FUTEBOL CANDANGO

A lição do ABC

Ascensão do clube de Natal para a Série C deixa Brasília como única das 12 sedes da Copa 2014 que só terá times na última divisão do Brasileirão 2022 e derruba discurso de que o legado fortaleceria equipes da capital

O argumento de que a construção do Mané Garrincha — estádio mais caro da Copa de 2014, erguido por R$ 1,6 bilhão —, serviria para ajudar a desenvolver o futebol candango é uma falácia comprovada pela acesso de um tradicional clube do Rio Grande do Norte para a Série C do Campeonato Brasileiro. Com a ascensão do ABC, Brasília passa a ser a única das 12 cidades sede do Mundial de sete anos atrás que só terá clubes de futebol na quarta divisão, a última do país. Além do ABC, subiram no fim de semana passado Atlético-CE, Campinense-PB e o vizinho goiano Aparecidense.

Com mais um fracasso coletivo de Brasiliense e Gama nesta temporada, o DF continuará atolado na Série D em 2022. As vagas são do atual campeã candango Brasiliense e do vice, Ceilândia.

Caberá aos dois ou a um deles tirar a capital da inércia. A última vez que o quadrado teve representante na Série C faz oito anos. De lá para cá, a dura realidade é participar da quarta divisão. O Gama não passou da fase de grupos. O Brasiliense foi eliminado pela Ferroviária-SP no primeiro mata-mata, ou seja, nem sequer figurou nas oitavas de final.

O fundo do poço do futebol candango é comprovado pela comparação com a evolução de alguns estados anfitriões da Copa de 2014. Mato Grosso, por exemplo, onde foi inaugurada a Arena Pantanal, é representado pelo Cuiabá na elite do Campeonato Brasileiro. No ano do Mundial, o Luverdense era o melhor representante na região. Figurava na Série B. Aquela foi a primeira temporada em que o futebol candango só disputou a quarta divisão. Rebaixado na C em 2013, o Brasiliense representou a capital ao lado do Luziânia — time do entorno goiano federado no DF.

Anfitrião da Copa do Mundo com a Arena da Amazônia, Amazonas também caminhou no Brasileirão. Há dois anos, o Manaus subiu da Série D para a C. Nesta temporada, tem a oportunidade de dar mais um salto de qualidade. O time é vice-líder do quadrangular semifinal da terceira divisão. Soma cinco pontos no Grupo D, um atrás do Novorizontino. Ocupa a zona de acesso à Série B. O estado não tem representante na segunda divisão desde a edição de 2006, quando o São Raimundo caiu para a terceira divisão. Independentemente do desfecho da campanha do Manaus na Série C, a evolução é mais que evidente. No ano passado, temporada de estreia na terceirona, o time ficou em quinto lugar na primeira fase e quase participou do quadrangular final.

Nesta temporada, o DF e o Rio Grande do Norte, onde foi erguida a Arena das Dunas, eram as duas unidades da federação que só tinham times na Série D.

O futebol potiguar conseguiu amenizar um pouco o vexame. O ABC eliminou o Caxias por 3 x 0 nas quartas de final e carimbou acesso à C. O América-RN só não subiu de mãos dadas com o arquirrival porque perdeu nos pênaltis para o Campinense-PB.

Com isso, o Distrito Federal passa a ser a única das 11 unidades da federação anfitriãs da Copa de 2014 a ter representantes somente na Série D do Brasileirão. Amazonas, Bahia, Ceará, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e São Paulo também têm na quarta divisão, mas ostentam equipes na C, B, A ou em pelo menos uma destas três.

Ausente na Série A desde 2005, quando o Brasiliense caiu para a segunda divisão, o DF — oitavo colocado no ranking do Produto Interno Bruto (PIB) nacional está fora da elite há 16 anos. Na melhor das hipóteses, voltará a figurar entre os grandes em 2025. Para isso, Ceilândia ou Brasiliense necessitam de acessos em três anos consecutivos, a partir de 2022. Fundado em 2000, o Jacaré conseguiu na fase dourada. Conquistou a Série C em 2002, a B em 2004 e debutou na elite em 2005.

Promessa de S.O.S em ano estratégico

Parceiro do Flamengo via Banco de Brasília (BRB), o Governo do Distrito Federal acenou na semana passada com a possibilidade de turbinar o incentivo ao Candangão em 2022 — coincidentemente ano de eleições.

O aporte financeiro ao clube carioca e o apoio a partidas do time rubro-negro na cidade são criticados veladamente pelos presidentes dos clubes da cidade.

Aos cartolas, o governador Ibaneis Rocha fez promessas no último dia 13. “Espero que possamos avançar para que o Candangão tenha uma boa edição e, assim, resgatarmos o futebol do DF. Contem com o nosso apoio dentro do que for possível”, declarou.

A contribuição seria via BRB. “Vamos sentar com a federação para desenhar o campeonato do ano que vem. Esperamos estimular o vínculo dos cidadãos com os times daqui, apoiar a profissionalização e avanço dos times locais e reforçar a imagem do futebol brasiliense”, afirmou o presidente da estatal, Paulo Henrique Costa.

Em 28 de julho de 2020, o banco assinou protocolo de intenções do Programa de Incentivo ao Desenvolvimento do futebol do Distrito Federal em cerimônia no Palácio do Buriti. Ficou acertado investimento de R$ 5 milhões até o fim do mandato de Ibaneis Rocha, em 2022. No entanto, o saque da verba esbarra na falta de transparência dos clubes locais.

O Correio mostrou, nos últimos dois anos, que apenas três times que disputaram as últimas duas edições do Candangão publicaram balanço financeiro dentro do prazo, como exige a Lei Pelé: Brasiliense, Capital e Gama.

Mas inclusive os dois times mais populares da cidade lidam com problemas extracampo. Ambos não tiveram acesso à verba do programa para a Série D de 2020 e 2021 por falta de certidões negativas como FGTS, INSS, fiscal, trabalhista... “Se quisermos esse crescimento precisamos nos profissionalizar. O governo tem nos apoiado. Eles viram, da nossa parte, uma iniciativa de mudança e resgate do futebol do DF. Temos muito o que melhorar ainda, mas estamos trabalhado para isso”, disse no evento o presidente da Federação de Futebol do DF, Daniel Vasconcellos. (MPL)