A decisão da Justiça do Trabalho que mantém a suspensão das aulas nas escolas particulares do Distrito Federal divide representantes do setor. O Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino (Sinepe/DF) tentou recorrer da mais recente determinação que impediu o retorno, publicada na semana passada, mas não obteve sucesso. O presidente da entidade patronal, Álvaro Domingues, acredita que a liberação ocorrerá apenas no fim do ano. Ele calcula que, até lá, dos mais de 570 estabelecimentos de ensino privados do DF, entre 120 e 150 devem fechar ou decretar falência.
Em vídeo divulgado a filiados ao sindicato, Álvaro afirmou que agosto é o momento em que as escolas começam a planejar o ano letivo seguinte. A preocupação nos colégios que permanecerem abertas é de que, em 2020, pagamentos de fim de ano, como 13º e férias, fiquem comprometidos. “A continuar com todos os prazos legais, as nossas escolas retornariam só no fim do ano. Isso muito nos aflige. De forma realista, temos de nos preparar para um quadro difícil”, afirmou o presidente do Sinepe/DF.
Além do material, o sindicato divulgou um comunicado na terça-feira. O documento mencionou que o prazo de quatro meses de validade da Medida Provisória (MP) 936 — que permite a suspensão de contratos, além da redução de jornadas e salários, temporariamente — acabou em agosto para alguns centros de ensino. “Vamos orientar escolas a fazer a reorganização orçamentária para finalizar o ano, cumprindo obrigações trabalhistas e tributárias, da maneira que for possível neste momento e tendo demissão como último recurso. Essa assistência àquelas em processo de dificuldade é o que está ao nosso alcance”, disse Álvaro ao Correio.
A educação infantil é o nível que mais apresenta evasão escolar na rede particular. Desde o início da pandemia, houve redução de 30% a 40% do total de 36 mil alunos matriculados no início do ano. A inadimplência é outro problema que afeta as instituições de ensino. Em colégios de regiões fora do Plano Piloto, cerca de 75% das famílias estão com mensalidades atrasadas. O cenário também alcança os professores. De março para cá, dos 12 mil da educação básica, aproximadamente 600 foram demitidos.
Diretor jurídico do Sindicato dos Professores em Estabelecimento Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinproep), Rodrigo de Paula considera que não há solução para o setor sem a ajuda do Estado. Ele afirmou que a expectativa é de que o governo federal prorrogue a validade da MP 936. “É preciso dar sobrevida às escolas. É um erro achar que só reabrir vai resolver o problema, porque muitos pais disseram que não vão levar as crianças. Continuamos achando muito prematuro voltar. Foram 55 mortes em um dia e mais de 2 mil casos (da covid-19 nesta semana)”, lamentou.
Estrutura
A decisão sobre o calendário da rede privada depende do julgamento de uma ação civil protocolada pelo Ministério Público do Trabalho no Distrito Federal e no Tocantins (MPT-DF/TO). O documento pede a suspensão da volta às aulas na rede particular até que se observe redução da curva de casos da covid-19, das taxas de ocupação dos leitos hospitalares do Distrito Federal ou quando uma autoridade pública de saúde atestar a segurança da retomada. O órgão também pede a expedição de um novo protocolo de saúde destinado às escolas particulares.
Ainda não há previsão de publicação da sentença da ação. Enquanto isso, representantes das instituições de ensino particulares tentam negociar com integrantes dos poderes Executivo e Legislativo a criação de um voucher educacional no DF. A proposta funcionaria como um cartão de financiamento destinado, principalmente, às famílias de rendas mais baixas. Algumas empresas também têm recorrido a linhas de crédito, ampliadas ou flexibilizadas durante o período de crise, para manter as contas em dia.
Diretora do colégio de educação infantil e berçário Bambini, no Jardim Botânico, Renata Rebouças recorreu à linha de crédito do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) e aderiu à MP 936. “Temos conversado bastante com os pais. Quando for possível que retornemos, vamos voltar com uma estrutura ao ar livre. Temos estudado o que outros países têm feito, além das medidas adotadas aqui no DF. O fato é bastante delicado, aula virtual nessa fase, também. Mas o nosso foco é a saúde das crianças”, comentou.
Mantenedor da Rede Objetivo DF, Hiago Vercino ressaltou que o impacto nas finanças tem sido “estrondoso”, especialmente na educação infantil. “A nossa receita caiu 30% desde que começou a pandemia, e estamos fazendo o máximo que podemos para readequar gastos”, detalhou. Hiago acrescentou que a rede não se encaixou nos perfis adotados pelos bancos para concessão de crédito e que o adiamento dos impostos não ajudará tanto. “Gastamos R$ 300 mil com adequações e, só com testes, foram R$ 50 mil. Todo mundo segurou e não fez demissões, mas, agora, estamos sem previsão”, explicou.