Educação

Escola pública de Ceilândia Norte trabalha "africanidades" com os alunos

Centro de Ensino Fundamental (CEF 10) expõe trabalhos realizados pelos alunos com materiais recicláveis ressaltando personalidades pretas com o propósito de valorizar aspectos da cultura afro-descendente

Pedro Marra
postado em 26/11/2022 09:00 / atualizado em 26/11/2022 11:11
 (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
(crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

Como as ações pedagógicas podem contribuir para o ensino da cultura africana na sala de aula? É com esse questionamento que a professora do Centro de Ensino Fundamental (CEF 10) de Ceilândia Norte se guiou para educar o olhar de 700 alunos da unidade para a cultura afro-brasileira por meio do Projeto Africanidades. E outubro deste ano, a professora começou a confeccionar trabalhos com os alunos utilizando materiais recicláveis. Obras artísticas que estão em exposição no colégio, como a esfinge e o sarcófago, desenhos que valorizam a beleza do corpo negro, além de textos sobre personalidades pretas.

O projeto envolve várias áreas de conhecimento como artes, história, educação física, música, matemática, literatura, dança e língua portuguesa. Hoje será um dia especial, pois a escola vai finalizar os trabalhos com um desfile de moda afro, shows musicais e apresentação dos trabalhos, das 9h às 12h, para a comunidades escolar. O projeto coroa o fim do mês da Consciência Negra, lembrado pela luta antirracista de Zumbi dos Palmares.

Junto de outros oito colegas, o estudante do 8º ano Emanoel Costa, 13 anos, desenhou em dos murais da escola: um menino negro com cabelo cacheado, representado por tampinhas de garrafa pet de várias cores, representando a diversidade do cabelo afro. "Tenho aprendido o respeito à cultura negra e destacando como é importante aceitar o seu cabelo e usar do jeito que preferir", opinou.

Logo ao lado, está o desenho de um trio de colegas do 8º ano que confeccionou uma mulher com cabelo cacheado feito com fitas pretas e roxas para reforçar a beleza da população negra. "As mulheres precisam se sentir empoderadas com o cabelo porque muitas têm vergonha", avalia Sofia Ramalho, 13.

Maria Clara dos Santos, 13, citou que o projeto é importante para combater o racismo na escola. "Existe muito preconceito sobre o cabelo, principalmente", exemplifica. A estudante Giovanna Emanoely, 13, se divertiu ao fazer o desenho com as amigas para incentivar o antirracismo. "A gente quer mostrar como os cachos são bonitos e que as mulheres têm que 'enrolar' o preconceito, porque se passaram anos e anos, e isso (o preconceito) ainda não acabou", analisa.

O uso de vários elementos da arte como educação interdisciplinar foi uma decisão da professora de história e geografia do colégio, Rose Nogueira, em conjunto com os demais educadores. A organizadora do projeto quis que os estudantes entendessem que eles são importantes e que ser preto é sinônimo de beleza também. "Temos que empoderar todos esses meninos e meninas que se sentem subjugados," destaca.

Aluno do 8º ano do ensino fundamental, Thiago Borges, 14, colocou em prática a proposta da professora Rose ao desenhar, em apenas um dia, o rei Ganga Zumba no meio de uma floresta. Segundo a Fundação Cultural Palmares (FCP), ele foi o primeiro líder unificador do Quilombo dos Palmares, em Alagoas, entre 1670 e 1678. "Quando estava fazendo essa obra vi que, antes da chegada do povo branco, tinha mais natureza e, ultimamente, estamos perdendo ela", explica.

Religião

O envolvimento dos alunos com o projeto é percebido logo na entrada da escola, com o grande grande painel de máscaras pintadas por eles com símbolos africanos e que representam as entidades do candomblé (religião de matriz africana). Uma delas é a Iansã, orixá mulher mais valente pintada com tinta guache vermelha e com colar de miçangas cobrindo o rosto, feito por Ana Clara dos Anjos, 14, que também fez outra sobre o povo da Etiópia. "Foi muito bom ver que tem muitas outras coisas, além da escravidão, e conhecer a cultura negra de outras formas", afirma a estudante.

O professor da disciplina de artes do colégio, Gerson Cunha, destacou a influência do projeto no desenvolvimento do respeito à cultura afro. "Eles deixam de ver a parte vitimizada e começam a perceber que têm talento suficiente para mostrar que o negro possui muita influência na nossa cultura", avalia o educador.

 


  • Sofia Ramalho, Maria Clara dos Santos e Giovanna Emanoele.
    Sofia Ramalho, Maria Clara dos Santos e Giovanna Emanoele. Foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
  • Emanoel usou tampinhas de garrafas para representar a diversidade do cabelo
    Emanoel usou tampinhas de garrafas para representar a diversidade do cabelo Foto: Fotos: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
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