Era uma vez, um menino chamado Wilton Pereira Sampaio. Nascido em Teresina de Goiás, cidade localizada a 505km de Brasília, ele queria ser jogador de futebol. Posou de lateral, zagueiro e atacante até aceitar a vocação de árbitro. O garoto passou a mediar jogos amadores no município de pouco mais de 3 mil habitantes e decidiu levar o talento a sério um quadradinho do mapa do Brasil. Arrumou as malas e desembarcou na capital do país, aos 15 anos. Quatro anos depois, concluiu o curso da Federação de Futebol do Distrito Federal e conquistou fãs. Um deles alertou o então chefe da arbitragem da CBF, Armando Marques (1930-2014), para o talento do jovem juiz. No entanto, era ignorado.
Certa vez, Brasília recebeu um encontro de profissionais de arbitragem da Região Centro-Oeste. Armando Marques veio ao evento. Estimulado a observar Wilton Sampaio, olhou o juiz de cima em baixo e disse ao interlocutor: "Aquele é o árbitro? Esquece! É muito baixinho", descartou.
Marques foi lembrado de que o brasileiro Romualdo Arppi Filho não tinha estatura elevada e mediou a final da Copa de 1986 entre Argentina e Alemanha, no México. Nada o convenceu a dar moral a Sampaio, de 1,73m.
Em 2005, o escândalo da Máfia do Apito mudou a história. Sampaio não teve nada a ver com a manipulação de resultados, mas a crise encerrou a Era Armando Marques na CBF. Ele ocupava o cargo havia oito anos. Assumiu em 1997 e saiu em 2005. A mudança tornou o "baixinho" gigante a cada escala de jogo.
Wilton Sampaio cresceu. Vinculado à FFDF, passou a ter o nome indicado ao quadro da Fifa, mas o amigo Sandro Meira Ricci tinha o distintivo. O quadrado havia ficado pequeno demais para os dois. Em 2012, Sampaio topou convite para vincular-se à Federação Goiana. Virou padrão Fifa e trilhou o caminho rumo à Copa. Acumulou milhas em torneios nacionais e internacionais de ponta. No ano passado, apitou a Copa Árabe, último evento teste do Qatar antes do Mundial. Foi a prova final de que o "baixinho" descartado por Armando Marques estava, sim, à altura de ser um dos 36 árbitros da Copa.
Além dele, o paulista Raphael Claus representará o Brasil. O país não tinha dois selecionados desde a edição de 1950. Bruno Boschilia, Rodrigo Figueiredo, Bruno Pires e Danilo Simon são quatro dos cinco bandeirinhas.
A outra é uma mulher. Numa sinalização da Fifa pelo fim do machismo, a auxiliar Neuza Inês Back será a primeira brasileira a participar do torneio masculino. Além dela, a entidade escalou as árbitras Stéphanie Frappart (França), Salima Mukansanga (Ruanda) e Yoshimi Yamashita (Japão). Também irão ao Qatar as auxiliares Karen Díaz Medina México) e Kathryn Nesbitt (EUA).
Em entrevista ao Correio, o árbitro da final da Copa de 1982, Arnaldo Cezar Coelho, avaliou a escolha dos brasileiros. "Foi justa. O mais significativo é a indicação da menina como assistente. Mulheres têm melhor visão periférica que os homens. Sempre defendi essa tese. Ela é ótima."