Futebol

Universitários apontam erros na manipulação do VAR no Brasileirão

Entenda por que a operação do VAR arrisca virar protagonista da última rodada do Brasileirão. Consultados pelo Correio, acadêmicos apontam falhas no sistema e despreparo em biomecânica

Do início ao fim do Brasileirão: operação das linhas do VAR continua com problemas graves -  (crédito: kleber sales)
Do início ao fim do Brasileirão: operação das linhas do VAR continua com problemas graves - (crédito: kleber sales)
postado em 05/12/2023 00:01 / atualizado em 06/12/2023 08:43

A última rodada do Campeonato Brasileiro, hoje, com nove dos 10 jogos às 21h30, tem um protagonista cada vez mais influente fora das quatros linhas. As últimas mudanças no Video Assistant Referee (VAR na sigla em inglês) pretendiam reduzir as dúvidas, por exemplo, nas revisões por impedimento. No início da Série A deste ano, foram adotadas linhas mais grossas nas projeções do atacante e do defensor. Ocorrendo sobreposição, os lances passaram a ser validados. Na prática, as polêmicas continuam. Casos questionáveis e que demandam bastante tempo da arbitragem de vídeo seguem comuns nas partidas. O Correio foi a campo ouvir universitários. O problema pode estar no sistema e até mesmo no desconhecimento da biomecânica.

Professor do Departamento de Ciências do Esporte e coordenador do Laboratório de Biomecânica Aplicada da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Felipe Arruda Moura explica que o programa atual pode apresentar erros. Caso os "bugs" não sejam interpretadas corretamente, podem provocar injustiças.

Uma das inconsistências, segundo ele, está na definição dos pontos anatômicos que mais se aproximam da linha de fundo, que são utilizados como referências na marcação das linhas de impedimento. Para o especialista, é sempre muito difícil fazer essa definição a partir de uma única imagem pela existência do efeito chamado paralaxe, ou seja, quando há um deslocamento aparente do objeto devido a alteração do ponto de vista do observador.

O processo pode ser ainda mais duvidoso no atual modelo. O sistema faz estimativa bidimensional de uma situação em três dimensões, que é o movimento do jogador. Isso pode gerar erros de visualização, levando a uma consequente imprecisão na demarcação. As linhas mais grossas funcionam como margens de erro nesse sentido. A nova medida de sobreposição é, na teoria, solução para os casos muito ajustados, quando não há certeza se houve alguma irregularidade.

"O problema é que, para cada posicionamento de câmera, para cada estádio e, muitas vezes, dependendo até de onde esses atletas se encontram em relação ao plano da imagem, a espessura dessas linhas deveria variar, o que raramente acontece. Isso implica em dizer que, para alguns jogos, eu poderia ter uma aceitação de maiores margens de erro, enquanto em outros jogos, teria aceitação de menores margens de erro", evidencia Moura.

Conflitos

O docente da Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto da USP e doutor em Ciências da Motricidade na área de Biomecânica, Paulo Santiago ressalta que o atual sistema 2D pode gerar erro na medição de 20 a 50 cm. Em contrapartida, no 3D, modelo utilizado na Copa do Mundo e não implementado no Brasil, essa margem cai para cerca de 15 cm. Segundo o especialista, a FIFA e os fornecedores da ferramenta não confirmam qual é esse erro de medida, principalmente por questões de concorrência.

"É como se você tivesse um radar na pista para medir velocidade e não tivesse aquela tolerância de 5% ou 10%, porque eles não te informam. A forma mais justa seria falar qual é o erro, dizer que há um erro de 5cm, por exemplo, e que qualquer coisa que fique dentro dessa margem é adotado como impedimento ou não, como no tênis", compara Santiago.

Computação

Vinculado ao Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o professor Mario Fernando Montenegro Campos defende que o atual sistema representa um grande avanço na avaliação mais precisa dos lances. Por conta das câmeras localizados em um plano elevado, e pelo fato de o vídeo possuir mais de 30 quadros por segundo, há mais precisão e alguns problemas são mitigados em grande parte, como a obstrução da visualização de elementos.

Mesmo assim, o especialista explica: como qualquer sistema, o VAR pode apresentar erros de medição sistemáticos ou aleatórios. Desse modo, as medidas devem considerar um intervalo de confiança, que é determinado por meio de técnicas de validação e aferição. Previamente a um jogo, a ferramenta precisa ser cuidadosamente calibrada para as condições locais. "A tecnologia atual de câmeras e processadores e, principalmente, das técnicas de visão computacional (IA) são muito avançadas e possibilitam que essas imprecisões sejam cada vez menores", complementa.

Para Campos, a margem de erro do sistema deve ser claramente definida e validada. "Ainda que atualmente as imagens adquiridas por essas câmeras sejam muito altas, os contornos dos objetos podem ser difusos. Portanto, é importante definir os critérios de marcação de contornos na imagem, e isso também vale para a própria linha de marcação na imagem — que tem alguns pixels de largura —, de forma que sejam compatíveis com a margem de erro."

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