Educação inclusiva

Ribeiro vai explicar declarações sobre crianças com deficiências na Câmara

O ministro da Educação chegou a dizer que 12% das crianças deficientes têm um grau de deficiência que é impossível a convivência com outros alunos. A audiência pública está marcada para acontecer às 16h, desta quarta-feira (1º/9), na Câmara dos Deputados

Maria Eduarda Cardim
Gabriela Bernardes*
postado em 31/08/2021 17:12 / atualizado em 31/08/2021 17:14
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

Com o nome estampado nas manchetes nos últimos dias por causa de declarações polêmicas sobre o ensino inclusivo, o quarto e atual ministro da Educação, Milton Ribeiro, repete a trajetória de seus antecessores e em menos de um mês retorna a Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (1º/9) para explicar aos parlamentares as afirmações sobre o ensino inclusivo de alunos com deficiências.

O requerimento de convite, apresentado pelo deputado federal Danilo Cabral (PSB/PE), foi aprovado na última semana, e Ribeiro deve se apresentar às 16h, desta quarta (1º) em uma audiência pública conjunta das Comissões da Educação; de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência; de Direitos Humanos e Minorias.

Da última vez que esteve na Casa, teve que explicar porque o governo federal tentou barrar a lei que garante internet e aparelhos para estudantes e professores de escolas públicas. Dessa vez, a intenção é que ele explique os ataques que Ribeiro fez à educação inclusiva. O ministro chegou a dizer que 12% das crianças deficientes têm um grau de deficiência que é impossível a convivência com outros alunos. 

Para o autor do requerimento, as falas do ministro da Educação são revestidas de preconceito e de desrespeito. “Na prática o que o ministro está pregando é uma educação que segrega, uma prática completamente equivocada porque ele nega que o processo de inclusão de 1,3 milhão de crianças com deficiências é um processo de aprendizado mútuo porque as pessoas com deficiência também ensinam as crianças que não possuem deficiência a importância desse convívio, do respeito às diferenças", avaliou o deputado Danilo Cabral em entrevista ao Correio.

A psicopedagoga Edilaine Geres afirma que um comentário como o de Ribeiro, vindo de uma personalidade que representa a educação de um país, representa um atraso em termos de inclusão e igualdade. "A inclusão é muito mais do que um olhar para um único fator, uma única característica que possa ter um indivíduo. Isso é totalmente inaceitável. Eu discordo totalmente [das falas do ministro] e não dá pra dizer que essa criança não pode estar na escola. Se a gente for pensar nesses termos, então teríamos que fazer uma sociedade também para essas crianças, elas teriam que estar sempre em um mundo à parte? Elas não poderiam estar inseridas em um contexto social ou em uma função social? Foi totalmente infeliz a fala do ministro perante a tudo isso, enquanto nós buscamos tanto diminuir essa segregação e buscamos mais respeito humano, acima de tudo”, disse.

Falta de diálogo

O líder do PSB, que já foi Secretário Estadual de Educação do Recife, tinha expectativa de instalar um diálogo melhor com Ribeiro, depois de lidar com a “forma agressiva” do ex-ministro e economista Abraham Weintraub, mas não foi isso que aconteceu. “A única proposta que foi encaminhada pelo governo Bolsonaro foi o homeschooling. São símbolos que estão postos nas falas e nas atitudes do governo de uma política de segregação e de negação da importância da educação justamente no momento que o Brasil precisava valorizar a pauta”, analisa.

O deputado é coautor do projeto que virou a Lei da Conectividade (14.172), que destinaria R$ 3,5 bilhões para estados e municípios a fim de garantir internet gratuita para as escolas públicas e é ponto de conflito entre o Ministério da Educação e os parlamentares. Isso porque ela foi vetada pelo presidente Jair Bolsonaro, sob a justificativa de que não apresentava estimativa do respectivo impacto orçamentário e financeiro.

Sem acordo e com a derrubada do veto no Congresso, o Poder Executivo, então, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar barrar a promulgação da lei. O STF, porém, não a suspendeu, mas ampliou o prazo de cumprimento do pagamento. Mesmo assim, o presidente Jair Bolsonaro publicou uma medida provisória (MP 1060) que retira o prazo de 30 dias, após a publicação da lei, para que a União repasse os R$ 3,5 bilhões aos estados e municípios. A medida também retirou a exigência de transferência em uma única parcela.

Judicialização

Dessa forma, os parlamentares também buscam na justiça uma forma de resolver a questão e a execução da lei. O Partido Socialista Brasileiro (PSB) entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no STF para derrubar a Medida Provisória. Para Cabral, o governo federal busca burlar uma decisão do Congresso.

“O governo sempre aponta dificuldades para cumprir as condições fiscais, mas nesse caso quando nós aprovamos o projeto nós apontamos de onde deveriam sair os recursos. Eram do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), que tinha recursos que poderiam ser aplicados para isso e o governo alegou falta de recursos”, explica.

“Na prática, o que a gente tem mais uma vez é o governo completando quase 20 meses em exercício e a gente não tem uma política para a área da educação”, completa. Edilaine Geres avalia que, enquanto não houver unidade e propostas mais consolidadas, a inconstância na gestão do Ministério dificulta que a educação progrida no país.

“Enquanto não alinharmos e não tivermos políticas públicas que, independente de troca desse ou daquele, seja secretário, ministro ou partido político, e seguirmos as mesmas linhas e não houver tanta alteração não só dos cargos dificilmente nós atingiremos o que buscamos, que é a melhoria da qualidade dessa educação, não só em números, mas de significado realmente de um país que preza a educação”, explica a psicopedagoga. 

Em pouco mais de um ano e meio de governo Bolsonaro, quatro ministros passaram pelo comando do Ministério da Educação, mas nenhum deles conseguiu pacificar a pasta, que acumula polêmicas e convocações de ministros para explicarem ao Congresso Nacional medidas tomadas e declarações controversas.

Para a especialista, as constantes trocas no comando do MEC sinalizam a desorganização do governo com a pasta. ”Mostra uma fragilidade e nos dá a impressão de falta de planejamento, no sentido de longo prazo. Nós sabemos que, pensando em uma educação e buscando uma qualidade para uma nação, nós não temos que ser imediatistas, temos também que ter planos e metas e também todos os procedimentos estruturados, alinhados, planejados e traçados. Nós sabemos que uma transformação de uma educação no âmbito de uma nação leva-se um grande tempo”, afirma.

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