Breaking

Dançarino de Ceilândia conta como conseguiu ser jurado nas Olimpíadas de Paris

O Correio foi até o Recanto das Emas para conversar com Migaz, que foi um dos nove jurados de breaking nas Olimpíadas de Paris

Migaz durante uma competição -  (crédito: Divulgação/@haru_graphics)
Migaz durante uma competição - (crédito: Divulgação/@haru_graphics)

As Olimpíadas acabaram mas o legado dos atletas brasileiros continua ganhando força. Os Jogos de Paris 2024 foram palco da estreia do breaking, onde 16 b-boys e 16 b-girls competiram em busca de uma medalha. Infelizmente, nesta edição o Brasil não se classificou na competição, mas bateu na trave com o alto desempenho de Leony Pinheiro e da Mini Japa, que são grandes representantes do esporte. No entanto, o Brasil esteve presente na capital francesa de outra maneira: na bancada de jurados. 

Chardison Pereira Messias, mais conhecido como Migaz, foi o único brasileiro a compor a mesa de jurados do breaking nas Olimpíadas de Paris. "Foi bem responsa. Fui o único brasileiro a participar entre os jurados e isso é uma responsabilidade muito grande, é um trabalho muito sério, de imparcialidade. A gente obedece aos requisitos, o código de conduta e de comportamento", explicou.

O caminho até Paris não foi fácil. Migaz precisou passar por diversas etapas até a convocação. "Foi um processo longo, de mais de três anos. Participei de alguns eventos, como o Pré-Pan, o Pan-Americano, e o OQS (Olympic Qualifier Series), e nesse meu trabalho consegui ser convocado", relatou. 

O breaking está fora da próxima edição das Olimpíadas em Los Angeles, mas o esporte pode retornar em outras edições dos Jogos Olímpicos. O dançarino espera acompanhar competidores brasileiros no esporte e, quem sabe, trazer a medalha olímpica para o Brasil. "A gente espera que mais pessoas, b-boys e b-girls, estejam aderindo ao esporte e as Olimpíadas. Nós sabemos que temos competidores muito bons, mas que não querem participar do esporte. A gente respeita, mas sabemos que temos um potencial muito grande. O Brasil foi muito bem, chegamos ao Top 30 com o Leony e a Mini Japa, que passaram por todo o processo, toda a peneira, e ficaram no Pré-Olímpico. Mas foram muito bem entre os mais de 500 competidores do mundo. Isso é um mérito."

Migaz em Paris durante as Olimpíadas deste ano
Migaz em Paris durante as Olimpíadas deste ano (foto: Divulgação/@haru_graphics)

Como funciona a competição

O breaking é um estilo de dança urbana com origem em 1970, em Nova York, nos Estados Unidos. A modalidade está ligada à cultura do hip-hop e intercala movimentos rápidos, atléticos e acrobáticos com passos mais lentos. No breaking (ou breakdance) os participantes, chamados b-boys e b-girls, disputam uma dança com passos que incluem giros, deslocamentos no chão e movimentos laterais de ombros e de troncos. O confronto pode ser individual, em duplas, em trios ou em grupo.

"Funciona assim: nessa Olimpíada foi 1x1. Nas próximas poderemos ter mais modalidades, como 3x3 ou em grupo. São nove jurados, funciona por round e a gente vota pelo meio comparativo (entre as apresentações). Fazemos essa votação através das chaves, até chegar no campeão", explicou Migaz.

Migaz durante uma competição
Migaz durante uma competição (foto: Divulgação/@haru_graphics)

Polêmica com australiana

A estreia do breaking nas Olimpíadas de Paris 2024 gerou polêmica nas redes sociais por conta da apresentação da australiana Rachel Gunn, que compete usando o nome Raygun. Na sua performance, a atleta fez passos um tanto "curiosos", que geraram diversos memes na internet.

