A tão desejada obsessão palmeirense se tornou realidade de forma apoteótica. Em final disputada, ontem, no estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, o Palmeiras venceu o Santos, por 1 x 0, e conquistou o bicampeonato da Copa Libertadores. O roteiro da decisão beirou o inimaginável, com o gol do título sendo marcado por um jogador contratado recentemente e que não figurava entre os principais nomes da decisão. Entalado desde 1999, o grito do torcedor palmeirense saiu da garganta somente no minuto 98, com a eternização de um herói improvável na história do clube paulista.
Antes de comemorar, porém, o palmeirense precisou superar um jogo marcado por tensão, equilíbrio e poucas chances concretas de gol. Em campo, as duas equipes transpareceram nervosismo e os efeitos do forte calor da tarde carioca fizeram com que Palmeiras e Santos encontrassem dificuldades de se libertar ofensivamente. Nos primeiros 45 minutos, os santistas lamentaram jogadas não aproveitadas por Pará e Marinho, enquanto os palmeirenses ficaram com o grito entalado na garganta em jogadas de Rony, Raphael Veiga e Luiz Adriano. Nada mais exigiu grande trabalho dos goleiros.
Na etapa final, as defesas continuaram se sobressaindo frente aos ataques. O ritmo lento das principais estrelas das equipes faziam com que o zero teimasse em seguir no marcador. Esperança santista, Marinho esteve apagado e pouco incomodou. Do lado alviverde, Luiz Adriano também encontrava dificuldades de se desvencilhar da ferrenha marcação rival. A primeira finalização a gol saiu somente aos 35 minutos, quando Felipe Jonatan e Pituca chutaram em sequência e assustaram o goleiro Weverton.
Minuto 98
Toda a monotonia que marcava a decisão tomou rumos diferentes nos acréscimos do segundo tempo. Tentando esfriar o jogo, o técnico Cuca protagonizou uma troca de empurrões em uma disputa pela bola fora de jogo com Marcos Rocha, que tinha pressa para cobrar um lateral. No desentendimento, o árbitro argentino Patricio Loustau puxou o cartão vermelho e expulsou o técnico santista. A fagulha da confusão acabou esquentando uma partida que parecia fadada à prorrogação.
No minuto 98, uma brecha apareceu pela ponta esquerda do ataque palmeirense. Rony recebeu a bola e cruzou o céu do estádio do Maracanã para encontrar a cabeça de Breno Lopes. O herói improvável do alviverde subiu mais alto do que o lateral-direito Pará e cabeceou com perfeição, mandando a bola na bochecha da rede do goleiro John Victor, que nada pôde fazer. Na comemoração, o camisa 19 correu para a torcida e iniciou, ali, a vibração pela conquista do bicampeonato do Palmeiras.
Quem se eternizou, vibrou. “Não tem explicação, é só agradecer a Deus, a esse grupo… Estou muito feliz de fazer história no Palmeiras. Espero ter mais conquistas com essa camisa, que é de muito peso”, comemorou Rony. “Eu me tornei capitão do Palmeiras com muito trabalho, muita humildade. Entro para a história, um grupo seleto de campeões da Libertadores. Carimbamos uma página linda de um clube tão grande”, acrescentou o volante Felipe Melo.
Da Série B para o topo da América
Antes da bola rolar, quando perguntado quem marcaria o gol da conquista, qualquer torcedor do Palmeiras teria na ponta da língua nomes mais badalados, como os atacantes Luiz Adriano e Rony ou o meio-campista Raphael Veiga. Nenhum alviverde, porém, imaginaria que o bicampeonato da América sairia da cabeça de um jogador com pouco menos de três meses de casa. Aos 53 minutos, Breno Lopes saltou alto para garantir a obsessão alviverde e entrar, definitivamente, na história do clube.
Contratado em meados de novembro, Breno Lopes chegou ao Palmeiras como nome desconhecido do grande público. Natural de Minas Gerais, o atacante de 24 anos estava disputando a Série B do Campeonato Brasileiro com o Juventude. Deixou a divisão de acesso como vice-artilheiro do torneio, com nove gols marcados, para o maior desafio da carreira. No Palmeiras, o jogador recebia a primeira oportunidade em um grande clube do futebol brasileiro. Em 17 jogos, havia marcado apenas uma vez.
Eleito melhor em campo pela Conmebol, Breno Lopes foi chamado pelo técnico Abel Ferreira somente aos 39 minutos do segundo tempo. Aos 53, aproveitou cruzamento de Rony e subiu no segundo andar e garantiu a Libertadores para o Palmeiras. Eternizou-se na história alviverde. “A partir do momento que se aceita esse desafio, tem de estar preparado para todas as coisas. O Palmeiras me deu confiança. Havia muita desconfiança no meu nome e hoje estou provando que tenho condição de jogar aqui”, disse, ao apito final.
Celebrando o primeiro título da carreira, Breno transbordou tranquilidade ao descrever o sentimento de ser o responsável pela alegria dos milhões de alviverdes espalhados pelo Brasil. “A ficha demora a cair, mas eu sabia o quanto o torcedor queria esse título. O clube buscava há tempos e hoje entro para história. Estou muito feliz e não sei explicar a emoção. É um dia inesquecível. É só comemorar”, vibrou. “O destino é incrível e hoje ele foi abençoado”, acrescentou o técnico Abel Ferreira. (DQ)
Segundo português no topo
Contratado pelo Palmeiras em novembro, Abel Ferreira entrou para a história alviverde com a conquista da Libertadores da América. O português se tornou o segundo profissional do país a realizar o feito, se juntando ao compatriota Jorge Jesus, campeão com o Flamengo em 2019. O torneio foi, ainda, o primeiro título da carreira profissional. “Nós, treinadores portugueses, compartilhamos conhecimento. Ele conseguiu ter sucesso, assim como eu”, analisou.
Convidados se aglomeram
Contrariando o protocolo da Organização Mundial da Saúde (OMS) contra a covid-19, as arquibancadas do estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, registraram aglomerações entre os 2,5 mil torcedores convidados pela Conmebol para acompanhar a final entre Palmeiras e Santos. As cenas contrastavam com as consequências do período pandêmico no país. Até ontem, dia do jogo, o Brasil registrava mais de 220 mil mortes provocadas pela doença.
Com apenas um setor do estádio aberto, o sistema de som repetia insistentes anúncios de segurança. Os pedidos, porém, foram ignorados na maior parte do tempo por palmeirenses e santistas, que desrespeitaram o distanciamento social e a obrigatoriedade do uso de máscara em diversos momentos. Antes da bola rolar, a Conmebol chegou a interditar fileiras de cadeiras com faixas, mas a medida não foi respeitada.
Aos 52 minutos, o técnico Cuca provocou tumulto. Após ser expulso de campo, o treinador pulou a mureta que separa o gramado das arquibancadas do Maracanã com o intuito de acompanhar os minutos finais da partida ao lado dos torcedores alvinegros. Os santistas, alguns sem proteção, rapidamente se aglomeraram ao redor do treinador que, em novembro, contraiu a doença e ficou 11 dias internado, sendo quatro deles na UTI. Das cadeiras, o comandante alvinegro viu o gol do título do Palmeiras. (DQ)