Hugo Pellicer Parisi se acostumou desde cedo a mergulhar de cabeça em cada desafio. Aos sete anos, aventurou-se nos saltos ornamentais e tomou gostou pela adrenalina. Quando completou 18, tornou-se vice-campeão mundial juvenil e entendeu não somente ser possível viver da modalidade, como passou a enxergar que algo especial estava reservado para ele. Para quem se habituou a calcular os movimentos, a análise foi precisa. Hoje, quase quarentão, orgulha-se de ser um dos brasilienses mais presentes em Jogos Olímpicos. Foram quatro como atleta — Atenas-2004, Pequim-2008, Londres-2012 e Rio-2016 — e a quinta participação, em Paris-2024, será em uma função inédita. Personagem do segundo capítulo da Équipe Brasília, série do Correio sobre os personagens locais na terceira versão da Olimpíada na França, o talento de Taguatinga terá o privilégio e a responsabilidade de ser o único árbitro brasileiro dos esportes aquáticos.
Entrar para o quadro de árbitros nunca esteve nos planos de Hugo Parisi. A vocação fora das piscinas sempre foi em prol do desenvolvimento do esporte. Não bastasse a atuação como presidente do Instituto Pro Brasil — entidade sem fins lucrativos focada na inclusão e difusão —, após a aposentadoria, em 2017, comprometeu-se a atuar nos bastidores como coordenador de eventos da Confederação Brasileira de Saltos Ornamentais, a Saltos Brasil, e chefe da Equipe.
"Como atleta, quando você chega, não tem planos de sair. Eu nunca tive planos de entrar na arbitragem. Hoje, é uma coisa que é legal participar, mas não é o que quero para a minha vida. Pelo contrário, acho que hoje todo trabalho realizado aqui não é para eu estar em Jogos Olímpicos e, sim, para atletas e técnicos", comenta.
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"Se eu vou estar ou não, como chefe de equipe ou árbitro, o que quero é deixar o campo preparado para que os atletas brilhem. Essa é a minha visão de trabalho hoje", emenda. Assim como nas demais modalidades de alto rendimento, tornar-se árbitro não é um caminho fácil. É necessário concluir curso internacionais e ser aprovado em um exame para comprovar conhecimento das regras. Embora não tenha planejado sentar na cadeira de juiz dos saltos ornamentais, o brasiliense estava pronto para quando a oportunidade batesse à porta.
"Tem cerca de dois anos que comecei a me envolver com arbitragem. O fato de eu ser um ex-atleta, com quatro participações olímpicas, ajuda muito. Para quem está hoje lá cuidando da arbitragem internacional, é um fator que ajuda, pois possibilita uma análise e crítica técnica diferenciada. Por esse motivo, acabei crescendo bastante na arbitragem internacional e fui convidado para estar nos Jogos Olímpicos. Participei dos dois últimos mundiais, mas as Olimpíadas são as Olimpíadas", ressalta.
A World Aquatics (Federação Internacional de Esportes Aquáticos) adota a política de diversidade. Costuma convocar profissionais da Europa, da Oceania, da África e das Américas. A variedade permite a escolha de árbitros de nacionalidades diferentes dos competidores em decisões.
"Hoje, a regra vigente é que em finais não haja árbitros dos países envolvidos na disputa. Porém, existe uma vontade para se fazer o contrário. Sou a favor disso. Você pega árbitros chineses, americanos, ingleses e ucranianos, que têm os principais atletas e são as potências, provavelmente, existe grande chance de eles serem os grandes árbitros, pois estão acostumados a julgar saltos de qualidade", analisa.
Parisi tem tudo para estar na final, mas pode ter a chance frustrada por um bom motivo. O Brasil tem dois representantes na modalidade: Isaac Souza e Ingrid Oliveira. "Não os vejo fora da final, mas vejo a Ingrid, como chance de estar mais próxima da medalha. A medalha é um detalhe muito pequeno. Do oitavo para o terceiro é um salto que naquele dia encaixou melhor ou besteirinha que você errou. Torço muito para que os dois façam o melhor Jogos Olímpicos da vida deles."
Quando conquistou a vaga para a Olimpíada do Rio-2016, Parisi brincou sobre como a torcida local pode influenciar na opinião dos juízes dos saltos. "Competir em casa é muito legal, principalmente pela pressão na arbitragem. Na dúvida entre um 7 ou 7,5, com o barulho da torcida, ele opta pelo 7,5". Agora, ele comenta isso sobre outra ótica.
"Sentado na cadeira de árbitro, vejo que isso é mais forte ainda. É muita pressão. Muitos árbitros têm rituais de concentrar, porque não querem errar. Eu diria que é praticamente impossível não errarmos. Erraremos, mas pode ter certeza que, ao errar, nunca será proposital, contra algum atleta ou país específico. Quando estão em casa, é outra situação. A torcida gritando no seu ouvido, você se anima também. É uma soma de fatores que ajudam, na dúvida entre um 7,0 e 7,5, vai o 7,5", explica.
Perguntando sobre qual estilo de análise costuma adotar nas competições, o brasiliense não titubeia: "Sou mais rigoroso". "Todo mundo fala que sou um árbitro bem linha dura. Sei muito bem o que está acontecendo em todo momento do salto. Alguns elementos que são muito bem executados, principalmente com relação à técnica, costumo avaliar com o coração aberto. Porém, há alguns que vejo não serem agradáveis. Pelo menos, uma coisa boa de falar é que não é com esse ou aquele atleta, é um padrão que criei naturalmente", justifica.
Embora tenha participado de quatro Olimpíadas como atleta, Parisi garante não ter mais vontade de competir. "Tenho ido a muitas competições internacionais. Normalmente, quando vejo os atletas treinando, o que me dá saudade são os desafios diários, como o medo de realizar um salto, a dificuldade em movimento específico. Dos ganhos pequenos, disso tenho saudade. Sou muito tranquilo com relação ao momento em que parei de saltar, pois muitos atletas têm essa dificuldade de se distanciar ou aposentar", afirma.
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