Final do século 19, mais precisamente, 1891. Em Massachusetts, nos Estados Unidos, o professor canadense James Naismith, na intenção de entreter os alunos do colégio onde trabalhava, criava o basquete e dali nascia uma febre no país. Mais de um século depois, o esporte já não é mais xodó exclusivo da terra do Tio Sam e se tornou um fenômeno global. As finais da NBA deste ano são prova disso. De um lado, Jayson Tatum e o Boston Celtics defendendo a tradição estadunidense. Do outro, o esloveno Luka Doncic e o Dallas Mavericks para mostrar a fórmula europeia de criar talentos. A decisão do melhor começa hoje, às 21h30, com transmissão da Band, ESPN e Star+.
Nascido em St. Louis, no Missouri, Tatum seguiu o caminho comum de outros craques da bola laranja. Destacou-se enquanto estava no colégio e partiu para representar a gigante Duke no basquete universitário. Bastou uma temporada por lá para se tornar um dos principais prospectos da NBA e foi selecionado pelo Celtics com a terceira escolha geral do draft de 2017.
Enquanto isso, Doncic trilhava passos semelhantes ao de outros destaques, mas da bola de futebol. Nascido em Liubliana, capital da Eslovênia, os primeiros arremessos foram pelo Olimpija, time local, mas depois foi recrutado para integrar a categoria de base do Real Madrid aos 12 anos. Pelo gigante dos gramados, que também brilha no basquete europeu, o armador disputou um amistoso contra o próprio Celtics e se tornou o jogador mais jovem a enfrentar uma equipe da NBA, aos 16. Depois de três títulos nacionais, uma Euroliga e um prêmio de MVP na Espanha, ele foi selecionado com a terceira escolha geral do draft de 2018 pelo Atlanta Hawks, mas em seguida trocado para os Mavericks.
As diferenças entre os dois continuaram no que cada um encontrou quando chegou na liga. Tatum reforçou um Celtics que havia terminado a temporada regular com a melhor campanha do leste e com nomes como Kyrie Irving, Gordon Hayward e Marcus Smart. Doncic desembarcou em um Mavs de terceiro pior recorde no Oeste e comandado por um veterano Dirk Nowitzki, já na casa dos 40 anos. Ainda assim, bastou pouco tempo para ambos virarem donos dos respectivos times.
O produto de Duke herdou o posto de referência em Boston e chegou nas finais em 2022, mas perdeu para o Golden State Warriors. Nesta temporada são 30.1 pontos de média e figura sempre lembrada na conversa para MVP. Na franquia do Texas, o europeu se tornou uma das peças ofensivas mais perigosas da NBA. São mais de 21 pontos por jogo desde a primeira temporada nos EUA, com direito a médias de 32.4 e 33.9 nas duas edições mais recentes, cestinha de 2023/24. O prêmio de melhor jogador não veio por pouco, mas em seis anos foram cinco eleições ao time ideal da competição, calouro do ano e cinco All Stars.
Em comum também está a importância dentro de quadra. Os dois são líderes de cada equipe nos playoffs em todas as principais estatísticas do basquete. O estadunidense anotou médias de 26 pontos, 10.4 rebotes e 5.9 assistências em 14 compromissos antes de chegar à final. O esloveno fez 28.8 pontos, 9.6 rebotes e 8.8 assistências em 17 partidas na trajetória pelo título.
Agora, Tatum e Doncic medem forças para saber quem vai ganhar um anel primeiro. Além da glória pessoal e das próprias equipes, o campeão ainda ajuda no confronto entre tradição e nova era. Nos 63 primeiros anos da NBA, apenas em duas ocasiões, o MVP não era da América do Norte: o nigeriano Hakeem Olajuwon (1993/94), e o alemão Dirk Nowitzki (2006/07), ex-parceiro de Luka. No entanto, desde a edição de 2018/19 o prêmio vai para um estrangeiro. O sérvio Nikola Jokic ganhou três vezes, o grego Giannis Antetokounmpo duas e o camaronês recém-naturalizado americano Joel Embiid, uma.
