Seis por meia dúzia

''Abraçar é dizer com as mãos o que a boca não consegue. Porque nem sempre existe palavra para dizer tudo.'' Mário Quintana

DF - Concursos - Lorena Pacheco
postado em 26/05/2019 08:00
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Era reforma da Previdência. Virou Nova Previdência. Por quê? As palavras são mágicas. Algumas chocam, causam dor ou provocam imagens desagradáveis. A saída? Apelar para outras, sem a carga da rejeição.

A mudança nas regras da aposentadoria vem levando pancadas há mais de duas décadas. Este ano não foi diferente. Apanhava da direita, da esquerda, de cima e de baixo. O jeito? Convocar o eufemismo. Ao trocar seis por meia dúzia, o governo adoça o termo e, com isso, torna-o mais palatável.

Vade retro

Há exemplos pra dar, vender e emprestar. Muitos não gostam de pronunciar a palavra morte. Sentem medo. O que fazem? O mesmo que Bolsonaro & cia. Manuel Bandeira chamou-a de “a indesejada das gentes”. Outros dizem falecimento, viagem, ida desta pra melhor, mudar-se para a companhia do Senhor, espichar as canelas, vestir paletó de madeira, bater as botas. E por aí vai.

Diabo não fica atrás. A língua oferece mil artimanhas para fugir do espertalhão que, dizem, não é perigoso por ser diabo, mas por ser velho, pra lá de vivido. Eis recursos: demo, bicho, cão, beiçudo, canhoto, coxo, anhangá, coisa ruim, anjo rebelde. Valha-nos, Deus! Vade retro, satanás!

Entre tapas e beijos

A relação do presidente com o Congresso é pra lá de instável. Ora Sua Excelência trata deputados e senadores como inimigos do Brasil. Ora os bajula como filhos mimados. A alternância de ataques e afagos mereceu editorial da Folha de S. Paulo com este título: “Aonde vai Bolsonaro?”

Leitores ficaram com a pulga atrás da orelha. O xis da questão não era o conteúdo, mas o pronome interrogativo. O “aonde” está correto? Está. O trissílabo se usa com verbos de movimento que exigem a preposição a. É o caso de ir. Ele preenche as duas condições (a gente vai a algum lugar): Aonde ele vai? Não sei aonde ele vai. Gostaria de adivinhar aonde ele foi.

Superdica

Na hora de escrever aonde pintou a dúvida? Recorra ao troca-troca. Substitua a por para. Se a dissílaba couber, vá em frente. Dê a vez ao aonde: Para onde ele vai? Não sei para onde ele vai. Gostaria de saber para onde ele foi.


Olho vivo

Trata-se de truque. A mudança de preposição muda o significado do verbo:

Ir a = deslocamento breve: ir ao cinema, ir ao teatro, ir ao clube, ir a Santos.

Ir para = deslocamento demorado. Em geral implica mudança: Foi para a Austrália na esperança de conseguir emprego melhor. Vai para Oxford fazer o doutorado. Na busca de oportunidades, jovens vão para grandes centros.

Ação e reação

O contingenciamento do rico dinheirinho da Educação causou estragos na imagem do governo. Levas de estudantes invadiram as ruas. Faixas pediam ensino melhor. Nada mais justo. Em resposta, a equipe econômica liberou R$ 1,58 bilhão para o MEC. Oba! A imprensa aplaudiu a iniciativa, mas descuidou-se da língua.

Muitos escreveram “1,58 bilhões”. Tropeçaram na gramática. A concordância de milhão, bilhão, trilhão & cia. se faz com o número que vem antes da vírgula: 1,58 bilhão, 2,1 trilhões, 10,35 milhões.

Leitor pergunta

Doeu nos ouvidos e na gramática ouvir a apresentadora do Sport de quarta perguntar ao repórter, ao vivo, em Portugal, cobrindo a seleção feminina de futebol: " O pessoal já estão descansando?" Tropeço na concordância, não?
Vicente Limongi, Brasília

Ops! O sujeito coletivo leva o verbo para o singular: O pessoal já está descansando. O rebanho era composto por 5 mil cabeças de reses. O povo aplaudiu o espetáculo.

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Consultei o Aurélio, mas achei a explicação confusa. Por isso, peço ajuda. Familiar e familial são sinônimos?
Francisco Lopes, BH

São. Os dois adjetivos têm o mesmo pai e a mesma mãe. Querem dizer relacionado à família, doméstico. Modernamente há preferência por familiar, não? Daí núcleo familiar, desestruturação familiar, assunto familiar.

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