A professora Vanisse Maria Rodrigues Alves, 38 anos, docente do colégio Marista Santa Maria, em Curitiba, desenvolveu um método on-line para ensinar a escrita de letras cursivas a crianças do segundo ano do ensino primário durante a quarentena. A metodologia é resultado do encontro entre criatividade e tecnologia.
Para dar continuidade às programações do ano letivo, Vanisse produziu uma série de vídeos onde mostra todo o processo de escrita. Com o uso de uma apresentação no powerpoint, ela contornava as letras enquanto explicava com brincadeiras o que o aluno deveria fazer. Para ela, “foi muito legal porque eles (alunos) davam um retorno, falavam que gostavam”.
A dinâmica foi gravada para que as crianças pudessem acessar de casa. Eles podiam treinar sozinhos, de forma assíncrona, ou com acompanhamento ao vivo da professora. Os vídeos foram criados em um computador com função touchscreen (tela sensível ao toque). “A gente conseguiu atingir esse objetivo e as crianças aprenderam a escrever com a letra cursiva”, diz.
De acordo com a professora, as crianças costumam esperar com ansiedade para aprender a letra cursiva. Durante as aulas remotas, “o desafio que eu enfrentei foi como fazer com que elas aprendessem uma letra tão pessoal e carregada de uma identidade a distância”, conta.
Os vídeos também exercitam habilidades que estão aliadas à escrita, como o movimento de pinça, a maneira correta de pegar no lápis e a coordenação visomotora, que é a capacidade de controlar a mão guiado pela visão. Depois de terem contato com o alfabeto, os estudantes começaram a construir palavras e explorar novas experiências.
Plataforma digital contribui com processo de aprendizagem
A suspensão das aulas presenciais levantou a urgência do uso da tecnologia na educação. Escolas de todo o país precisaram se adequar ao modelo remoto para dar continuidade ao ano letivo e dispositivos on-line foram fundamentais para facilitar esse processo.
A Cloe, plataforma digital de aprendizagem ativa desenvolvida pelo grupo educacional Camino Education, é vendida para escolas do Brasil e representou um dos expoentes de auxílio na transição das aulas para o ambiente remoto em 2020. Em 2021, mais de 240 escolas usam a Cloe.
Totalmente on-line, a plataforma dispõe de projetos didáticos chamados de expedições. Marta Durante, diretora pedagógica da Cloe, explica que todo o desenvolvimento do ensino está organizado em uma sequência de atividades. Os alunos encontram questões norteadoras que envolvem problemas do mundo real.
O sistema é totalmente virtual e não utiliza livros didáticos. A Camino Education tomou como referência a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para construir um currículo próprio com mais habilidades. “A partir da junção dessas habilidades é que as expedições são construídas”, explica.
Para Marta, a tecnologia é uma possibilidade importante que vai além da sala de aula. “Contribuiu pra gente levar possibilidades de aprendizagem e possibilidades de metodologias para lugares bem distantes, que às vezes a gente nem imaginava que seria possível”, diz.
“A plataforma estar organizada tecnologicamente foi muito bacana porque a gente conseguiu ajudar muitas escolas. Elas estavam precisando exatamente disso para realizar o ensino remoto”, conta. Para o caso de escolas que não têm acesso à internet, a diretora explica que, apesar de não ser o foco, existe a possibilidade de imprimir os conteúdos.
Durante a pandemia, todos os conteúdos necessários foram desenvolvidos a partir de aprendizagem ativa. “O tempo inteiro os meninos (alunos) precisam pensar sobre algo e buscar o caminho”, conta.
De acordo com Marta, “na Cloe, a gente organiza essa ideia de que as crianças precisam estar em contato com a leitura e escrita desde pequenininhos. Elas vão se colocar como leitores e escritores mesmo antes de saber ler e escrever”.
Para crianças de cinco anos, por exemplo, existem atividades para que elas aprendam a cantar cantigas de mão. “Essa ideia de fazer com que as crianças saibam de cor ajuda a propor atividades em outros momentos em que elas têm que escrever as cantigas, mesmo sem saber escrever”, explica.
O objetivo não é fazer com que o resultado da escrita venha totalmente correto. Para a diretora, a alfabetização acontece no decorrer dos exercícios propostos. “É exatamente nessa situação cotidiana de ir brincando com as cantigas, com as parlendas, que você vai colocando as crianças para escrever e contar como que escreveram”.
Marta Durante ainda explica que por mais que pareça uma atividade exclusivamente de brincar, os exercícios são todos estruturados com intenções educacionais por trás. O professor recebe todas as instruções de onde deve chegar em cada uma delas.
Acesso à tecnologia ainda é um desafio
Ítalo Curcio, pós-doutor em educação e coordenador do curso de pedagogia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, escreveu sobre a relação entre educação e covid-19 no artigo “Alfabetização e letramento em tempo de pandemia”.
Para ele, a crise vivenciada em 2020 levantou a importância de se pensar métodos específicos para aplicar a alfabetização nos estudantes. Mas, antes de desenvolver essas ideias, é necessário analisar as diversas realidades e chegar a uma conclusão: como atender cada estudante?
Ítalo Curcio explica que sem condições de atendimento para todos, nenhum método terá efeito. O pesquisador também destacou dois principais grupos: as famílias que tiveram acesso ao ensino remoto, mesmo que precariamente e, em segundo, aquelas que não tiveram acesso à tecnologia para dar continuidade às aulas.
O especialista recomenda que famílias que podem seguir o modelo remoto continuem no mesmo ritmo para buscar melhores resultados. As lacunas que ficaram de 2020 poderão ser reparadas.
Para o segundo grupo, é preciso que organizações governamentais implementem ações de emergência com o apoio do terceiro setor. Segundo Ítalo, tudo o que for possível deverá ser feito para minimizar os danos na aprendizagem das famílias que não possuem acesso à tecnologia.
*Estagiária sob a supervisão da editora Ana Sá