Após a apresentação, Rachel recebeu nota 0 dos jurados. "Ela passou pelo processo da Oceania, que é um campeonato continental. Os continentais mandavam direto para as Olimpíadas, vamos dizer que é um 'evento coringa'. Ela ganhou na Oceania, por mérito dela, passou pelo processo normal e foi para as Olimpíadas. Na verdade, lá (em Paris) era voto. Lá ela não ganhou nenhum voto, justamente por conta da diferença e do nível. O nível das outras era maior", considerou Migaz.

O b-boy, no entanto, ressalta que a australiana foi original durante a apresentação. "Dançar breaking é difícil quando chega no nível profissional. Ela teve o mérito dela, mas aconteceram esses memes, essas brincadeiras, por conta do nível dela ter sido mais baixo e ela também mostrar originalidade. Fez até o canguru, em homenagem à Austrália. E já viu, né, a internet não perdoa."

Início na Ceilândia

Hoje com 42 anos, Migaz começou a dançar breaking em 1999, por "pura diversão". O primeiro contato com a modalidade ocorreu na cidade de Ceilândia, local onde morou por vários anos. Segundo ele, o interesse nasceu por achar os movimentos "bonitos". Tempos depois, passou a integrar o grupo DF Zulu Breakers e começou a participar de campeonatos e projetos sociais.

"Conheci o DF Zulu lá (na Ceilândia). Conheci os meus amigos que dançavam e depois foi se tornando algo mais sério. Fui competindo e competindo até que, depois, o esporte apareceu e eu optei por ser árbitro, até por conta da minha idade. Acredito que deu certo, fui parar nas Olimpíadas", contou.

Breaking na vida de jovens da periferia

Migaz ressalta que o contato com o esporte e a cultura faz a diferença na vida dos jovens que moram em áreas periféricas, como na Ceilândia, por exemplo. "Com o breaking e a cultura hip hop, os jovens se identificam mais, até mesmo pela história e por ter iniciado na periferia, nos bairros mais pobres. Pelo breaking agora ser um esporte, acho que vai ajudar bastante. Temos centros olímpicos que ficam praticamente parados, então precisamos movimentar essa cena".

O dançarino deseja que os jovens sigam um caminho diferente do dele. Migaz começou a ter contato com o breaking na rua, por isso, espera que os jovens conheçam o esporte nas escolas. "Temos países onde as crianças de seis ou sete anos aprendem o breaking nas escolas. Acredito que o Brasil não pode ser diferente. Precisamos trabalhar na base. Eu aprendi breaking de outra forma, aprendi na rua, e quero que os jovens aprendam de outra forma: nas escolas e nos centros de treinamento", disse. 

DF Zulu Breakers

Robson Luis, mais conhecido como Robin One, compõe a quinta geração de dançarinos do DF Zulu Breakers. O grupo existe desde 1989 e surgiu na Ceilândia. Atualmente, tem vários polos em diversas localidades, incluindo Águas Lindas de Goiás e Recanto das Emas. Também há uma parte na Europa, mais especificamente em Portugal. "Eles tem executado um ótimo trabalho", diz Robin.

"Desta geração, da quarta para a quinta, o DF Zulu conta com 12 competidores, atletas que atuam em alto nível. No esporte, o DF Zulu tem alguns títulos. Recentemente pude trazer o quarto lugar no Brics. Sou atualmente o Top 8 do Brasil. No cultural, não tenho nem o que dizer, já que o DF Zulu é um dos grupos mais antigos do Distrito Federal e o mais renomado, que carrega mais de 20 prêmios internacionais", explicou. 

Robin faz parte do grupo há 12 anos e é atleta de breaking há 19. Em 2023, foi campeão do Goiânia Bboying World Break Championship, um dos maiores festivais da categoria. Neste ano, foi um dos representantes brasileiros no Brics Games, um campeonato multidisciplinar realizado em Kazan, na Rússia, no período de 12 a 24 de junho.

  • Migaz
    Migaz Bianca Oliveira/CB/D.A Press
  • Robin One
    Robin One Bianca Oliveira/CB/D.A Press
  • Robin One e Migaz
    Robin One e Migaz Bianca Oliveira/CB/D.A Press

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postado em 21/08/2024 16:31 / atualizado em 21/08/2024 16:55
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