Elis Regina cantava em Como nossos pais que o novo sempre vem. A música lançada em 1976 pode ser a trilha sonora do Botafogo no segundo semestre. Tem torcedor alvinegro, claro, que ama o passado. Mas isso não significa que é preciso ter medo do futuro, pois os ventos de mudanças podem trazer desfechos positivos. Bruno Lage que o diga. Há quem palpite sobre como o sucessor de Luís Castro deve trabalhar, seja mantendo o padrão de jogo seja dando um upgrade à versão avassaladora do líder. Mas calma, torcedor, o novo português da turma é especialista nessas situações.
Aos 47 anos, Bruno Lage tem apenas 127 partidas como treinador efetivo. Se fizermos uma análise quantitativa, ele largaria atrás de outros nomes disponíveis no mercado. Porém, a habilidade de pegar o bonde andando o colocou como "plano A" da equipe a ser batida no Brasil. Os bons desempenhos nas categorias de base do Benfica o lançaram para o time principal. Quando foi exigido como "gente grande", correspondeu.
Na temporada 2018/19, ele herdou a prancheta de Rui Vitória. O Benfica vinha em crise no campeonato nacional. A solução caseira da diretoria foi um divisor de águas. A desvantagem em relação ao líder e rival Porto era de sete pontos quando Lage assumiu. Fez o feijão com arroz, ou melhor, simples bacalhau e organizou a casa com 18 vitórias em 19 jogos. Resultado: a reação com o 40º caneco nacional dos Encarnados, com 87 pontos — dois a mais que os Dragões. De quebra, Lage lapidou talentos como João Felix e Rúben Dias e deixou a orquestra afinadíssima para marcar 103 gols e igualar o recorde do clube no campeonato: 103, mesma marca de 1963/64.
Teoricamente, Lage terá menos trabalho no Botafogo. Afinal, a missão dele não é "salvar" a temporada e, sim, sustentar a maiúscula vantagem de 10 pontos para Flamengo e Grêmio. Pode-se afirmar que Luís Castro deixou um legado para o compatriota. Havia um temor que o time poderia cair de rendimento após a saída do mentor para o Al-Nassr, mas nada disso. A tendência é que o Glorioso passe por uma atualização para o segundo turno.
Dois jogadores serão fundamentais para a adaptação do português no Rio de Janeiro. O meia Gabriel Pires trabalhou com Bruno Lage no Benfica entre 2018 e 2020, enquanto o lateral-esquerdo Marçal esteve à disposição do professor no Wolverhampton, da Premier League, na temporada 2020/21. Antes da vitória expressiva contra o Grêmio no domingo, Marçal deu um pitaco sobre o treinador. "Ele vai chegar para continuar o que vem sendo feito. Acredito que ele tenha conversado com o Castro também. Pode pegar boas indicações. Ele é um excelente treinador, pude trabalhar com ele por um ano na Inglaterra. É um treinador que não muda muito o que a gente pratica aqui", aliviou o defensor.
Diretor-executivo do Botafogo, André Mazzuco analisa a contratação de Bruno Lage sob outra ótica. Para ele, o "sim" do português indica o resgaste do prestígio botafoguense no mercado da bola. Antes assinar com o time de General Severiano, Luís Castro tinha proposta de Corinthians. O sucessor dele analisava bem o negócio devido a questões familiares.
"O Botafogo resgatou muito crédito, mostrando uma profissionalização em todos os setores. Nós mantivemos o comando técnico mesmo com um uma sequência de resultados ruins e as pessoas começam a entender que a gente tem uma maneira de trabalhar, que dá uma segurança", avaliou ao programa De Primeira, do UOL.
É bom ter cuidado
O sangue botafoguense ferve pelo título. No entanto, é preciso ter cautela. O Brasileirão prega peças em alguns favoritos. Nem sempre os líderes com vantagens significativas levantaram o troféu após a 38ª rodada. Reações surpreendentes fazem parte da história. Flamengo e São Paulo reverteram o prejuízo de 10 pontos, como o sustentado pelo Bota hoje (veja abaixo).
2008
Após 20 rodadas, o Grêmio sustentava vantagem de 11 pontos em relação ao São Paulo. Tricolor reagiu e assumiu a ponta na 33ª jornada e foi campeão com 75 pontos, três a mais que os gaúchos.
2009
A campanha do hexacampeonato do Flamengo foi fruto de uma reação. Petkovic, Adriano e companhia estiveram 10 pontos atrás do Palmeiras. Assumiram a ponta na penúltima rodada e levantaram o caneco com 67.
2017
Vantagem do Corinthians para o Palmeiras chegou a ser 16 pontos após a 13ª rodada. Na 31ª, porém, o Alviverde teve a chance de encurtar para dois e colocar fogo na disputa. Perdeu e viu as chances de título diminuírem.
2018
O São Paulo puxou a fila e colocou oito à frente do Palmeiras. Porém, a queda de desempenho no returno contribuiu para a reação do Palestra de Felipão com o 10º troféu do Campeonato Brasileiro.