Até que a crise nos separe

Contratados como estrelas por gigantes paulistas para vestirem a camisa 10, Willian, Ricardo Goulart, Dani Alves e Luiz Adriano tiveram ciclos conturbados. Ontem, meia do Corinthians confirmou saída após um ano sem brilho

O futebol paulista está atravessando uma fase instável com grandes medalhões. Contratado com status de ídolo pelo Corinthians em agosto de 2021, o meia-atacante Willian anunciou, ontem, o fim de um relacionamento conturbado na passagem pelo alvinegro. Sem conseguir corresponder em campo à expectativa gerada pelo histórico vitorioso no futebol, o agora ex-camisa 10 do Timão segue o mesmo enredo do término caótico de outros nomes contratados com pompa, mas que saíram pela porta dos fundos dos outros três grandes clubes de São Paulo.

Ricardo Goulart, no Santos, Daniel Alves, no São Paulo, e Luiz Adriano, no Palmeiras, tiveram um rompimento contratual com semelhanças ao distrato de Willian com o Corinthians. Todos também tinham sobre os ombros o peso da expectativa criada pela torcida. Porém, no gramado, não conseguiram ser a unanimidade esperada. No fim do processo, encerram o ciclo insatisfeitos e com críticas pesadas dos torcedores. Ao contrário do corintiano, saíram atirando de forma veemente contra os ex-clubes.

A possível saída de Willian do Corinthians era ventilada há algumas semanas. O principal motivo da decisão, de acordo com o atleta, foram questões familiares. No ápice da crise atravessada pelo alvinegro na temporada 2022, a torcida ameaçou o jogador e seus familiares pelas redes sociais. Na passagem pelo time paulista, o meia-atacante também sofreu com lesões e não conseguiu ter sequência no time do técnico Vitor Pereira. Em meio a isso, o Fulham, da Inglaterra, surgiu como interessado.

Em entrevista à ESPN, Willian confirmou ter vivido os últimos minutos como atleta do alvinegro na eliminação da Libertadores contra o Flamengo, no Maracanã. "Sei que meu desempenho não foi o que eu esperava, mas nunca fui jogador de fazer 20 ou 30 gols por temporada", afirmou o meia-atacante. Para concretizar a ruptura com o time paulista de forma imediata, o agora ex-camisa 10 renunciou a todos os valores do restante do contrato até 2023 com o alvinegro. "Abro mão de tudo que tenho para receber", garantiu.

O fim da relação de Willian com o Corinthians lembrou o divórcio recente de Ricardo Goulart com o Santos. No caso do atacante com o Peixe, o relacionamento foi ainda mais curto: entre o anúncio da contratação com status de estrela e da saída sem deixar nenhuma saudade na torcida, passaram-se pouco mais de seis meses. Hoje no Bahia, o ex-camisa 10 do alvinegro praiano disse não ter sido respeitado e também fez um mea-culpa em relação ao desempenho ruim na Vila Belmiro.

"Estava disposto a fazer o meu melhor, mas as coisas não saíram como planejei. Não tive a oportunidade que eu almejava ter, e não me senti respeitado pela história que construí com muito trabalho e dedicação até hoje. Meu caráter e profissionalismo vão além do que estimam, e prefiro sair pelas portas da frente e preservar a minha família, que é a minha maior conquista até aqui", escreveu Goulart em uma rede social. Na apresentação no Bahia, o atleta também reclamou do técnico Fábian Bustos. "A questão entre treinador e jogador não fluíram e, por opção minha, decidi deixar de lado", explicou.

Se Goulart "deixou de lado", o atacante Luiz Adriano até hoje não tem uma relação pacífica com a torcida do Palmeiras. Durante os dois anos e meio da passagem pelo alviverde, o jogador brilhou apenas em 2020, quando foi importante na conquista da tríplice coroa (Paulista, Copa do Brasil e Libertadores). Porém, no mesmo período acumulou cenas de desentendimento com os torcedores do próprio clube paulista. Contrastando com a contratação de impacto em 2019, o atleta foi vaiado e hostilizado diversas vezes. Em um dos últimos casos, discutiu com um palmeirense na arquibancada.

A mágoa do ciclo conturbado permanece até hoje. Desde a saída do Palmeiras, Luiz Adriano se desentendeu com torcedores do clube nas redes sociais em duas oportunidades. A última, inclusive, foi na segunda-feira, quando um perfil alviverde publicou um vídeo de um pênalti perdido pelo atacante no Antalyaspor, da Turquia. Nos comentários, o jogador rebateu à provocação sem titubear: "Mundial eu tenho", escreveu em referência ao clube não ter um título do mesmo nível reconhecido pela Fifa. Em seguida, postou uma imagem sorrindo ao lado do troféu conquistado no Internacional, em 2006.

No São Paulo, a saída de Daniel Alves deixou marcas negativas no coração dos torcedores e, principalmente, no bolso do tricolor paulista. Consagrado na Europa, o jogador foi contratado em agosto de 2019 após uma complexa engenharia financeira. Na visão do clube, assumir um salário mensal de R$ 1,5 milhão à espera da ajuda de investidores valeria a pena pela entrega esportiva do experiente lateral. Porém, os parceiros não chegaram, as dívidas foram se acumulando e o desempenho do atleta em campo também ficou muito aquém do esperado.

No processo de saída, no meio de 2021, Dani Alves criticou o clube após conquistar o ouro nos Jogos Olímpicos de Tóquio com a Seleção Brasileira. "O São Paulo falhou muito comigo. Era um momento que eu tinha de escolher pelo clube e por defender o Brasil. Sempre vou representar meu país e, por tabela, representar o time. O São Paulo muitas vezes falhou comigo, e eu não falho eles." O desabafo foi o estopim para a saída. E o tricolor pagará pelo atleta por muito tempo. No acordo, o time se comprometeu a pagar 60 parcelas de R$ 400 mil, totalizando R$ 24 milhões.