Tarja das olimpiadas
PARIS-2024

As multifunções de Jade Barbosa na conquista do bronze da ginástica

De estilista na confecção da roupa de gala a "psicóloga" e até "matemática" no cálculo das notas na final por equipes: o peso da experiência em três Olimpíadas do amuleto verde-amarelo com o pódio inédito

Aos 33 anos, Jade Barbosa se orgulha da trajetória de três Olimpíadas e, agora, da primeira medalha -  (crédito: Abelardo Mendes Jr.)
Aos 33 anos, Jade Barbosa se orgulha da trajetória de três Olimpíadas e, agora, da primeira medalha - (crédito: Abelardo Mendes Jr.)

Paris — Com um sorriso de orelha a orelha e olhos marejados, Jade Barbosa chega para atender pacientemente aos jornalistas brasileiros na Arena Bercy. Naquele momento, apresentava uma versão extremamente emocionada, mas consciente. Ou melhor, diferente. A carioca de 33 anos não deixará Paris da mesma forma que chegou. Levará na bagagem de volta ao Rio de Janeiro, e na memória, a primeira medalha olímpica. O bronze na final por equipes vale ouro, embora o título tenha ficado com os Estados Unidos de Simone Biles e companhia. A Itália levou a prata. Afinal, é o maior reconhecimento de 18 anos de serviços prestados à ginástica artística do país. O último ato pode ter sido ontem, com Rebeca Andrade, Flávia Saraiva, Lorrane dos Santos e Júlia Soares, em uma atuação para além de atleta.

A final por equipes, na terça-feira (30/7), foi a única de Jade Barbosa pelo Brasil nos Jogos de Paris-2024. Ela não se classificou para nenhuma das decisões individuais dos próximos dias. Isso explica tanta emoção. A experiente atleta dificilmente competirá na próxima edição da Olimpíada, em Los Angeles, daqui a quatro anos. Por esse motivo, talvez tenha se doado tanto em diferentes versões.

Jade foi designer e estilista ao projetar os collants da Seleção Brasileira para a campanha na Cidade Luz. “Enfermeira” quando prestou apoio a Flávia Saraiva. A companheira cortou o supercílio após queda durante o aquecimento. Voz da consciência em momentos de tensão durante afinal, como quando Júlia Soares se desequilibrou na trave, caiu e seguiu aos prantos para o banco. Jade vestiu a roupa de ginasta somente uma vez em mais de duas horas de prova, quando requisitada para a hora da verdade no último dos quatro aparelhos: o salto sobre o cavalo. A nota 13.366 foi providencial para o somatório de 164.497.

A versão matemática também apareceu nos minutos que antecederam a comemoração. Fez as contas e secou as adversárias, sobretudo as britânicas e as canadenses. “Essa é a equipe dos sonhos. Algo que sempre almejamos. Meninas boas no individual e nos aparelhos. Fizemos o melhor planejamento possível para aproveitar anota de cada uma e usamos o Mundial para isso. Primeiro, competimos para classificar para a Olimpíada, e concluímos. No segundo dia, era melhor competição possível e conseguimos uma medalha que sempre sonhamos. Essa equipe se conhece muito. Por isso, falamos tanto sobre ser resilientes. Nos adaptamos às situações e mostramos isso. Foram vários testes que foram essenciais para, apesar das coisas difíceis, lidarem cada situação”, avaliou.

Antes mesma da primeira medalha olímpica, Jade era uma referência da ginástica artística brasileira. Caloura quando Daiane dos Santos brilhava. Dividiu alegrias e tristezas com Daniele Hypólito e Laís Souza. Hoje, passa simbolicamente o bastão para a nova geração. As sucessoras de Rebeca Andrade e Flávia Saraiva. Júlia Soares, por exemplo, tem 18 anos. É a caçula do grupo e terá a chance de conquistar outra medalha: a da trave, na segunda-feira. “Difícil colocarem palavras, mas agradeci por merecer viver esse momento com elas. Fiz parte de muitas gerações. Muitas possibilidades vieram, mas só agradeci por merecer. Muitos têm capacidade, mas só alguns podem sair com esse resultado mágico”, discursou Jade.

A mágica descrita por ela é a virada. O Brasil não esteve entre os três primeiros colocados em nenhum momento. Fechou a primeira rodada em quarto. Depois, caiu posições e parou em sexto lugar após falhas. A confirmação da conquista veio após o último salto, com a calculadora na mão, secando as adversárias. O desequilíbrio na balança chama-se Rebeca Andrade. A nota 15.100 no solo, a maior da noite, fez a diferença para o país deixar a Bercy Arena feliz da vida.

“As pessoas tiveram a oportunidade de ver duas horas de Brasil competindo. Sabemos que isso foi trabalhado em mais de 40 anos. Fomos conquistando passo a passo para ter esse resultado por equipe. Vale muito para a gente, pois o país não era nada nesse esporte. Começamos com alguns talentos individuais. Hoje, somos uma potência. Podemos dizer que temos uma escola brasileira”, orgulhou-se Jade.

Um dos novos sonhos de Jade é que essa conquista mantenha ativa a engrenagem da ginástica artística brasileira. “Queremos voltar aos ginásios e vê-los cheios de crianças. No Flamengo, depois das medalhas de Tóquio, ficou lotado. É o que a gente sempre quis: tornar nosso esporte popular. Tornar o impossível possível.”

Jade nos próximos Jogos Olímpicos daqui a quatro anos? Talvez não como atleta. “Eu não sei sobre Los Angeles. Eu não sabia sobre Paris. Não sabia sobre Tóquio. A gente não sabe o dia de amanhã. Dei tudo o que tinha para dar, não somente hoje. Estou muito realizada no esporte. Amanhã, a Jade vai estar no ginásio de novo. O quanto elas precisarem. Daqui a quatro anos, eu vou estar aqui. O que precisarem da Jade, a Jade vai fazer. Mas me dá um tempinho para respirar e definir isso”, esquivou-se

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postado em 31/07/2024 03:55 / atualizado em 31/07/2024 06:15
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