Quem é rei nunca perde a majestade. Muito pelo contrário! Ganha mais joias preciosas na coroa. Aos 71 anos, Paulo Roberto Falcão teve motivos para se emocionar na noite desta quarta-feira (4/12), em Brasília. Em meio ao banquete oferecido pela Embaixada da Itália ao Rei de Roma, houve pausas para perguntas sobre o resultado do time do coração dele. Queria saber o placar do Internacional contra o Botafogo e até fez cálculos na projeção do título alvinegro no Campeonato Brasileiro. Entre uma taça de vinho tinto e outra, e a degustação da saltimbocca alla caponata, o catarinense de Abelardo Luz mostrou uma certa preocupação com o desempenho do rebaixado Criciúma diante do Flamengo.
O prato principal da noite não era a penúltima rodada da Série A, mas o legado de Paulo Roberto Falcão em outra Serie A: a da Itália. Anfitrião, o embaixador Alessandro Cortese chutou a rivalidade para escanteio antes do jantar e marcou um gol de placa na celebração dos 150 anos da imigração italiana no Brasil. Torcedor da Lazio, Cortese entregou ao ídolo da Roma uma insígnia seletíssima assinada pelo presidente do país europeu, Sergio Mattarella: Ordine della Stella d'Italia (Ordem da Estrela da Itália).
Criada em 2011, a condecoração é destinada a cidadãos italianos residentes no exterior ou a estrangeiros que tenham adquirido méritos especiais na promoção das relações de amizade e cooperação entre a Itália e outros países, como o Brasil.
Paulo Roberto Falcão desembarcou na capital italiana em 1980 para vestir a camisa da Roma. Em 14 de setembro daquele ano, debutou com o uniforme giallorossi no no Estádio Sinigaglia, em Como. Era o primeiro dos 152 jogos e 27 gols no time pelo qual conquistou o Campeonato Italiano na temporada de 1982/1983, as edições de 1980/1981 e de 1983/1984 da Copa Itália e o vice na Copa dos Campeões, atual Champions League, contra o Liverpool, em 1983/1984, no Estádio Olímpico.
"Falcão é um ídolo de toda uma geração de torcedores (da minha geração), especialmente na capital da Itália, Roma. Sua figura foi tão icônica que chegou a ser chamado de Oitavo Rei de Roma" Alessandro Cortese, embaixador da Itália no Brasil
Emocionado, Falcão tirou folhas de papel do bolso do impecável terno azul de corte italiana, óbvio, e tentou não se emocionar. A voz ficou embargada ao mencionar a mãe, Azize Pedro, e o técnico responsável pela rápida adaptação de Falcão ao time da Roma: o sueco Nils Liedholm.
"É muita emoção. Primeiro, porque eu não esperava. Veio em um momento no qual não jogo mais futebol. Estava brincando com o pessoal que não faço gol há 40 anos. A vibração do gol da torcida da Roma sempre foi fantástica. Essa condecoração mostra não somente o campo de jogo, mas o que a gente fez fora do campo: posicionamento, postura, coisas que fizeram com que eu estivesse ganhando hoje essa condecoração", disse o craque em entrevista ao Correio Braziliense.
O craque tentava driblar o sentimento com aquela elegância exibida nos gramados, mas não conseguia. "A gente fica, assim, numa situação de medir as palavras, porque quando a gente fala além se emociona demais. É maravilhoso se emocionar. Estou tentando me segurar um pouco. Isso é muito meu. Tenho muitos momentos para me emocionar", explicou.
Um desses momentos é lembrar-se justamente dos personagens da Roma. A estreia, por exemplo, foi ao lado de outros 10 companheiros: Tancredi, Spinosi, Maggiora, Turone, Romano, Conti, Di Bartolomei, Pruzzo, Ancelotti e Amenta. Francesco Rocca entrou depois.
"Essa condecoração mostra não somente o campo de jogo, mas o que a gente fez fora do campo: posicionamento, postura, coisas que fizeram com que eu estivesse ganhando hoje essa condecoração" Paulo Roberto Falcão, ex-jogador
Um meia pedir a camisa 5 na Itália representa uma tentativa de quebrar protocolos. "A cinco era uma camisa que na Itália era usada pelo líbero, que jogava atrás da zaga. Eu jogava na frente. Lembrei dele agora, uma figura muito importante na minha vida italiana", justificou Falcão.
O técnico sueco topou o risco. "Ele me deu a cinco. Eu fiz um texto à época, mandei entregar para ele, não entreguei pessoalmente, e disse: ‘mister, estou mandando a mesma camisa que o senhor me deu quando cheguei aqui. Mandei entregar para o senhor porque se entregasse da minha mão para a sua, eu tenho certeza de que ficaríamos cheios de emoção e não valorizaríamos tanto o momento. Esconderíamos emoções, uma coisa típica nossa. Ele nos deixou faz muito tempo (8/10/1922 a 5/11/2007), mas aprendi muito com ele", reforçou.
Mencionado pelo embaixador Alessandro Cortese como Rei de Roma, e não Il Divino, como preferem outros romanistas, Falcão mostrou humildade ao falar sobre o título dado a Rômulo, Numa Pompílio, Túlio Hostílio, Anco Márcio, Tarquínio Prisco, Sérvio Túlio e Tarquínio, o Soberbo, ou seja, os sete reis do império. "Quando as pessoas dizem isso, eu sempre afirmo o seguinte: ‘a vaidade adora, mas a inteligência bloqueia essa vaidade’. Eu sempre acho que a vaidade não pode ser maior do que a inteligência. É um exagero evidentemente, mas é um exagero que eu fico feliz, mas nesses momentos eu coloco a inteligência um pouquinho à frente da vaidade, mas fico feliz", filosofou o craque.
A relação de Falcão com Roma é forte. Durante o banquete oferecido a ele, mencionou as próximas viagens. Voltaria ao hotel para mais uma noite de rei, arrumaria as malas para deixar Brasília pela manhã, com elogios ao trânsito da capital federal, faria uma escala em casa e logo embarcaria rumo ao novo destino. "Vou para a Itália, olha que coisa chata", brincou.