Virou tradição. Quase todo ano, o futebol brasileiro costuma colocar na vitrine times que encantam e, pela eficiência, destacam-se como sensações da temporada. Na última década, foi assim com o Santos da dupla Neymar e Paulo Henrique Ganso em 2011; com a Portuguesa, apelidada de “Barcelusa” na avassaladora campanha na Série B do Campeonato Brasileiro de 2011; e o Flamengo, campeão da Série A e da Libertadores com um futebol de encher os olhos sob o comando de Jorge Jesus, em 2019. Neste ano, a força vem do Pantanal.
Em ascensão no cenário nacional e com uma campanha consistente na Série B do Campeonato Brasileiro, o Cuiabá vem chamando a atenção com o projeto retomado em 2009. Consolidado no G-4, o time do Mato Grosso está em terceiro lugar, três pontos atrás da líder Chapecoense. Nesta terça-feira (27/10), às 20h30, a equipe começa a caminhada nas oitavas de final da Copa do Brasil diante do Botafogo, no Estádio Nilton Santos. O Cuiabá entra na competição nas oitavas por ter conquistado a Copa Verde na temporada passada.
A justificativa para o sucesso está no projeto de longo prazo do clube. “É reflexo do planejamento feito nos últimos anos, dos objetivos conquistados e do investimento realizado em todas as áreas de estrutura e pessoal. Obviamente, os resultados ajudam muito a ter crescimento. Estamos trabalhando com os pés no chão, conscientes das dificuldades de conseguir alcançar os objetivos, mas, com certeza, o que pensamos lá atrás vem dando resultado”, diz o vice-presente do Cuiabá, Cristiano Dresch, ao Correio.
Fundado como projeto de uma escolinha pelo ex-centroavante Gaúcho (1964-2016), campeão brasileiro pelo Flamengo, em 1992, o Cuiabá passou a disputar competições profissionais em 2003. Nos dois primeiros anos na elite do Mato Grosso, o Dourado arrematou o bicampeonato estadual. Estreou na Série C do Campeonato Brasileiro e Copa do Brasil em 2003 e 2004, respectivamente. Em 2007, porém, razões financeiras ameaçaram o projeto. O clube ficou dois anos licenciados de competições oficiais.
Milagre no Serejão
A retomada começou em 2009. Impulsionado pela realização da Copa do Mundo no Brasil, o Grupo Dresch adquiriu o Cuiabá. “De lá para cá, tivemos vários momentos decisivos difíceis. As vitórias decretariam a continuação ou não do investimento”, recorda Cristiano. Um dos momentos cruciais para o sucesso teve como palco o estádio Serejão, em Taguatinga. À época, o Cuiabá disputava a Série C do Brasileirão e brigava contra o rebaixamento. Um jogo contra o Brasiliense provocou a guinada na história do clube.
Qualquer tropeço no Distrito Federal decretaria a queda e poderia brecar a sequência do planejamento. O Cuiabá venceu o Jacaré por 2 x 1, iniciou a arrancada e concretizou a permanência na terceira divisão. “Foi o momento mais crucial na história do clube. Por coincidência, em Brasília. Só podíamos ganhar o jogo. Se caíssemos para a Série D, seria um balde de água fria em tudo e eu não sei se o projeto teria seguido. Esse, para mim, foi um dos pontos principais que nos levou até aqui”, elege Dresch, pontuando, ainda, o acesso para Série B, em 2018.
Na luta pelo meio ambiente
Além do sucesso em campo, o Cuiabá teve êxito em um desafio comum ao dos clubes do futebol candango: movimentar um estádio da Copa de 2014. Ao contrário do Mané Garrincha, ocioso durante boa parte da temporada, a Arena Pantanal ganhou o status de casa do time mato-grossense.
O espaço é gerido em parceria com o governo local com um custo pequeno de locação. “Tivemos uma boa média de público no ano passado na Série B e jogamos com a capacidade máxima de 43 mil pessoas. Nossa torcida está crescendo e acaba sendo uma questão atrelada ao resultado”, comemora Cristiano Dresch.
O clube também se engaja nas questões ambientais. Neste ano, o Pantanal enfrentou problema crítico de queimadas. Em 19 de setembro, contra o Oeste, pela Série B, a fumaça causada por um dos maiores incêndios na região invadiu a Arena Pantanal. As queimadas dificultaram a visibilidade dos jogadores antes da partida. O Cuiabá, até havia entrado em campo com uma faixa de conscientização sobre o problema.
Um dos planos do clube é impulsionar a mensagem do problema ambiental enfrentado na região pantaneira. A ideia é conscientizar sobre a necessidade de prevenção. “Moro no Mato Grosso há 40 anos e nunca tinha visto nada parecido com isso. O Cuiabá e o futebol, em geral, têm uma função social muito grande. É preciso se engajar no combate a esse crime ambiental que foi cometido aqui”, alerta o vice-presidente do clube.
O fundador que não curtiu o sucesso do Cuiabá
Ídolo do Flamengo, o ex-atacante Gaúcho morreu em 2016. O camisa 9 rubro-negro no título brasileiro de 1992 teve relação íntima com o Cuiabá. Fundador e presente na profissionalização do clube, ele contribuía em todos os detalhes. Participou até da escolha da mascote Dourado, e da criação do hino do time.
“Ele foi iluminado quando decidiu fundar um clube com o nome da cidade, com as cores verde e amarela, o obelisco, símbolo da cidade, e por trazer para o clube a história vitoriosa dele”, destaca o vice-presidente Cristiano Dresch.
Além da personalidade de Gaúcho, Dresch cita um viés pouco conhecido do ex-jogador: o espírito de empreendedorismo. “Ele marcou história em grandes clubes e era um excelente gestor. O Gaúcho era muito bom administrador e teve sucesso logo no primeiro ano. Tínhamos uma relação muito boa, até acabou se desgastando um pouco com o tempo, mas permaneceu. O clube já fez várias homenagens. Ele será lembrado eternamente”.