BRASILEIRÃO

Política de boa vizinhança

Eleições em 11 dos 20 clubes da Série A tumultuam governos de transição em calendário atípico. Novas gestões são obrigadas (ou não) a tolerar gerentes e comissões técnicas dos antecessores até fevereiro

O calendário eleitoral de 11 dos 20 clubes da Série A do Brasileirão provoca situações embaraçosas nesta virada de ano. Enquanto velhos presidentes preparam-se para desocupar a cadeira, vencedores nas urnas articulam a montagem dos novos gabinetes e causam desconforto dentro das quatro linhas. Como a temporada 2020 só terminará em fevereiro de 2021 devido à pandemia do novo coronavírus, o entra e sai em pleno período de transição de governo precisa ser administrado com o mínimo de tensão possível sob pena de colocar tudo a perder.

Líder isolado do Brasileirão, o São Paulo tem novo presidente. Julio Casares triunfou nas urnas último dia 12. É o sucessor de Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco. A política causa efeitos colaterais no departamento de futebol do tricolor paulista. Casares oficializou o convite ao ex-técnico Muricy Ramalho para o cargo de coodenador de futebol. A função é parecida com a exercida, atualmente, pelo ídolo Raí. Consequentemente, há ruído.

“Como a notícia (do convite a Muricy Ramalho) vazou, eu quero reafirmar a vocês que, no começo da semana, sentei na minha casa com Raí e fiz o convite para que ele continue como diretor-executivo até o final do Campeonato Brasileiro”, explicou o presidente eleito Julio Casares. Por enquanto, o discurso é de manutenção, também, da comissão técnica. “Não há hipótese nenhuma de mexer (em Fernando Diniz)”, banca.

Na última sexta-feira, Raí aceitou permanecer no cargo de diretor-executivo até fevereiro. Ele pretende concluir o trabalho que pode tirar o São Paulo da fila de 12 anos sem título brasileiro. Em contrapartida, o gerente-executivo de futebol Alexandre Pássaro não permanecerá no clube no mandato de Julio Casares.

Vice-líder da Série A, o Atlético-MG também acaba de eleger novo presidente. Sucessor de Sérgio Sette Câmara, o xará dele, Sérgio Coelho, coloca em xeque um dos principais nomes da gestão anterior. “Quanto ao Alexandre Mattos e demais diretores do Atlético e pessoas que exercem cargos de chefia, estamos avaliando um por um e conversando. Esses profissionais serão escolhidos e firmados ou não depois da minha posse”, comentou. O contrato de Mattos expira em 2021. “Gosto muito do (Jorge) Sampaoli, acho que ele tem características importantes para um grande treinador. É trabalhador, pessoa séria, correta.Tem a cara do Atlético. Se envolve, vibra, luta”, disse.

O Internacional acaba de levar ao poder Alessandro Barcellos. Ele herdará o clube de Marcelo Medeiros. O atual mandatário contratou Abel Braga depois da saída de Eduardo Coudet para o Celta de Vigo, da Espanha. Apesar do histórico do treinador campeão da Libertadores e do Mundial de Clubes da Fifa em 2006, o novo presidente sonha com o espanhol Miguel Angel Ramírez, campeão da Copa Sul-Americana 2019 pelo Independiente del Valle. O treinador, inclusive, se despediu do clube equatoriano na última sexta-feira.

“É um grande nome e tem outros especulados que reconheço como importantes. Conversamos com vários profissionais e, à medida em que a gente venha a definir alguma mudança, seja em dezembro ou fevereiro, vamos comunicar. É importante para quem assume o clube no meio da temporada, buscando afirmar um novo projeto, que se tenha a busca por alternativas à medida que não sabíamos se teríamos o técnico. Não tínhamos essa informação. Felizmente, a equipe começa responder melhor as ideias de Abel”, pondera.

O Corinthians vive tempos de calmaria depois de se afastar da zona de rebaixamento ao vencer o clássico contra o líder São Paulo na semana passada. Porém, o clima segue quente na montagem da equipe do presidente eleito Duílio Monteiro Alves. O sucessor de Andrés Sanchez ainda não sinalizou sobre a permanência do técnico Vágner Mancini. Entretanto, cogita um cargo na direção de futebol para o ex-presidente Roberto de Andrade, mandatário do clube paulista no triênio de 2015 a 2018. O relacionamento entre ambos é bom. Os atuais diretores-adjuntos de futebol deixarão o departamento em janeiro.

Enrolados
A eleição em alguns clubes anda em marcha lenta. A do Coritiba, por exemplo, seria no último dia 12, mas a prefeitura proíbe aglomerações em tempos de novo coronavírus e adiou o pleito para o próximo dia 29, de forma virtual. A do Goiás segue indefinida. Provavelmente, ocorrerá em janeiro. Se o ano virar sem um sucessor eleito para Marcelo Almeida, assumirá o presidente do Conselho, Hailé Pinheiro. O Sport deveria ter novo mandatário desde o último dia 17, porém, uma guerra de liminares trava o processo eleitoral.

 

Com uma bomba nas mãos

As mudanças presidenciais são mais tensas nos clubes da parte inferior da classificação. Eleito pelo Botafogo para o quadriênio de 2021-2024, Durcelio Mello faz figas para não herdar de Nelson Mufarrej um time rebaixado pela terceira vez para a segunda divisão. O Glorioso caiu para a Série B nas edições de 2002 e 2014. O time é o lanterna da primeira divisão. “Não temos muito o que fazer no futebol, agora, é conversar com os jogadores. O time foi montado pela atual diretoria, não há como mudar”, lamenta o dirigente eleito em 24 de novembro.

Em situação um pouco mais confortável do que o Botafogo na classificação, o Vasco briga para evitar o quarto rebaixamento da história. Isso é tudo o que o novo presidente, Jorge Salgado, não quer. Confirmado pela Justiça como novo mandatário cruzmaltino, o dirigente trabalha na montagem da diretoria e pensa alto.

O empresário de 73 anos, fundador da Ativa Investimentos, cogitou a volta de Rodrigo Caetano ao clube, monitora a situação de Raí no São Paulo e está próximo de fechar com o zagueiro brasiliense Lúcio para o cargo de embaixador internacional. O campeão mundial em 2002 é vascaíno.

O Bahia passa um perrengue neste fim de temporada. Eliminado da Sul-Americana nas quartas de final, o time se concentra, agora, na missão de permanecer na primeira divisão. Reeleito com 86% dos votos, o presidente Guilherme Bellintani sabe que a queda pode abalar financeiramente as contas do clube em tempos de pandemia. O único título da equipe neste ano foi o Campeonato Baiano. Amargou o vice na Copa do Nordeste.

“O triênio é de executar, entregar o que prometi na campanha, uma mudança grande na política do futebol. Que tenhamos mais acertos. O torcedor pode esperar uma atuação enérgica para conseguir, em campo, no segundo mandato, a evolução que conseguimos fora de campo no primeiro mandato”, prometeu Bellintani.