Superfecundação heteropaternal: gêmeos com pais diferentes. O fenômeno é tão raro (há duas dezenas de casos documentados no mundo) que a probabilidade de acontecer é como a de ganhar na loteria. Deve ser o pior prêmio da história, pois é fácil imaginar que alguém entre os envolvidos (a mãe e dois pais) não ficará muito feliz com a descoberta.
Pois é exatamente este o mote de “Pedaço de mim”, que estreia sexta-feira (5/7), na plataforma Netflix. Apresentada como a “primeira série brasileira de melodrama” da plataforma, é, na verdade, uma novela. Só que não vai durar seis meses. São 17 episódios, todos liberados no mesmo dia. A narrativa e os envolvidos poderiam figurar em qualquer folhetim da TV aberta.
A dupla de protagonistas vem de “Renascer” (Globo). Juliana Paes, que se despediu da Jacutinga em fevereiro (há rumores de que a personagem poderá voltar), é Liana. Vladimir Brichta, no ar como o vilão Egídio, é o marido dela, Tomás. Ela é terapeuta ocupacional e ele advogado. Juntos há alguns anos, têm tentado, sem sucesso, ter um filho.
Expertise
Rodada em 2023, “Pedaço de mim” foi criada pela escritora e roteirista carioca Angela Chaves. Também cria da Globo, estreou em novelas como colaboradora de Gilberto Braga em “Celebridade” (2003). Mais tarde, atuou ao lado de Manoel Carlos em novelas e minisséries. Em “Éramos seis” (2019) Angela fez a estreia como autora solo. A direção-geral é de Maurício Farias, outro nome egresso da emissora.
“Pedaço de mim” tem início em 2006, quando acompanhamos o casal Liana e Tomás em um sítio. Ela está prestes a dar à luz, e não há tempo de chegar ao hospital. A história retrocede alguns meses, antes da gravidez. Crise no casamento, traição, abuso sexual, tudo prepara o telespectador para um grande dramalhão.
Além do casal principal e de Oscar (Felipe Abib), o terceiro envolvido na gravidez, a série traz outros personagens e subtramas. Palomma Duarte interpreta Silvia, irmã de Tomás e ginecologista de Liana. Ela é mãe de Inácio (Vitor Valle), garoto que está perdendo a visão. Mãe solteira, vai se envolver com o médico Vicente (João Vitti), que diagnosticou a raríssima gravidez de Liana.
À imprensa foram liberados os quatro primeiros capítulos, quando a narrativa está no passado. Vai haver um salto temporal. “Também só vi até o quarto. Mas sei, pelo roteiro, que a história, a partir do quinto, começa a ir para um lugar em que todo mundo vai pirar”, entrega Vitti.
A primeira incursão da Netflix no formato noveleiro trouxe novidades para atores já familiarizados com esse universo. Ainda que o produto final seja um melodrama, o formato como ele foi realizado fez toda a diferença, diz Juliana Paes.
“A gente só gravou em cenário, não fez nada em estúdio. Isso já traz outra qualidade. A linguagem é também mais sutil. Quando a personagem está sofrendo, você não precisa necessariamente mostrá-la se debulhando em lágrimas. Se ela está de costas, você entende que aquilo está acontecendo. Essa linguagem, um pouco mais sofisticada, não subestima o telespectador.”
Tais nuances, comenta a atriz, fazem com que o telespectador se prenda à tela. “Não dá para você sair para beber um copo d’água.” Juliana se diz impressionada com os silêncios. “Na televisão, isso não é muito trabalhado, mas os silêncios falam muito dentro de uma narrativa dramática.”
Vitti compara: nos folhetins, fazia de 40 a 50 cenas por dia em um único cenário; em “Pedaço de mim”, filmou quatro ou cinco no mesmo período. “Na novela, sei como o personagem começa, mas não sei onde ele vai acabar. Se ele não agrada, a direção redireciona. Aqui foi uma história fechada, quase como longa-metragem.”
As famosas “barrigas” não têm espaço em uma produção com menos de 20 episódios. “É como se você pegasse essa carne suculenta que tem a novela e a deixasse magrinha, sem as gorduras que a produção de sete, oito meses tem. Em um momento, você pode assistir e falar que está parecendo novela. No momento seguinte, ela dá uma arrancada e acontecem situações em que parece aquelas séries de ficar o dia inteiro maratonando”, continua Vitti.
Mergulho vertical
Juliana revela que a Liana lhe provocou algo inédito. “Em uma novela de cento e poucos capítulos, você consegue viver a vida no set e a vida em casa, separa bem as duas coisas. O processo no streaming foi de mergulho mais vertical, denso. Pela primeira vez, foi bem complicado para mim voltar para o meu corpo sexual, por causa do componente do abuso. Fiquei com o corpo sensibilizado durante um tempo depois das gravações, sem querer muito o toque. A série mexeu muito comigo de um jeito que não é consciente.”
Depois desta mocinha, Juliana Paes volta ao streaming no papel de vilã, a terceira de sua carreira. Com estreia em agosto no Disney+, “Vidas bandidas” a apresenta como Bruna, chefe de uma quadrilha que assalta turistas no Rio de Janeiro.
“PEDAÇO DE MIM”
A série, com 17 episódios, estreia
na sexta-feira (5/7), na Netflix