A globalização cada vez mais evidente da Série A do Campeonato Brasileiro provoca uma quantidade crescente de sotaques nas áreas técnicas. No atual recorte da elite nacional, nove dos 20 treinadores empregados são de fora do país. A situação cria cenários curiosos, como o embate de escolas em clássicos. Hoje, três vivem a situação. Fora da tendência estrangeira, Flamengo e Grêmio jogam no Maracanã, às 20h, sob a orientação tupiniquim de Tite e Renato Gaúcho. No Heriberto Hulse, no mesmo horário, Internacional e São Paulo opõe as ideias argentinas de Eduardo Coudet e Luis Zubeldía. Às 21h30, no Allianz Parque, os portugueses Abel Ferreira e Álvaro Pacheco lideram Palmeiras e Vasco.
Em meio à invasão estrangeira no futebol brasileiro na última década, Tite e Renato Gaúcho carregam o status de técnicos brasileiros com prestígio inabalado. Campeões da Libertadores, os dois não perderam espaço, mesmo com a ampliação da concorrência aos 20 postos de trabalho disponíveis no Brasileirão. O atual treinador do Flamengo passou seis anos na Seleção Brasileira, mas foi unânime quando o rubro-negro voltou o olhar para o mercado nacional. Ídolo no Grêmio, o atual comandante tricolor é um dos grandes responsáveis de o clube gaúcho sequer olhar para fora do país quando precisa repor o cargo: na contramão dos grandes clubes, a equipe não tem um estrangeiro no cargo desde o uruguaio Hugo de León, em 2005.
No cenário, Tite e Renato vão protagonizar um duelo de velhos conhecidos. Nas carreiras, os dois treinadores se enfrentaram em 10 oportunidades com extremo equilíbrio no retrospecto: cada um ganhou quatro vezes, com dois empates no período. No Maracanã, portanto, a dupla de professores nacionais da bola terá um tira-teima. Embora pertençam à escola brasileira de comandantes, os dois usam nuances táticas distintas nos trabalhos à frente de Flamengo e Grêmio. Mesmo assim, as duas equipes devem entrar em campo praticamente com formações espelhadas no 4-2-3-1. As expectativas de desequilíbrio ficam na conta da individualidade das peças disponíveis em campo.
Embora seja inédito em jogos do Brasileirão, o duelo entre Coudet e Zubeldía dará sequência a um enfrentamento de ideias iniciado na Argentina em 2019. Enquanto dirigiam Racing e Lanús, os atuais treinadores de Internacional e São Paulo se enfrentaram uma vez. Na ocasião, o tricolor levou a melhor e venceu por 1 x 0. Os dois treinadores argentinos, inclusive, costumam utilizar até hoje modelos táticos parecidos aos aplicados naquele confronto. A equipe colorada, por exemplo, joga majoritariamente em um 4-1-3-2 sob o comando de Coudet. Os são-paulinos atuam no 4-2-3-1 padrão dos trabalhos recentes liderados por Zubeldía.
O cenário não se repetirá em Palmeiras e Vasco. No Allianz Parque, Abel Ferreira e Álvaro Pacheco vão se enfrentar à beira do gramado pela primeira vez nas carreiras. No entanto, isso não significa desconhecimento do adversário. Os conterrâneos são amigos de longa data, costumam compartilhar ideias e até dividiram as quadras em partidas de padel — um esporte similar ao tênis. O último encontro do tipo foi em dezembro de 2023, após o fim da temporada do Brasileirão, vencido pelo técnico palmeirense. Mesmo desfalcado pela Copa América, o comandante alviverde manterá o 4-3-3 dos últimos jogos, apenas com adaptações de peças. Sem Payet, o treinador vascaíno deve manter o esquema com três zagueiros.
Nas áreas técnicas dos três clássicos nacionais programados para o dia agitado de Brasileirão, não haverá confusão quanto à língua falada, seja ela o espanhol de Inter x São Paulo ou as "versões" nacional e europeia do português de Flamengo x Grêmio e Palmeiras x Vasco. E nem em relação ao objetivo principal de todos os treinadores e clubes envolvidos no compromisso: a conquista dos três pontos. Para flamenguistas, colorados, são paulinos e palmeirenses, o triunfo é essencial na luta por topo da classificação. Gremistas e vascaínos sonham com os pontos, primeiramente, para se afastarem da zona inferior da classificação.
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