O técnico Vítor Pereira costuma chamar os jogadores pouco badalados e formados na base do Corinthians de miúdos — garotos na língua portuguesa da terra de Camões. Segundo o lusitano, se não fosse a juventude deles, o elenco farto de trintões como Willian, Renato Augusto, Giuliano, Cássio, Paulinho, Fágner, Júnior Moraes e Fábio Santos estaria brigando para evitar o rebaixamento no Brasileirão.
Entre veteranos e caçulas, Vítor Pereira usou 12 jogadores formados nas categorias inferiores do Corinthians na goleada por 4 x 0 contra o Santos, quarta-feira, na Neo Química Arena, pelo duelo de ida das oitavas de final da Copa do Brasil. Um deles nascido no Distrito Federal. Em 22 de outubro de 2020, o Correio Braziliense contou a história de Robert Renan Alves Barbosa. O menino da expansão do Setor O, em Ceilândia, ganhava espaço no Corinthians no Campeonato Brasileiro Sub-17.
Dois anos depois, ele acaba de comemorar o título do Torneio Internacional do Espírito Santo com a Seleção Brasileira sob o comando do técnico Ramón Menezes. Vestiu a camisa 4 na competição. Na Copa do Brasil, acumula milhas com o técnico Vítor Pereira. Havia sido titular em Londrina no empate por 1 x 1 com a Portuguesa-RJ na terceira fase do mata-mata nacional. O sarrafo aumentou na última quarta-feira. Robert Renan saiu do banco de reservas, aos seis minutos do segundo tempo, para substituir o lesionado João Victor no primeiro clássico paulista como jogador profissional.
A atuação segura rendeu elogios de Vítor Pereira. "O Robert, não sei se repararam, logo que entrou no jogo, meteu um passe que é um dos mais difíceis de entrar. Geralmente, lateralizam esse passe, deixam para outra pessoa, mas quando se tem confiança, qualidade, ele faz o que fez. Isto quer dizer algo da confiança dele, da qualidade dele, agora tem que crescer. Mas tem muito potencial, é um jogador, como vários que temos, jovem e vão alçar outros voos, sem dúvida nenhuma. Para mim, vai ser um zagueiro de referência. É rápido, é técnico, tem personalidade", afirmou Vitór Pereira na entrevista coletiva depois do clássico. Um colaborador de Vítor Pereira conta que ele gosta do miúdo porque sabe jogar, arrisca passes e é um zagueiro canhoto que dá lançamentos como camisa 10.
Equilíbrio
Robert Renan não se empolga. "Seguimos em busca dos nossos objetivos e com muita humildade", publicou nas redes sociais.
Parceiro do brasiliense desde a base do Corinthians, Gustavo Mantuan ficou assustado com a frieza do amigo diante do bando de loucos. "Você viu o Robert, né? Ele entrou e parece que nem sentiu o jogo. É um moleque de Seleção, tem muita qualidade."
Dezessete anos mais velho do que Robert Renan, o experiente goleiro Cássio tentou passar experiência ao zagueiro, mas quem disse que precisou? "Eu perguntei para o Robert se ele tinha se sentido bem. Ele estava feliz. Ele é dedicado, trabalha. O Robert tem ido com frequência para a Seleção, é um menino bom, então acho que ele tem a vontade de aprender, se dedica diariamente", observou o capitão.
Trajetória
Em 2020, o Correio contou que Robert Renan é filho do rapper Roberto Barbosa da Silva, 38 anos, do grupo Sobreviventes de Rua, em atividade desde 1997. O zagueiro também aventurou-se nos palcos de Ceilândia quando criança. Mas o encantamento pela bola o hipnotizou. O pai, conhecido no meio musical como Preto Beto, canta a rotina e os desafios dos moradores das periferias urbanas: das mulheres trabalhadoras às crianças que brincam na rua. Ao lado de Henrique EXP e Buda, o grupo de rap usa a cultura como mecanismo de transformação social.
De São Paulo, Preto Beto falou ao Correio sobre a alegria de ver o filho em alta na Seleção Sub-20 e no Corinthians. "Sensação indescritível. Fico muito grato a Deus, aos familiares e amigos que participaram desse processo", emocionou-se. Pai coruja, ele contou como foi a rotina de ontem do filho. "Treinou no período da tarde e está muito feliz", testemunhou.
Robert Renan deixou o DF para morar sozinho aos 13 anos. Evoluiu no Novorizontino e desembarcou no Parque São Jorge em 2019. Fã de Gil, mora com os país no Tatuapé, bairro da Zona Leste de São Paulo. A mãe, dona Renata Alves, largou o emprego em uma loja de acessórios de carro para acompanhar o xodó.
Para o pai, Robert Renan joga por música e mereceu até um rap. "Sabe a área de risco que você falou?/ Eu tava lá dançando na chuva, na beira do abismo/ Profissão perigo, passado virou nosso chão/Enfrentando o medo, futuro nosso da expansão."