Convidado do Podcast do Correio Braziliense, o Frei David Raimundo dos Santos, fundador da Educafro, destacou, ontem, a revisão da lei de cotas para negros, indígenas, pessoas com deficiência e estudantes de baixa renda.
Em entrevista às jornalistas Mariana Niederauer e Rosane Garcia, Frei David enfatizou a necessidade de implementação de políticas públicas e também cobrou a efetiva aplicação da Lei n° 10.639/2003 — que inseriu na grade curricular a história e cultura afro-brasileira, na qual foi feita uma revisão.
- Lei das Cotas: Barroso dá prazo a Lula e ao Congresso
- Pesquisador da UnB recebe prêmio internacional de engenharia em aviação
- Governo lança título público para financiar estudos
Também comentou a Lei n° 12.711/2012, que institui as cotas raciais e sociais nas universidades, beneficiando negros (pretos e pardos) e indígenas, pessoas com deficiência, alunos de baixa renda e estudantes de escolas públicas em universidades, com duração de 10 anos. Ante a reação da sociedade, o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), admitiu aprovar somente a prorrogação dos efeitos por mais uma década, sem que houvesse qualquer mudança.
Os movimentos sociais, no entanto, entenderam que seria melhor adiar a votação, na expectativa de que as eleições de 2022 poderiam levar ao Congresso Nacional candidatos progressistas e aliados da luta do Movimento Negro. Assim, a revisão, prevista para ser feita no ano passado, foi adiada. Neste ano, a deputada Dandara (PT-MG) foi escolhida para aprimorar o marco legal e a lei passou pela avaliação dos parlamentares na Casa. O texto está no Senado Federal para votação.
Para o frei David Raimundo, Dandara fez um "belíssimo trabalho, conversando com todas as forças políticas da Câmara dos Deputados, principalmente os conservadores e a oposição ao governo". Ele frisou que a versão aprovada pela Câmara contempla recursos para garantir alimentação, moradia e atenção à saúde mental de jovens negros e indígenas. A expectativa, segundo Frei David, é que o projeto seja aprovado no Senado sem alterações e siga para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
"O jovem negro sofre muito e acaba cometendo suicídio devido à dificuldade que ele encontra. A universidade brasileira ainda insiste em virar as costas para os jovens negros e indígenas. São tratados com indiferença. Queremos celeridade, porque estamos navegando em mares cheios de tubarões e outros animais inimigos do negro, do índio e das pessoas com deficiência", afirmou.
O religioso avaliou ainda que um dos problemas que a sociedade enfrenta está no número de cotas ocupadas pelos pardos. De acordo com ele, "90% de pessoas pardas — brancas, que nunca se assumiram negras, agora se declararam afro-brasileiras para tirar vantagens em cima da lei de cotas", criticou. "É uma vergonha, termos juízes fraudando cotas de negros. O que vai ajudar a resolver esse problema é a autonomia das universidades. A Universidade de Brasilia (UnB), por exemplo, conseguiu remover as pessoas pardas claras", citou.
"É inadimissivel, uma pessoa branca fazer um curso de medicina numa cota para negros. Ela tem no mínimo que devolver todo o dinheiro que usou do Estado para que a universidade possa abrir outra vaga para um negro. A cota é para negro, então vamos fazer uma eliminação natural dessas pessoas pardas brancas e assim reduzir muitas fraudes", completou o Frei David.
Educafro
A Educafro, fundada em 1997, é uma organização não-governamental (ONG), que tem como objetivo trabalhar pela inclusão de negros e pessoas pobres em geral nas universidades públicas ou particulares (com bolsa de estudos que pode chegar até 100%).
Uma das bandeiras da ONG é reivindicar do Estado que cumpra suas obrigações, por meio de políticas públicas e ações afirmativas na educação, voltadas para negros e pobres, promoção da diversidade étnica no mercado de trabalho, defesa dos direitos humanos, combate ao racismo e a todas as formas de discriminação.
Mais de 60 mil pessoas negras tiveram acesso ao ensino superior por meio do Educafro, desde a fundação da entidade.
Reportagem da jornalista Laezia Bezerra