguem neles, para que estados e municípios trabalhem juntos pela garantia do direito à educação de cada criança", destaca o presidente da Undime, Luiz Miguel Garcia, dirigente municipal de Educação de Sud Mennucci/SP.

Raça e renda

A região Centro-Oeste foi a que apresentou a segunda maior desigualdade, no Brasil, entre as taxas para crianças pretas, pardas ou indígenas em relação às brancas ou amarelas (86,5% e 89,5%). Em relação aos estados, verifica-se no Distrito Federal (87,8% e 83,5%), Goiás (85,3% e 89,0%), Mato Grosso (88,1% e 91,4%) e Mato Grosso do Sul (89,7% e 89,9%). As desigualdades são 4,3%, 3,7%, 3,3% e 0,2%, respectivamente por estado.

O Centro Oeste registra, ainda, uma diferença de 4,2% entre os dois grupos (85,7% pobres e 89,9% não pobres). Mato Grosso é o estado da região que possui maior desigualdade nas taxas de escolarização entre as crianças dos dois grupos: 82,3% pobres e 95,6% não pobres. A menor diferença é observada no Distrito Federal (90,0% pobres 86,1% não pobres).

“Crianças pretas e pobres são, historicamente, mais vulnerabilizadas no Brasil e essa desigualdade no acesso à educação infantil privilegia alguns grupos em detrimento de outros, afinal as crianças pretas e pobres que não frequentam a pré-escola têm menos acesso a estímulos, interações, alimentação e segurança. Isso pode comprometer o desenvolvimento, impactar a progressão e a transição para as etapas de ensino sequentes, além de reproduzir desigualdades que atrasam o nosso país”, explica Maíra Souza, Oficial de Primeira Infância do UNICEF no Brasil.

Ocupação materna

Em 2019, as regiões Centro-Oeste e Norte apresentaram as menores taxas de frequência escolar de crianças filhas de mães jovens, 81,5% e 82,1%, respectivamente. O estado de Goiás apresenta a maior desigualdade nessa região com 66% de crianças filhas de mães com 19 ou menos idade e 88,2% de crianças filhas de mães com 20 ou mais.

A região Centro-Oeste registra 89,5% de frequência para mães com ocupações informais e 92,3% para mães com trabalho formal. As taxas de frequência para crianças com mães na informalidade nos estados da região equivale a: Mato Grosso (92%), Mato Grosso do Sul (90,3%), Goiás (88,6%) e Distrito Federal (87,2%).

A região Centro-Oeste foi uma das que apresentou as menores taxas de escolarização de filhos de mães sem Ensino Fundamental completo: 86,3%. Para mães com o Ensino Fundamental completo o índice é 90,4%. Por estado, os indicadores de mães sem o fundamental completo são: Goiás (83,8%), Mato Grosso do Sul (86,3%), Mato Grosso (87,8%), Distrito Federal (88,7%).

“Embora esses dados indiquem que as desigualdades são maiores nos recortes maternos, nós percebemos que esses marcadores, infelizmente, também são característicos de mulheres pretas e pobres no nosso país, como mães jovens, de baixa escolaridade e trabalho informal”, avalia Mariana Luz. “Isso indica que o problema não é exclusivo no acesso à educação, mas é também de emancipação das mulheres e dos negros, além da quebra de ciclos intergeracionais de pobreza”, finaliza a CEO da Fundação.

A região Centro-Oeste, chama atenção ainda como a que possui maior defasagem em relação à frequência escolar de crianças que residem com apenas um adulto. Em 2019, a taxa para famílias monoparentais nessa região foi de 83,1% e a de famílias não-monoparentais foi de 89,9%. Este resultado decorre, especialmente, da situação observada em Goiás, que apresentou um resultado de 72,1% e 87,4%, respectivamente, para os mesmos indicadores.

Zonas urbana x rural

No Brasil, a porcentagem de crianças entre quatro e cinco anos de idade que frequentam a escola é menor nas localidades rurais, com uma diferença de 3% em 2019.

A região Centro-Oeste apresenta o segundo menor índice de frequência escolar de crianças dessa faixa etária nas zonas rurais (85,8%), no Brasil. Na mesma região, o índice do domicílio urbano é de 89,6%. O Mato Grosso do Sul (77,7%) é um exemplo de estado com uma das mais baixas taxas de escolarização em domicílios rurais no País.

Para o presidente da Undime, é fundamental a formulação de estratégias que respondam ao desafio de garantir pré-escola de qualidade para todas as crianças e tragam-nas de volta à escola, com oportunidades de aprendizagem. “É indispensável que a gente trabalhe para termos ações robustas e coesas de busca ativa dessas crianças, que se amplie o acesso à educação infantil com qualidade e que realizemos o monitoramento dessas iniciativas para que o direito constitucional à Educação seja efetivamente garantido, com equidade, para todos”, diz Garcia.

Com o apoio técnico da Quantis Consultoria, o estudo avaliou as taxas de frequência de crianças na pré-escola segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) de 2019, da PNAD (2005-2015) e do Censo Demográfico (2010), com análises produzidas em 2019. A ausência de resultados mais recentes se dá pela não publicação de novos dados da PNAD sobre o tema.