O Brasil desembarca na França para os Jogos Paralímpicos com o objetivo claro de figurar, pela primeira vez, entre as cinco maiores potências da competição. Para superar a campanha de sétimo lugar em Tóquio-2020, a delegação verde-amarela confia em quem começou na piscina de casa e se tornou referência nas grandes raias da natação brasileira: Wendell Belarmino. Protagonista do sexto capítulo da série Équipe Brasília, especial do Correio sobre os personagens da cidade no megaevento, o brasiliense de 26 anos ostenta um ouro, uma prata e um bronze na competição, mas almeja mais.
Paciente de glaucoma congênito, o nadador passou por 10 transplantes de córneas, mas seguiu com perda gradativa da visão. Em 2019, foi reclassificado da classe S12 para a S11, a maior da deficiência visual. Após tentar o hipismo, o começo na natação foi por recomendação médica.
"Sempre gostei muito de piscina e de água, até por ter em casa. Passava o dia inteiro nela depois da aula e, conforme fui crescendo, fiquei mais competitivo. Fui chamado para fazer aula de natação e, apesar de não ser voltado para disputa, eu tentava competir e chegar na frente dos outros. Assim começou", relembra.
De braçada em braçada, foi dominando as piscinas por onde nadou. A estreia em uma grande competição é exemplo disso, no Parapan de Lima-2019, quando ganhou medalha nas seis provas que disputou. Depois da edição de Santiago-2023, o total de conquistas subiu para 12, com mais meia-dúzia de pódios. A consagração foi nas Paralimpíadas de Tóquio-2020, quando faturou ouro nos 50 metros livres, prata no revezamento 4x100m livre misto 49 pontos e bronze nos 100m borboleta.
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O ciclo após subir ao pódio na capital japonesa, no entanto, apresentou novos percalços. Wendell precisou lidar com cirurgias nos ombros e problemas psicológicos, que o fizeram questionar até mesmo a continuidade nas piscinas. Sem saber o que o futuro lhe reservava, surgiu uma oportunidade para respirar novos ares, no Praia Clube, em Uberlândia (MG). O cenário agradou ao brasiliense, que topou a ida para outro estado.
"A mudança foi um pouco às pressas. Estava passando por um período bem difícil na minha carreira, pensei até em parar de nadar. O Praia Clube me ofereceu a oportunidade de ir para lá e me deram a estrutura para me recuperar das lesões que tive. Foi uma mudança que me fez muito bem, para minha carreira, para a vida pessoal e para a saúde mental, principalmente, que estava bem ruim", relata Belarmino.
Nova etapa
Próximo de cair na piscina para a segunda edição dos Jogos Paralímpicos, Wendell aterrissa em Paris com três medalhas na bagagem e a moral de ser esperança por mais conquistas para o Brasil. De admirador da lenda Daniel Dias, maior medalhista do Brasil no torneio (27), para inspiração de atletas da nova geração, aos 26 anos, o brasiliense está se acostumando com o papel de espelho para a garotada.
"Não consigo me considerar uma referência, mas sempre me falam que sou, e isso me deixa feliz. Faço sem esperar nada em troca. Nado porque amo o esporte, mas é um sentimento até de realização quando alguém me procura e diz que sou uma inspiração. É uma honra ajudar a trazer gente nova para a natação", celebra.
Mesmo assim, o nadador tenta encarar a disputa na capital francesa como a estreia no grande palco. Por todo processo que passou para estar entre os melhores do mundo nas piscinas da Arena Paris La Défense, o pensamento é de que a participação na Cidade Luz sirva como um recomeço, mas com um sonho em mente.
"Não estou me pressionando. Por enquanto, é sem ansiedade e sem pressão, mas vamos ver quando chegar na véspera da prova. A princípio, quero estar tranquilo e bem animado. O recorde mundial ainda está distante, eu queria muito, mas vamos ver o que dá para fazer. Quero performar o melhor possível e, se Deus quiser, vai dar tudo certo, porque o trabalho está sendo muito benfeito", ressalta o otimista Wendell.
*Estagiário sob supervisão de Victor Parrini