O futebol está longe de ser uma ciência exata. Os diferentes torneios do calendário doméstico e internacional reforçam a tese. Nem sempre os melhores times na prancheta se sobressaem. Muitas são as causas, mas uma das justificativas pode estar na mudança pelas quais os clubes são submetidos nos inícios de temporadas, com o entra e sai de jogadores antes e durante os campeonatos estaduais. Alguns encaixam como luvas, enquanto outros combinam os esforços nas quatro linhas com preces ao senhor do tempo para se adaptarem às novas casas.
Nicolás De la Cruz é um dos badalados reforços que vivem essa situação. O meio-campista uruguaio de 36 anos completou um mês de Ninho do Urubu na quarta-feira e, nesse período, fez pré-temporada nos Estados Unidos e disputou quatro partidas pelo Campeonato Carioca. Foi peça importante em três sistemas táticos diferentes do técnico Tite, predominantemente pelo lado direito do campo. Na vitória por 2 x 0 sobre o Sampaio Corrêa, formou uma trinca com o compatriota Arrascaeta e Bruno Henrique. No primeiro clássico, contra o Vasco, atuou no 4-1-4-1. Contra Botafogo e Volta Redonda, foi testado ao lado de Gabigol em um 4-4-2. Embora não tenha balançado as redes ou servido companheiros, Tite pede paciência.
De la Cruz é uma espécie de meia "coringa", capaz de alternar entre as faixas para desafogar a saída de jogo flamenguista. Ou seja, nem sempre será o responsável por dar o último passe ou empurrar para a meta adversária. O entendimento disso parte do comprometimento. O uruguaio é um dos primeiros a chegar aos treinos e costuma fazer "horas extras" com treinamentos de cobranças de faltas.
"Precisa de tempo para coordenar com o flutuador, com o articulador. Ou vocês acham que em outras equipes em que eu tinha articulador do lado direito, fiz assim (estalo de dedos) e começou a jogar na hora? Vocês acham que fiz com o Jadson (no Corinthians) assim (estalo) para que fosse o melhor jogador do campeonato de 2015? Precisa de tempo", ressaltou na coletiva após a vitória sobre o Volta Redonda.
Botafogo e Fluminense também lidam com peça em processo de maturação do entendimento dos novos estilos. O processo é severo com Luiz Henrique. Cria de Xerém, o atacante de 23 anos estava há uma temporada e meia no Real Betis, da Espanha, e adaptado à voltagem do futebol europeu, quando virou alvo de uma disputa de mercado entre a dupla Fla-Flu e Corinthians. Diferentemente do Fla de Tite, o Botafogo abre o ano com um trabalho do zero com Tiago Nunes. O clube passou por reformulação quase geral após perder o título do Brasileirão em 2023.
Luiz é a cara da mudança. Homem de velocidade, estreou no clássico contra o Flamengo, criou raízes na direita, mas não brilhou. Esbarrou na ajustada marcação rubro-negra e falta de entrosamento. Como se não bastasse a falta de intimidade com os companheiros, o talismã precisa se acostumar com os gramados ruins do país. No segundo jogo com a camisa botafoguense, entrou no segundo tempo e saiu antes do fim da partida após se lesionar. O alerta está ligado. Dos oito reforços para 2024, quatro estão no departamento médico do Botafogo.
Renato Augusto demonstra dificuldades para assimilar, de fato, o "Dinizismo". Apesar dos 207 minutos em campo, o camisa 20 foi titular somente no duelo contra o Vasco e opção no banco nos confrontos diante Nova Iguaçu, Bangu e Sampaio Corrêa. Mesmo que ainda não esteja totalmente à vontade, o meia tem alguns facilitadores para a adaptação. Flutua entre os setores, mas costuma explorar o centro e, dependendo da situação, faz o papel de um falso nove. As primeiras movimentações indicam um Renato Augusto sem compromisso de recomposição.
O artilheiro da lista de reforços em processo de adaptação é um volante. Luiz Gustavo tem dois gols em cinco jogos pelo São Paulo. Porém, não é o dono da posição. A escolha do técnico Tiago Carpini não é pessoal. As variações do 4-2-3-1 e 4-3-1-2 premiam os meias com saída mais rápida e fôlego para ser elemento surpresa no ataque. O veterano sabe fazer o papel, mas o dono da prancheta indica ter outros planos, como utilizá-lo na função de zagueiro.
Primeira contratação do Palmeiras para 2024, Aníbal Moreno era um desejo antigo do clube para compensar a perda de Danilo, no início de 2023. O volante argentino desembarcou com as credenciais de qualidade nos passes e lançamentos. No entanto, até o momento, não empolgou. Chances não faltaram. Acumula 323 minutos em sete partidas pelo Palestra. Foi titular em três duelos e alternativa em quatro, incluindo a Supercopa do Brasil, contra o São Paulo.
Fora do eixo
Craque do Brasileirão de 2022, Gustavo Scarpa retornou ao Brasil após frustrações no Nottingham Forest, da Inglaterra, e no Olympiacos, da Grécia. A expectativa é que ele contribua com passes para gol, algo que ainda não aconteceu. A justificativa pode ser uma função diferente daquela que lhe rendeu o prêmio individual. Com Abel Ferreira, alternava entre meia direito e central em um esquema 4-2-3-1. Sob a batuta do mentor do penta do Seleção, ele assume responsabilidade pelo lado oposto. Embora seja canhoto, prefere atuar pelo corredor contrário, facilitando as investidas por dentro.
Dessa turma, o argentino Lucas Alario é o que mais recebeu oportunidade. Recém-chegado ao Internacional, o centroavante tem 327 minutos acumulados com a camisa colorada. São sete partidas e um gol. A rede foi balançada na quarta-feira, na vitória por 3 x 1 sobre o Brasil de Pelotas, pelo Gauchão. Foi derrubado um jejum de 487 dias. O último marcado havia sido em 15 de outubro de 2022, pelo Eintracht Frankfurt, na goleada por 5 x 1 sobre o Bayer Leverkusen.
Aos 31 anos, Alario chegou para dar profundidade, exercer o papel de pivô e definir. Porém, a falta de confiança era o entrave. Agora, com a pressão pessoal diminuída, tem a chance de cair na graça do compatriota e técnico Eduardo Coudet e largar na frente do colombiano Rafael Borré pela titularidade ao lado de Enner Valencia.
Valores das operações
Luiz Henrique: R$ 106,6 milhões
De La Cruz: R$ 79 milhões
Aníbal Moreno: R$ 34,4 milhões
Gustavo Scarpa: R$ 26,8 milhões
Lucas Alario: R$ 2,6 milhões
Luiz Gustavo: Custo zero
Renato Augusto: Custo zero