O Ministério Público Federal (MPF) enviou ao Senado Federal uma nota técnica em que aponta inconstitucionalidades no texto aprovado pela Câmara dos Deputados do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
Segundo o documento, enviado na última segunda-feira (14) pela 1ª Câmara de Coordenação e Revisão (Direitos Sociais e Atos Administrativos em Geral) do MPF, as transferências de recursos a instituições de ensino particulares violam a Constituição Federal (CF) e criam precedentes para a precarização do ensino público no Brasil.
Dispositivos aprovados na Câmara favorecem rede privada
A nota questiona alíneas e incisos que autorizam o emprego de recursos do Fundeb em instituições comunitárias, filantrópicas ou confessionais e no Sistema S, para oferta conveniada de vagas nos ensinos fundamental e médio e remuneração de profissionais da educação terceirizados. Duas emendas aprovadas pelos deputados, em sessão na última quinta-feira (10), incluíram essas organizações para serem beneficiadas com recursos públicos.
De acordo com os parlamentares, o objetivo é suprir o déficit da rede pública de educação, para expansão da oferta de vagas em creches e na educação básica obrigatória por meio de convênios com instituições privadas.
O MPF defende que essa tese “é um argumento factual e juridicamente inepto para sustentar a regulamentação que tem sido proposta para o novo Fundeb”.
Isso ocorre porque o artigo 6º da Emenda 59/2009 obrigou a universalização do acesso à educação infantil pré-escolar e ao ensino médio até 31 de dezembro de 2016, enquanto a oferta estatal do ensino fundamental é obrigatória há décadas, nos termos reforçados pela Constituição.
A nota técnica foi elaborada por mais de 300 juristas brasileiros, entre professores universitários, pesquisadores, magistrados, e membros do Ministério Público e dos Tribunais de Contas. Os autores reforçam que, assim como não foram necessárias em 2016, em 2020 não são necessárias vagas na rede particular para garantia da educação básica obrigatória.
O principal argumento da MPF é que no artigo 213, a Constituição Federal de 1988 fez uma opção explícita pela transitoriedade das parcerias com a iniciativa privada na prestação do serviço público de ensino obrigatório, exclusivamente para atender a déficits de vaga nas escolas públicas no curso da implementação da expansão do segmento público.
Além disso, a CF atribui a prestação do ensino obrigatório ao Estado, com caráter universalizante, igualitário e inclusivo, características que não constituem propósito típico da iniciativa privada.
Os juristas reiteram que a proposta é fruto da pressão feita por entidades privadas para oferecer os serviços e, com isso, obter meios para sustentar os custos de operação. “Diferentemente do alegado, não é que as redes públicas de ensino realmente precisem demandar tais parcerias, mas apenas que as entidades privadas têm fortemente pressionado para oferecer seus serviços”, pontuam em nota.
Por fim, a nota alerta para a regulamentação os destaques aprovados na Câmara: “Tais dispositivos regulamentares ensejam hipóteses fáticas de oferta irregular do ensino, o que, por certo, implicará correspondente responsabilização dos gestores que derem causa à destinação dos recursos do Fundeb para instituições privadas de ensino”.
Fundeb será votado no Senado
O texto do Projeto de Lei n° 4.372/2020 que regulamenta o Fundeb foi aprovado pela Câmara e será votado pelos senadores em sessão semipresencial nesta terça (15) às 16h. Acompanhe a transmissão pelo canal TV Senado no YouTube.