O silêncio dos jogadores brasileiros nos primeiros instantes das partidas nas últimas semanas valeu por muito. Eles disseram tudo sem falar nada ao colocarem as mãos na boca e pedirem o veto do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a dois parágrafos da Lei Geral do Esporte, referente à cláusula compensatória após o rompimento de contratos com os clubes. O pedido mudo surtiu efeito na última quarta-feira (14/6), quando o chefe do Executivo sancionou a nova legislação com a rejeição aos trechos do dispositivo.
A Lei Geral do Esporte tramitou seis anos até receber a assinatura do presidente Lula. Agradou alguns e criou desconforto para outros. Os boleiros estavam insatisfeitos com a possibilidade de terem o contrato rescindido e não receberem indenização em caso de vínculo firmado com outra instituição, desde que o valor fosse igual ou superior ao previsto no acordo anterior. O que aconteceu nas últimas semanas do futebol brasileiro surgiu entre junho e julho do ano passado.
A reivindicação e o gesto eram os mesmos. Além da bronca que feria a segurança trabalhista, os jogadores alegaram a falta de comunicação e de articulação nos artigos. Segundo eles, apenas os clubes foram ouvidos na Câmara dos Deputados. Em nota divulgada pela União dos Atletas de Futebol 'Séries' ABCD, os protagonistas da bola consideraram o texto um retrocesso ao que havia sido firmado em relação aos direitos deles. Segundo a aliança, a aprovação poderia trazer instabilidade diante da possibilidade de demissões sem os pagamentos integrais das cláusulas compensatórias.
Para o advogado e presidente da Comissão Disciplinar Nacional do Superior Tribunal de Justiça Desportiva Universitária (STJDU), Bruno Henrique de Moura, o veto precisa ser analisado com cautela. "As pessoas sempre pensam no atleta que ganha R$ 1 milhão por mês e que sai de um clube para assinar com o outro. Baseado nesse cenário que o Congresso criou essa regra. Nesses casos específicos, a lei é mais que válida. Mas existe uma série de jogadores de divisão inferiores que são dispensados e não recebem valores de rescisão e ficam desassistidos", pondera. "Talvez o grande problema seja a não criação de uma 'linha de corte'. Acredito que o veto é benéfico para a massa de atletas. Agora, beneficiará uma minoria que recebe muito", frisa.
Especialista em direito esportivo, Mauricio Corrêa da Veiga faz uma ponderação à postura dos atletas. "Havia, no texto original, a possibilidade de parcelamento e cessação do pagamento. Os protestos poderiam ter sido feito antes, durante a elaboração da lei, que contou com a participação de todos os atores do movimento", analisa o advogado.
Veiga também interpreta de forma negativa a lentidão até a legislação entrar em vigor. "Se a demora foi a tentativa de 'acerto', pode se dizer que foi um gol contra, pois a lei estava madura desde 2016. Infelizmente, teremos que conviver com mais uma colcha de retalhos que permitirá múltiplas interpretações", comenta. "O governo tinha uma grande chance de marcar um 'gol de placa'. Tal fato não surpreende, pois como me disse um querido amigo ao lembrar Millôr Fernandes: 'O Brasil não perde a oportunidade de perder uma oportunidade'", emenda.
Bruno Henrique de Moura defende outra linha. "Demorar seis anos é ruim em termos, mas pelo menos houve aprofundamento do debate. Fazer política é compor interesses distintos. Não teria como o projeto sair somente com a visão das entidades gestoras ou apenas na visão dos atletas. É natural que essas coisas ocorram. A demora não é normal, mas faz parte do jogo democrático", salienta.
Dos 218 artigos do novo marco regulatório do esporte nacional, 134 foram vetados. Entre eles, o 212, que derruba o acesso de profissionais credenciados pelas associações de cronistas esportivos a pelo menos 80% dos espaços reservados à imprensa em praças esportivas. Para Bruno Henrique de Moura, essa é uma péssima decisão. "A motivação do veto é ilógica, pois ele desprotege a imprensa esportiva do arbítrio dos dirigentes de imprensa a partir da premissa de que o problema são as entidades de classe. Os 20% dos não associados são exatamente para não obrigar a pessoa a se filiar", avalia.
Além da questão trabalhista, tópicos relacionados à isenção de impostos, à criação de secretaria para combate à violência e à discriminação e à revogação da Lei Pelé. Os pontos derrubados pelo presidente Lula passarão, ainda, por análise do Congresso. Senadores e deputados terão até 30 dias para manter ou rechaçar os artigos, em sessão conjunta. Para a rejeição, é necessária maioria absoluta dos votos dos deputados (257) e dos senadores (41).
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