Copa do Mundo

Em meio a controvérsias, Catar se prepara para receber torcedores LGBTQIA+

Representantes do país sede da Copa do Mundo afirmam que todos os torcedores serão bem-vindos, mas dúvidas em relação à acolhida do público LGBTQIA persistem

Novembro se inicia com a expectativa para a Copa do Mundo, evento que mobilizará cinco milhões de torcedores ao redor do globo e levará pelo menos um milhão de visitantes do exterior para o Catar, segundo estimativa da FIFA. A Copa de 2022, porém, é uma das mais controversas dos últimos tempos, em especial pela dúvida de como a comunidade LGBTQIA+ será recebida no país.

“A escolha do Catar passa uma mensagem ruim para o mundo. Na minha avaliação, a gente precisa fazer do futebol um esporte que tem uma característica de responsabilidade social”, afirma Onã Rudá Silva Cavalcanti, membro da Coordenação de esportes da Aliança LGBTQIA e Fundador do Coletivo de Torcidas Canarinhos LGBTQIA. “Quando um país que tem tantas restrições e limitações nos direitos dos indivíduos é escolhido para sediar o mundial, no fundo é dada uma oportunidade de o país divulgar essas práticas”, completa.


O Coletivo de Torcidas Canarinhos LGBTQIA inclusive está produzindo um guia com dicas, orientações e informações para os torcedores durante a Copa do Mundo no Catar. O documento tem como base esclarecimentos da FIFA sobre a preparação do país sede para o recebimento dos torcedores LGBTQIA.

Escolha controversa

Em 2010, depois do anúncio de que a Rússia sediaria o maior torneio de futebol do mundo, país onde é proibido manifestações de valores que não sejam a tradicional heteronormatividade, a escolha do Catar, país árabe e conservador, veio acompanhado de preocupações a respeito da segurança dos torcedores LGBTQIA .

Além disso, o Catar, que não é uma potência no futebol, tem uma área de 11,5 mil quilômetros quadrados, quase metade da área do estado do Sergipe, o menor estado brasileiro, com aproximadamente 22 mil Km², tornando-se a menor nação a receber a Copa do Mundo. O país também possui um clima extremamente quente, o que forçou a competição a acontecer, pela primeira vez na história, em novembro, quando o clima é mais ameno.

Leis anti-LGBT

O sistema jurídico no Catar é baseado na Sharia, conjunto de leis islâmicas que tem como base o Alcorão. Com isso, ser homossexual no país é considerado um crime, punível com até três anos de prisão e possibilidade de pena de morte, apesar de não haver registro de que a pena máxima foi colocada em prática.

Apesar disso, ao se tornar sede da Copa do Mundo, a organização do evento garantiu que todos os torcedores serão bem-vindos, desde que não haja manifestações públicas de afeto.

“Ouça, demonstrações públicas de afeta são desaprovadas e isso é generalizado. O Catar é um país modesto. Isso é tudo que precisa ser respeitado. Fora isso, todos são livres para viver suas vidas”, disse Nasser Al Khater, organizador do torneio.

“Eles (os homossexuais) virão ao Catar como torcedores de um torneio de futebol. Eles podem fazer o que qualquer outro ser humano faria. O que estou dizendo é que o Catar, do ponto de vista de demonstração pública de afeto, é conservador”, completa.

Segurança de LGBTs será garantida?

Mesmo com as garantias dos organizadores da competição de que a segurança de todos será garantida, a comunidade LGBT ainda se coloca na defensiva.

Um exemplo é o jogador Joshua Cavallo, único atleta assumidamente gay a ir par a Copa do Mundo de 2022: “Me entristece ver isso. Eu li algo sobre pena de morte para gays no Catar. É algo de que tenho muito medo e não gostaria de ir ao país por causa disso”, declarou ao The Guardian em novembro de 2021.

Além disso, há discrepância nas informações da Fifa e dos organizadores da competição que chegam para os torcedores. Em abril deste ano, o major-general Abdulaziz Abdullah Al Ansari, presidente do Comitê Nacional de Contraterrorismo do Catar, declarou, em entrevista à The Associated Press, que bandeiras LGBTQ não serão permitidas dentro dos estádios onde ocorrerão os jogos da Copa do Mundo de 2022.

"Se um torcedor levantar uma bandeira de arco-íris e eu tirá-la de sua mão, não seria porque eu quero ou porque estou insultando-o. Será para protegê-lo", disse Al Ansari. "Porque se eu não fizer isso, alguém poderá atacá-lo. Não posso garantir o bom comportamento de todos. E vou dizer ao torcedor: 'por favor, não é necessário levantar a bandeira neste local'", completou.

Entretanto, a FIFA divulgou, esta semana, que as bandeiras serão liberadas dentro dos estádios e nas festas oficiais, as chamadas “FIFA Fun Fest”.

Outro ponto de interesse dos torcedores é um relatório do Observatório de Direitos Humanos (Human Rights Watch), divulgado no dia 24 de outubro, que revelou que as autoridades do Catar prenderam e maltrataram pessoas LGBT arbitrariamente entre 2019 e 2022, sendo seis casos de espancamentos graves e cinco casos de assédio sexual.

O Observatório afirmou que conversou com quatro mulheres transgênero, uma mulher bissexual e um homem gay, todos mantidos em uma prisão subterrânea em Doha.

“Todos foram detidos sem acusação, em um caso por dois meses em confinamento solitário, sem acesso a um advogado. Nenhum recebeu qualquer registro de ter sido detido. Esses atos podem constituir detenção arbitrária sob a lei internacional de direitos humanos”, afirma o relatório.

Em resposta, um porta-voz do governo do Catar contestou as alegações por meio de uma declaração por e-mail, dizendo que o relatório tinha “informações que são categoricamente e inequivocamente falsas” e que o país “não tolera discriminação contra ninguém”.

Apesar das contradições, Onã acredita que a Copa do Mundo, de forma geral, acontecerá de uma forma tranquila, sem grandes incidentes, uma vez que é do interesse do Catar divulgar uma imagem positiva para o resto do mundo.

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