Eu, Estudante

HOMESCHOOLING

Especialistas avaliam prós e contras do ensino domiciliar, após aval de comissão

Projeto de lei em análise na Câmara Legislativa possibilita a educação de crianças e adolescentes em casa, sem a necessidade de levá-los à escola. Decisão segue para o plenário, mas grupos contrários defendem que proposta passe por avaliação do Congresso Nacional

O ensino domiciliar — também conhecido como homeschoolingdeu mais um passo rumo à implementação no Distrito Federal. Aprovado, ontem, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Legislativa, o projeto de lei que reconhece a legalidade da prática segue para o plenário da Casa. No entanto, o tema gera discordâncias entre profissionais da educação e da área do direito. Os contrários defendem que o tema precisa passar por avaliação do Congresso Nacional, antes do reconhecimento dessa modalidade.

A Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do Distrito Federal (Aspa-DF) aprovou a avaliação da CCJ. "Sabemos que a prática do ensino domiciliar é uma realidade sem volta no Brasil, considerando as centenas de famílias que a adotam. E, em tempos de pandemia, vemos a total e urgente viabilidade dessa modalidade", informou a Aspa-DF em nota.

Por outro lado, o Sindicato dos Professores no DF (Sinpro-DF) posicionou-se contra a proposta. "O Sinpro-DF entende que, além de inconstitucional, por ser matéria do Congresso Nacional — como determinou o Supremo Tribunal Federal (STF) —, fica claríssimo que setores minoritários da população querem criar um feudo para os filhos, sem a convivência social com diversidade de raças, gêneros, classes sociais, a pluralidade de ideias e a liberdade de cátedra", comunicou a entidade, também por meio de nota.

Para Gustavo Monteiro Fagunde, especialista em direito educacional, a aprovação pela Câmara Legislativa não colocaria o projeto em conflito com a Constituição Federal, pois a matéria em tramitação prevê o monitoramento das aulas por unidades educacionais públicas ou privadas. Além disso, os responsáveis pelo aluno deverão demonstrar aptidão técnica para o desenvolvimento das atividades pedagógicas ou contratar profissionais capacitados para isso. "A Carta não proíbe o ensino domiciliar, mas não se pode adotar nenhum método que exclua o Estado do processo. Seria inconstitucional", justificou o advogado.

Medidas

O texto do projeto de lei estabelece que os estudantes com preferência pelo ensino em casa terão direito a todas as certificações de conclusão de ciclos de aprendizagem e passarão pelo mesmo processo de avaliação dos demais alunos da rede de educação convencional, com mesmos níveis de exigência. Ainda segundo a matéria, os optantes do homeschooling terão acesso a benefícios como o passe livre estudantil, e a Secretaria de Educação deverá garantir vaga aos egressos do ensino domiciliar que não tiverem aproveitamento ou desejarem retornar à modalidade regular por outro motivo.

Psicopedagoga especializada em autismo e alfabetização, Thaynara Bellino considera que a eficácia da modalidade domiciliar varia de aluno para aluno. Ela destacou que o homeschooling não implica prejuízos à qualidade do aprendizado, por tratar-se de método planejado, mas considerou possível haver perdas para a socialização do estudante. "Na modalidade presencial, o ensino domiciliar segue o conteúdo da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). O ensino em casa facilitaria muito para os pais na questão de descolamento, por exemplo. Mas essa adaptação varia. Algumas crianças se desenvolvem; outras, não", ponderou.

Thaynara acrescentou que o ensino domiciliar não é passível de comparação com a modalidade a distância, adotada após a pandemia de covid-19. "Esse ensino remoto foi inesperado e planejado em pouco tempo. O homeschooling é um método estudado e tem muitas chances de dar certo no Brasil", avaliou a especialista. "Contudo, os trabalhos em grupo também ajudam bastante no processo de aprendizagem. Os alunos aprendem muito apresentando (trabalhos) para uma classe", comparou a psicopedagoga.

Entendimento

Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) admitiu a constitucionalidade da educação domiciliar no Brasil, mas considerou a modalidade de ensino ilegal, por não haver legislação que determine preceitos e regras para a prática. A análise do tema ocorreu com base em recurso apresentado pelos pais de uma menina de 11 anos contra ato da secretária de Educação do Município de Canela (RS). A pasta havia negado pedido para que a criança recebesse aulas em casa e orientou os responsáveis a matricularem-na em uma instituição regular.

Colaborou Bárbara Fragoso

*Estagiárias sob supervisão de Jéssica Eufrásio