O Grupo de Atuação Estratégica das Defensorias Públicas Estaduais e Distrital nos Tribunais Superiores (Gaets), que reúne defensorias públicas de 11 estados e o Distrito Federal, entrou com um pedido de admissão como “amicus curiae” (amigo da Corte) em uma ação movida pelo partido Rede Sustentabilidade na qual se questiona o decreto do governo federal que lançou a Política Nacional de Educação Especial (PNEE). A mudança, segundo os autores do pedido, incentiva o processo de segregação de estudantes com deficiência e foi vista como retrocesso.
O processo está sob relatoria do ministro Dias Toffoli, que já pediu manifestação da União sobre a medida. Como amicus curiae, o grupo de defensores auxilia o Supremo com subsídios para embasar as decisões. O pedido de ingresso foi aceito, ontem, por Toffoli.
O Gaets ressalta que a mudança viola a Constituição Federal, “que veda quaisquer formas de discriminação”, e também a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), “que traz como princípio a não discriminação das pessoas com deficiência sob alegação de deficiência, inclusive nas escolas”.
A chamada “Política Nacional de Educação Especial” elaborada pelo governo Bolsonaro prevê a educação de alunos com deficiência em salas e escolas especiais — o programa é visto como retrocesso por especialistas e possivelmente discriminatório, pois abre brechas para as escolas regulares, que hoje educam cerca de 90% das crianças com deficiência, passarem a rejeitar alunos com essas características, enviando-as para instituições especiais privadas.
Segundo os defensores, a mudança adotada pelo governo “atinge diretamente a garantia de acesso pelas pessoas com deficiência a um sistema educacional inclusivo e aprendizado ao longo de toda a vida”, além de ferir os direitos de não ser discriminado e o de participar na elaboração de políticas públicas voltadas para pessoas com deficiência.
O Gaets pontua ainda que uma decisão do Supremo sobre o assunto impactará não somente no âmbito educacional de pessoas com deficiência como também na inclusão dessa população em outros aspectos da vida em comunidade.
“Esta decisão, pelo peso e protagonismo de que é dotado seu prolator, órgão máximo do Judiciário Nacional, poderá representar avanço de revelo no caminhar do povo brasileiro em direção à eliminação de todas as barreiras — em especial as atitudinais — em relação às pessoas com deficiência”, apontam os defensores.
No pedido, os defensores apontam que, segundo dados do IBGE do Censo 2010, cerca de 23,9% da população declararam ter pelo menos uma deficiência. “A norma em questão possui elevado impacto social, de modo que a análise da sua constitucionalidade constitui matéria de inegável relevância”, frisa o grupo.
Adaptação
Defensor público no Rio de Janeiro, com representação em Brasília, Pedro Carriello afirma que o decreto “além de inconstitucional, traz prejuízos às crianças com deficiência”. “Ele altera algo que estava dando certo na socialização da criança e adaptação de um mundo real, tanto para a criança que não tem qualquer dificuldade a conviver, como para aquela que tem”.
No pedido, os defensores justificam, ainda, que a inclusão na qualidade de “amicus curiae” tem como intuito “ampliar o debate, juntar documentos e prestar informações relevantes aos convencimentos dos eméritos ministros”.
A ação foi apresentada no último dia 6 pela Rede, que questiona a política do governo que incentiva a separação de alunos com deficiência para instituições especiais. Segundo o partido, o foco da política deveria ser dar mais estrutura às escolas regulares do que direcionar verbas às instituições especiais, que vem perdendo financiamento do governo desde 2008, quando passou a vigorar a política de inclusão de pessoas com deficiência em escolas regulares.
“Serão drenados, assim, os recursos que deveriam se destinar ao aprimoramento de instalações físicas, treinamento de professores e outras medidas necessárias à consecução da política de inclusão”, apontou o Partido.
Liminarmente, a Rede pede ao Supremo que suspenda o decreto que prevê a “Política Nacional de Educação Especial” e, no mérito, considere o texto inconstitucional.