O Grande Prêmio do Brasil de 2024 passou, mas uma saudade especial permanece forte entre os torcedores: voltar a ter um brasileiro na Fórmula 1. Desde 2017, quando Felipe Massa deixou a Williams, o país não sabe o que é ter um representante na principal categoria do automobilismo mundial, encerrando uma sequência de 48 anos com ao menos um piloto carregando a bandeira verde-amarela no grid. O jejum, no entanto, parece cada vez mais perto de chegar ao fim e rende motivos para acreditar que, em breve, o Hino Nacional tocará novamente no topo do pódio.
As principais esperanças estão em Gabriel Bortoleto. O jovem de 20 anos foi campeão da Fórmula 3 no ano passado e lidera a Fórmula 2 na atual temporada, restando apenas duas etapas para o fim do campeonato. O desempenho do garoto, que faz parte do programa de desenvolvimento da McLaren, fez aumentar os rumores de um acordo para assumir um lugar na Sauber em 2025, mas um possível vínculo ainda está em negociação.
No entanto, nem mesmo o título da F2 é significado de lugar garantido na Fórmula 1. Exemplo disso é Felipe Drugovich, campeão da categoria em 2022, mas que segue apenas como reserva na Aston Martin e viu o nome perder força nos bastidores por uma vaga de titular. Ele, inclusive, ficou na expectativa de poder correr no lugar de Fernando Alonso em Interlagos, mas o espanhol se recuperou a tempo de um problema gastrointestinal e pôde participar da prova.
“Acho que falta oportunidade mesmo. Eu e o Gabriel fizemos tudo o que precisava ser feito para mostrar que a gente merece estar lá, está faltando só uma chance. A ansiedade só cresce a cada ano que passa e não temos um brasileiro na F1, não só minha, mas de todo o Brasil. Eu quero estar no grid da F1 não só como reserva, mas como piloto principal pelo ano inteiro. Não tem muito o que falar, é mais agir e continuar fazendo o que sabemos fazer de melhor, que é andar bem na pista”, contou Drugovich ao Correio.
Quem conhece bem a falta de oportunidades é Pietro Fittipaldi. Mesmo aos 28 anos, o neto do bicampeão Emerson Fittipaldi assumiu o papel de “veterano” da geração de pilotos brasileiros e foi o último a correr pela F1, quando substituiu Romain Grosjean, da Haas, em duas etapas de 2020. Ainda assim, em anos como reserva, nunca foi convocado para um posto integral e atualmente se divide como terceiro piloto do time americano e na Indy.
“A Fórmula 1 é muito difícil, porque só tem 20 vagas e não é todo ano que muda piloto, a gente já viu temporadas que não entrou nenhum novato. Então você está lutando por quem sabe uma ou duas vagas no ano, e olhe lá. Tem milhares de pilotos no mundo querendo estar ali, então é muito muito difícil entrar na F1. É diferente de qualquer outro esporte”, explicou.
Enzo Fittipaldi, irmão caçula de Pietro e piloto da F2, reforçou o coro do irmão, mas fez questão de ressaltar que o problema não é pela qualidade dos postulantes a vaga. “O talento com certeza não falta aqui no Brasil. Tem vários pilotos brasileiros nas categorias júnior que estão ganhando e mostrando o quão bons são. Tem que ter um brasileiro no grid da F1 e vamos ter isso em breve, pode ter certeza”, acrescentou.
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Dificuldades
Para um país que já teve 32 pilotos e ostenta oito títulos na Fórmula 1, não ter mais um representante mostra que os problemas são maiores do que apenas a falta de oportunidade. O Correio procurou escutar outros nomes importantes no cenário do automobilismo nacional para entender o que mais dificulta os brasileiros a marcarem presença entre os melhores do mundo.
“O kart é muito importante, começa por lá. O incentivo está aumentando e vamos colher esses frutos no futuro, mas por muito tempo faltou essa parte. É na base que precisamos trabalhar, porque lá que nascem os novos talentos”, analisou o bicampeão Emerson Fittipaldi. “O lado financeiro foi uma grande dificuldade na minha época. Hoje está melhor, apesar de ser mais caro, mas é um fator que sempre pode dificultar”, somou Felipe Massa.
Anunciada na última quarta-feira como piloto da F1 Academy, categoria de desenvolvimento exclusiva para mulheres, Rafaela Ferreira, deu o ponto de vista de como é para a geração atual, que precisa desbravar o mundo cada vez mais cedo.
“É um conjunto de fatores que influencia para um piloto poder estar disputando na ponta em grandes categorias. Para nós, brasileiros, logo de cara tem a dificuldade de ter que ir para fora, porque muitas competições são na Europa e nos Estados Unidos. Até por isso a parte financeira pesa muito. Correr já é caro, mas em euro e dólar dificulta ainda mais”, compartilhou a primeira mulher a vencer uma corrida na F4 Brasil.
Apesar dos empecilhos, o clima geral é de otimismo. Quem sabe, em 2025, o GP de Interlagos já não tenha uma bandeira brasileira entre os pilotos. “Eu sei que o cenário não é o que o Brasil queria, mas isso vai mudar. Desejo muita sorte a todos os pilotos, tenho certeza de que o futuro será incrível. Vou ajudar como puder, e vamos recolocar nosso país onde nunca deveria ter saído”, encerrou Bortoleto.