
Campinas (SP) — Isaquias Queiroz é um baiano que tem como trilha sonora no início de novo ciclo olímpico o samba. Mais especificamente, Deixa a vida me levar, sucesso na voz de Zeca Pagodinho. A explicação está em como encara os primeiros compromissos em 2025. O discurso após obter a prata do C1 1000m nos Jogos de Paris-2024 era deixar de lado as disputas em duplas para focar no individual. Também havia o planejamento para um período de treinos menos intenso. Nada disso aconteceu.
O segundo maior medalhista olímpico do país — empatado com o velejador Robert Scheidt (5) e atrás da ginasta Rebeca Andrade (6) — tomou outros rumos, como força total na preparação para o Mundial e postura solidária para não abandonar a canoa a dois e prejudicar o companheiro. Até virar youtuber está nos planos para o ano.
"O combinado com o Lauro (Souza, treinador) não aconteceu. Ele falou que este ano seria tranquilo, mas não foi nem culpa dele, fui eu mesmo. Sou competitivo, gosto disso e sei que no Brasil não se pode perder, né?", explica.
“Fiz uma boa base em Capitólio (MG) em fevereiro e nem vi o Carnaval passar. Também não me interessa muito não. São João, sim, mas Carnaval, não. Diferentemente dos últimos anos, foi melhor. Estamos treinando bem, evoluindo, fizemos testes com o COB (Comitê Olímpico do Brasil) e os resultados de eficiência de remada foram bons”, detalhou Isaquias, durante ação com o Flamengo na feira CBC & Clubes Expo, no interior de São Paulo.

Isaquias vislumbra a quarta Olimpíada da carreira. Gostaria de se dedicar exclusivamente à prova individual em Los Angeles-2028, disputa na qual se vê com mais chances. Para isso, teria de abdicar do C2, o que ainda não aconteceu. Mesmo assim, encara a missão com seriedade. Quer vencer e enxerga até um caminho para subirem ao pódio na categoria.
“Não era intenção minha remar o C2, nem do Lauro. Só que, ao longo desse tempo, tive de entrar no C2, porque senão até o Jacky Godmann seria prejudicado. Mas, para ganhar com o C2, a gente sabe que vai ter de remar quase todo dia. Vamos fazer algumas adaptações para ver se a gente consegue dentro de um Mundial ou até na Olimpíada, se a gente consegue dividir a semana meio a meio, para o C1 e C2. Vamos aproveitar esse primeiro ano para fazer este teste e se der certo a gente seguir”, explica.
“Hoje eu estou que nem o Zeca Pagodinho, deixando a vida me levar, só remando e fazendo meus treinamentos”, completa o bem-humorado medalhista. Há algumas diferenças entre o Isaquias de agora e o de dois anos atrás. Em 2023, pediu uma pausa para ter mais tempo com a família e tratar da saúde mental. Inclusive, mudou-se de Lagoa Santa (MG) para Ilhéus (BA). Teve desempenhos abaixo em 2024, sobretudo no Mundial. Hoje, o cenário é outro. Aos 31 de idade, tem entregado tudo nos treinos, a ponto de não ter ânimo para sair de casa e ter de buscar como não deixar a esposa e os dois filhos de lado.
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“Falei com a minha médica e estamos tentando encaixar programas na minha rotina. Em 2023, eu deixei a concentração da Seleção, porque eu não estava conseguindo viver a vida. Eu só treinava. E falei para ela que estava voltando para a mesma situação. Tenho disposição para caramba para treinar. Acordo, vou treinar, volto, almoço, durmo, vou treinar, e isso para mim é natural. Mas eu não consigo achar energia, força, vontade de sair de casa. Fim de semana eu passo o dia inteiro em casa. Atualmente eu só tenho dormido”, relata.
Para Isaquias, 2023 serviu para “reiniciar a vida”. Agora, ele novamente busca encontrar o botão de reset e equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Uma das saídas pode ser a vida youtuber. Há o desejo de compartilhar mais sobre o dia a dia, mostrar a casa que adquiriu em Lagoa Santa (MG) e o amor pela natureza.
“Estou pensando em disponibilizar mais sobre a minha rotina em canal de YouTube. Quero desenvolver mais as minhas redes sociais e mostrar mais minha vida particular. Sei que é arriscado, porque sei que quanto mais público, mais cobrança. Mas eu tenho de sair um pouco desta vida de só esporte. Quero ter outras obrigações na casa, alimentar galinhas. Algumas já têm até nome: Gertrudes e Rafinha. Vou comprar umas dez. Estamos preparando o galinheiro. Queremos criar um ambiente de lazer para além do sofá.”
Nesta semana, o Flamengo anunciou a renovação de contrato com o Isaquias Queiroz para o ciclo até os Jogos de Los Angeles-2028. Ao comentar sobre a extensão do vínculo, o canoísta destacou sobre como gostaria de promover o desenvolvimento de novos atletas da modalidade e “alfinetou” o clube. “
Falamos para estar mais juntos e conectados, envolvidos com o projeto da canoagem. Isso eu cobrei muito do Flamengo. A escolinha não aconteceu. Tivemos uma conversa franca sobre focar no desenvolvimento da escolinha. Na Bahia e em Lagoa Santa (MG), em um e dois anos, a escolinha estava ganhando medalha. Não é possível que o Flamengo, com toda a estrutura que tem, não consiga criar campeões. Canoagem não é tão difícil assim”, protestou.
*O repórter viajou a convite do Comitê Brasileiro de Clubes (CBC)