Aos 46 anos, o deputado federal Felipe Augusto Lyra Carreras (PSB-PE) foi escalado na última quarta-feira para atuar em mais uma posição estratégica no tabuleiro político do Congresso Nacional. O presidente da Comissão do Esporte da Câmara dos Deputados jogará, também, como relator da Comissão Especial para Modernização da Lei Pelé. Carreras formará dupla com a deputada Celina Leão (PP-DF). Ambos serão responsáveis por tocar o trabalho que tem a missão de dar um “F5” na norma em vigor desde 1998.
Na entrevista a seguir ao Correio, o pernambucano torcedor do Sport explica o que motivou a instalação da comissão, indica como funcionará o trabalho e opina sobre temas polêmicos. Critica o desequilíbrio no peso dos votos na eleição da CBF, defende o projeto dos clubes para criação de uma liga nacional independente da CBF e questiona a transformação do Ministério do Esporte em secretaria, um puxadinho da Cidadania.
O que precisa ser modernizado urgentemente na Lei Pelé?
Várias questões mudaram no mundo esportivo desde 1998. São 23 anos. Existe uma grande reivindicação para atualizá-la, torná-la mais justa e atual. A Comissão servirá para discutirmos, de forma democrática, com atletas, paratletas, clubes, associações esportivas, comunidade acadêmica, profissionais de educação física, técnicos, árbitros, federações, confederações e o COB. Todos terão vez e voz. Em 1998 praticamente nem internet existia. O esporte precisa estar mais perto da população vulnerável. O esporte é uma grande ferramenta de transformação social.
E os principais pontos a atualizar?
Vamos discutir questões como eleições de federações e confederações, pois muitas se perpetuam com os atuais critérios. A Lei de Incentivo federal, buscando uma paridade com a cultura, talvez. A distribuição dos recursos das loterias e buscar novas fontes de receita para o esporte, como os jogos de apostas on-line, que não geram impostos e contribuições para o setor. A questão dos direitos de transmissão e arena, o Plano Nacional do Desporto (PND), valorização dos profissionais de educação física e equipamentos que promovem atividades físicas, como academias, clubes... Devemos avançar na formação de nossos atletas para além do esporte. Vamos revisitar vários pontos e construir outros. Um exemplo é a possibilidade dos jogos eletrônicos serem considerados esporte.
O senhor falou em perpetuação no poder. Acha justo o colégio eleitoral da CBF, em que o voto das federações tem peso 3, dos 20 clubes da Série A, peso 2, e dos 20 times da Série B, peso 1?
Isso precisa ser revisto, sim. O jogo me parece desequilibrado. Vamos discutir com profundidade, serenidade e transparência.
O que pensa sobre clube empresa?
Desde que essa transformação seja feita com toda a transparência e seja saudável para o esporte e preserve a cultura e tradições dos clubes, não vejo maiores problemas. Vamos estudar exemplos onde aconteceu na Europa e ver os resultados. Estamos vivendo em outros tempos. Vamos debater sem audiências públicas.
É favorável à criação da Liga, um Brasileirão desvinculado da CBF?
Vejo com bons olhos a organização de ligas de clubes. Mas o ideal seria que a CBF e seus clubes filiados se entendessem, com os pedidos dos clubes e interesses, principalmente dos atletas, que são os grandes protagonistas do espetáculo. Com um diálogo honesto e franco, dá para resolver e ficar bom para todos os lados. Vamos dialogar com todos os lados na comissão.
Tem posição sobre a nova edição da MP do Mandante?
Na segunda-feira (amanhã), inclusive, teremos uma audiência na Comissão do Esporte para discutir o assunto. Vamos ouvir o que cada um tem a pleitear para chegarmos a uma ideia segura. Convidamos entidades com diversos pontos de vista. Não vamos admitir politização do tema.
Como a CBF tem interagido?
A CBF será ouvida, assim como outras entidades, como clubes, federações e os próprios atletas e seus representantes. Todos poderão se manifestar. Sem favorecimento a nenhuma entidade.
Até que ponto a crise na CBF, com afastamentos e demissões, terá interferência na comissão?
A autorização da criação da comissão por parte do presidente Arthur Lira simboliza que essa legislatura e seu comando terão a coragem de sair da zona de conforto que interessa a alguns. Tenho muito respeito à entidade CBF. Está passando por momento delicado, mas o problema da política na CBF não influenciará em nada na Comissão.
A saída de Walter Feldman quebra elo entre a CBF e o Legislativo?
Lamento bastante, pois sempre foi uma pessoa íntegra, que agrega bastante e tem um canal de diálogo fácil com o parlamento. Afinal, já foi da casa. Tem experiência em gestão esportiva. Fará muita falta para o esporte brasileiro. Conhece tudo dentro da CBF e sempre se mostrou prestativo aos debates.
O Flamengo tem sido muito ativo em Brasília. Como lidar com o forte lobby do clube carioca?
O Flamengo é um grande clube e tem uma imensa torcida, mas somos a favor da igualdade. Vamos ouvir o Flamengo como qualquer outro clube da Série A, B, C ou D. Vamos falar sobre o bem do futebol no geral. Afinal, é um patrimônio esportivo/cultural do nosso povo. Nenhum clube ou entidade está acima disso.
Como se blindar das pressões?
Vamos ouvir todos de forma democrática. Estamos focados e determinados a mudar para bem, para o justo. E coragem não falta. Seremos muito rígidos com os nossos princípios. A nossa bancada é a do esporte, é a da justiça.
Tem dialogado com a presidente da comissão, deputada Celina Leão?
Celina tem se mostrado uma grande aliada na luta pela evolução do esporte nacional. É uma grande entusiasta do esporte, é praticante de esporte e tem uma força política muito grande. Tem excelente relação com o presidente (da Câmara) Arthur Lira e deu uma imensa contribuição para instalarmos esta comissão.
Qual é a sua principal bandeira?
Pensamos no esporte como inclusão social. É fundamental utilizá-lo para formar cidadãos, tirar jovens da criminalidade, dar oportunidades. Aproximar das periferias e áreas mais pobres e vulneráveis do país, que sequer têm espaços para prática esportiva. Na pandemia, aumentou bastante a quantidade de jovens entre 15 e 29 anos que nem estudam nem trabalham. Temos que incluir essas pessoas e o esporte pode ser a ferramenta.
Acha certo o Ministério do Esporte ter virado secretaria, puxadinho da Cidadania na Esplanada?
O esporte sempre foi o último da fila quando se fala em investimentos do governo federal. Acabar com o Ministério do Esporte foi profundo desrespeito com o setor. Falar em fusão e virar puxadinho para economizar é pura hipocrisia. Que alguém prove o quanto economizou. Vamos lutar para Ministério do Esporte voltar.
O F5 na Lei Pelé não se resume aos esportes de alto rendimento…
Penso sempre em aumentar as políticas públicas para os paratletas, às mulheres e outras modalidades. É importante valorizar os profissionais de educação física. Isso ficou evidente na pandemia. Sem atividade física, a imunidade cai. O esporte tem que deixar de ser o último da fila.
Como a comissão pretende atacar o racismo e a homofobia?
Temos que exigir respeito dos outros e fazermos nossa parte diariamente. É um assunto tão antiquado, tão retrógrado, mas, infelizmente, recorrente, que chega aperta o peito ter que comentar sobre isso em pleno ano de 2021. Vamos estudar aumentar a pena para esse tipo de crime no esporte.