Entrevista com Rebeca Andrade

Ginasta brasileira campeã mundial, Rebeca Andrade fala sobre o futuro

Após encantar o mundo ao som de Baile de Favela, a ginasta procura um hit inédito rumo a Paris-2024. Ao Correio, ela fala sobre ser espelho para jovens e conta como trabalha a mente em meio às pressões

Victor Parrini
postado em 20/02/2023 06:00
 (crédito: Divulgação/CBG)
(crédito: Divulgação/CBG)

Uma pequena grande mulher vem se arriscando a tomar o espaço de gigantes nos lugares mais altos de um dos esportes mais encantadores do mundo. Embora o 1,51m de altura pareça pouco, Rebeca Andrade prova que vir ou estar por baixo nem sempre é ruim. Ela saiu da periferia de Guarulhos e cruzou o oceano para fascinar e o colocar o planeta para dançar com o Baile de Favela, que garantiu a prata nos Jogos Olímpicos Tóquio-2020. Repetiu a dose no ano passado, ao brindar o Brasil com inédito ouro no individual no Mundial, em Liverpool. Feitos que renderam o título de Atleta do Ano, entregue pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB), no início do mês.

Em bate-papo com o Correio e outros jornalistas, promovido pela entidade olímpica, Rebeca fala sobre estar em evidência, ser inspiração para jovens e como mantém a cabeça no lugar. Acompanhamento psicológico e o que o Brasil bailará com ela no ano pré-olímpico também foram outros temas da conversa com a queridinha do esporte brasileiro.

Como se sente em condição de inspiração?

Sou uma pessoa muito tranquila. Mostro isso por meio da minha ginástica. Quando tenho a oportunidade de falar para crianças, com alguma dúvida ou curiosidade sobre mim, acho muito legal poder compartilhar a minha história, mostrar que realmente não foi fácil chegar até aqui, mas que acreditei muito no processo e que conseguiria voltar depois de todas as lesões. É isso que consigo passar, esse amor que tenho pela ginástica e essa vontade de vencer e acreditar. Se você tem um objetivo, precisa fazer acontecer. É necessário abrir mão de várias outras coisas, mas, no final, vai valer a pena. Não me arrependo de nada da minha história. Se tivesse que repetir e passar por tudo de novo, passaria um milhão de vezes, pois foi isso que me trouxe para o lugar onde estou e queria estar, de poder ser inspiração, espelho, ter minhas medalhas, minha família mais unida do que nunca. Me orgulho demais.

Como projeta a jornada rumo a Paris?

O resultado é consequência do trabalho. Temos que pensar sempre em um dia de cada vez. Temos muitas competições neste ano e tenho que pensar na primeira e me preparar para ela, para depois pensar nas próximas. Estar feliz e saudável é importante. Se eu não estiver feliz, não vou conseguir fazer o meu melhor trabalho. Se não tivermos a vaga, não vamos para Paris, então, um dos focos é conseguir uma das vagas como equipe. Quando estivermos lá, seja o que Deus quiser. Daremos 110% para todas as competições.

Competir tendo sido campeã faz diferença?

Não sei se mudou muito na minha cabeça, mas a forma como as pessoas me enxergam é diferente. Antes, me enxergavam só como a Rebeca com potencial e hoje como Rebeca medalhista olímpica e campeã mundial. Isso é muito bom, pois é o reconhecimento de um trabalho. Mas, pelo nosso planejamento e na minha cabeça, sou a mesma pessoa que era antes da medalha. O trabalho e o foco são os mesmos, assim como a confiança que tenho no meu treinador e na minha equipe. Preciso das meninas junto comigo. Então, a vontade de vencer e querer os resultados é a mesma. Sou a mesma atleta, com sangue nos olhos, faca na mão e vamos com tudo. Apesar dos resultados, ainda sou a mesma pessoa.

Como é o trabalho psicológico?

Faço acompanhamento psicológico desde os meus 13 anos. Por muitos anos, me preocupei muito com o que as pessoas achavam e esperavam que eu me tornasse no esporte. A partir do momento que mudei a minha cabeça e decidi que não poderia me importar com as expectativas dos outros (entendi que) a única pessoa que posso controlar, sou eu mesma. Por mais que você queira que eu ganhe, se eu não ganhar, você pode ficar decepcionado comigo, mas isso não pode me afetar a ponto de eu não conseguir ir para o próximo dia de competição. Trabalhei muito isso com a Aline (psicóloga), sobre não dar importância para esse tipo de pensamento. Todo mundo quer ganhar e vocês esperam que ganhemos. Não podemos deixar isso nos afetar. Esse foi o meu diferencial em Tóquio, pois cheguei sem a obrigação de voltar com medalha. A única obrigação era de mostrar o meu trabalho e o meu máximo. Deu tudo certo. É esse pensamento que vou continuar tendo, dentro e fora do esporte. Tenho que fazer o que eu espero que eu faça, dar o meu melhor, por mim e para mim.

O que significa o reconhecimento do Prêmio Brasil Olímpico?

É muito bom. Ano passado não pude estar presente. A primeira vez que fui, nem fui indicada, mas vi como era emocionante e gostoso de estar lá, ver todo mundo com brilho nos olhos, porque vem na lembrança de todo mundo tudo o que fez, então, vai muito além de ser só uma competição ou uma conquista. É um orgulho, me sinto honrada por ter sido indicada e com tanto carinho das pessoas. Isso é muito bom e me incentiva, não apenas pelo prêmio, mas para continuar treinando e trazendo resultados. Me sinto lisonjeada.

É hora de manter ou aumentar o ritmo?

Acredito que sempre podemos melhorar, mas o trabalho que estamos fazendo vem dando certo. Não acredito que tenha muito o que mudar. Precisamos ser inteligentes e perceber qual o melhor momento para fazer escolhas, como competir no solo e outros aparelhos. Esse tipo de pensamento é o que vai definir o meu ano inteiro, como vou chegar nas próximas competições. Acho que é manter e, se precisar mudar, o treinador vai saber responder melhor.

O que o Brasil vai dançar com você?

Até eu estou esperando para descobrir. Por enquanto, não tenho nada. Vamos começar o "camp" e o Rhony (coreógrafo) está chegando e espero que venha com algumas surpresas para mim. Estou muito ansiosa, tanto quanto vocês.

Por que Baile de Favela marcou tanto quanto Brasileirinho?

Acredito que representou demais. Representou o Brasil, a favela e as pessoas pretas. Eu, como pessoa preta, ser a que levou isso para o mundo inteiro, fez toda diferença. E o funk é um ritmo que alegra todo mundo, levantou todos. Parecia que não tinha público lá em Tóquio, mas todas as pessoas, voluntários, arbitragem e as meninas da equipe, ficaram encantadas, pois a batida é muito legal e a música é sensacional. Super combinou comigo e eu fazia com gosto, com sorriso. Quando você se encaixa com a música, tudo fica diferente.

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