Doha — Caminhar pelas ruas do Catar é um constante encontro com gatos. Mansamente, eles se misturam às pessoas em uma proporção de um para um. São quase 3 milhões de habitantes, enquanto a população felina é estimada entre 2 e 3 milhões, de acordo com estudo publicado em 2016 pela Universidade Hamad Bin Khalifa. Os cachorros, por outro lado, são raridade no país da Copa do Mundo. Por quê?
Há algumas explicações, mas as principais delas apontam para a fé e a biologia. No Islamismo, gatos são considerados animais sagrados e admirados pela limpeza. Por outro lado, correntes da religião consideram os cães impuros.
Historicamente, alguns escritos levaram a esse entendimento, como uma passagem do profeta Mohammad, no livro 'Hadith Bukhari', que diz: "Anjos não entram em uma casa que tenha um cachorro ou uma imagem".
Existem movimentos para que a percepção sobre os cães seja reinterpretada. Porém, em 20 dias no Catar, apenas quatro foram vistos nas ruas da capital Doha — dois deles em coleiras, de raça considerada nobre.
Já os gatos estão em toda parte, uns desinteressados, outros à procura de comida ou carinho. A relação religiosa é tão marcante que passagens tradicionais dizem que se pode fazer purificações para uma oração com a mesma água que um felino beber ou comer na mesma tigela em que ele comeu.
Na cultura islâmica, Abu Hurairah, um dos companheiros mais conhecidos do profeta Mohammad, ganhou notoriedade como "Pai dos Gatos", tamanho o amor pelo animal. Outro relato diz que cães denunciaram aos carrascos a casa de Maomé, enquanto os gatos silenciaram.
O 'Souq Waqif', mercado tradicional de Doha, é o lar preferido de muitos gatos, que caminham entre os milhares de turistas diariamente. Vez ou outra, eles aparecem até nos campos de futebol espalhados pelo país.
O elenco da Inglaterra se afeiçoou por dois que vivem no centro de treinamento da seleção no Catar. O lateral Kyle Walker prometeu adotar "Dave", um filhote branco e malhado, caso conquiste o título mundial.
"Se a gente ganhar a Copa, vou adotar o gato, se eu puder levá-lo comigo. Eu e John (Stones) podemos dividir (a responsabilidade)... A gente leva ele para o CT do Manchester City", disse o defensor.
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Invasão na entrevista
Uma cena inusitada arrancou risadas de Vinícius Júnior durante entrevista coletiva, ontem. O atacante falava da responsabilidade da Seleção Brasileira na Copa do Mundo do Catar, quando um gato subiu na mesa. Desconcertado, o jogador caiu na gargalhada.
"Nossa responsabilidade vai aumentar cada vez mais. Ele subiu aqui (risos). Mas o alívio é para ter a tranquilidade para o próximo jogo", disse Vini, entre gargalhadas, no momento em que o gatinho invadiu a coletiva.
A religião não é o único motivo pelo qual há tantos gatos no país. Existe também uma explicação biológica.
Na década de 1960, o Catar sofria com uma população elevada de ratos. Para resolver a questão, introduziram um predador natural nas ruas. Eventualmente, ainda é possível ver gatos com ratazanas na boca caminhando pelo centro da capital.
O problema é que a população felina cresceu descontroladamente e virou um possível vetor de doenças. Segundo o artigo da Universidade Hamad Bin Khalifa, registros de hospitais mostram que 41% dos idosos e 35% das mulheres em idade fértil no Catar têm ou tiveram toxoplasmose, causada por um protozoário que pode estar presente nas fezes de gatos e cachorros.
Recentemente, ONGs protetoras de animais denunciaram que o governo local retirou das ruas milhares de animais como forma de "limpar" a capital Doha para receber os turistas e não especificou o destino dado aos bichos. A estimativa das organizações é que foram pelo menos 5 mil cachorros e muito mais gatos. A administração do país não se pronunciou sobre o caso.
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