Dos últimos três campeões da liga, dois foram liderados pelos europeus Jokic e Giannis. E se for para ficar de olho no futuro, o número 1 do último draft veio da França e a expectativa é que este ano o escolhido também fale francês. Ou seja, Tatum joga por ele, pelo Celtics por Duke e pelos Estados Unidos. Luka representa todo o caminho europeu, os Galáticos do Real Madrid e o Mavs.
Tricampeão do Novo Basquete Brasil (NBB) e da Liga Sul-Americana de Basquete pelo UniCeub/BRB, o ex-jogador e comentarista do Grupo Disney Guilherme Giovannoni está nos EUA pela ESPN Brasil na final e vê a balança favorável ao lado do eslovêno. “O Tatum por mais que tenha passado em Duke, que é de fato uma universidade super tradicional que forma grandes jogadores, estava jogando com caras da mesma idade. O caso do Doncic é diferente, ele jogava no Real Madrid e se destacou enfrentando jogadores experientes, inclusive, com passagens pela NBA. Isso fez com que ele chegasse um pouco mais pronto para encarar a competição na NBA”, complementa em entrevista ao Correio.
No que se trata do favoritismo, no entanto, o ídolo do Brasília aposta no Celtics antes de a bola subir. “Não é algo esmagador, mas eles têm um quinteto titular mais forte, com jogadores mais experientes, como Jrue Holiday, Derrick White e Al Horford complementando as duas estrelas Jayson Tatum e Jaylen Brown. Além disso, quase todos os jogadores já disputaram uma final da NBA e essa experiência pode pesar. Mas Dallas está em um grande momento com a dupla Doncic e Kyrie (Irving) performando bem, isso pode ajudar o time na final”, opina.
Parceiros de guerra
Doncic e Tatum concentram os holofotes da final, mas não são os únicos a brilharem no confronto. Do lado de Dallas, o craque esloveno tem o apoio de Kyrie Irving, antigo companheiro de LeBron James no Cleveland Cavaliers no título histórico de 2016. Em Boston, o cria de Duke joga ao lado de Jaylen Brown, eleito melhor jogador das finais de conferência do Leste, além do esquadrão composto por Jrue Holiday, Kristaps Porzingis e Derrick White.
De estrela a jogador problema, Irving está perto de completar o arco de redenção. Primeira escolha do draft de 2011 pelo Cavs, o armador não demorou a virar uma das maiores estrelas na NBA. Um ano após ser campeão, o desejo por um protagonismo maior o fez trocar Cleveland por Boston e deu início à uma era de vilania para o craque. Os insucessos da equipe nos playoffs e as falas públicas de que iria renovar com a franquia, seguido por uma mudança desavisada para o Brooklyn Nets, o fez cair no desgosto do torcedor.
O clima de inimizade se tornou mútuo, com direito a Irving mostrar o dedo do meio para as arquibancadas no reencontro com o Celtics e pisar no escudo da equipe. Despachado para Dallas, o talento, que sempre esteve presente, voltou a aflorar: média de 22.8 pontos por jogo nos playoffs e seis partidas acima da casa dos 30. Agora, o foco é no segundo anel da carreira.
Fiel escudeiro de Tatum, Jaylen Brown também foi a terceira escolha do draft, mas um ano antes do companheiro, em 2016. Crescendo de papel e performance a cada ano, o ala soma três nomeações ao Jogo das Estrelas e uma para o segundo time ideal da NBA, em 2023. O ápice da glória para o jogador de 27 anos é recente, quando teve média de 29,8 pontos por jogo e foi eleito MVP da final de conferência do Leste.
A decisão é disputada em uma série melhor de sete jogos, ou seja, o primeiro a vencer quatro é sagrado como campeão. Todas as partidas terão transmissão da Band, ESPN e Star+, alternando entre duas em Boston, duas em Dallas e depois uma em cada cidade, se preciso. O último jogo, caso necessário, será em 23 de junho.
*Estagiário sob a supervisão de Marcos Paulo Lima