A rotina é um elemento fundamental para o desenvolvimento de crianças e jovens. Além de possibilitar um maior aproveitamento das atividades de aprendizagem, garante que eles se sintam acolhidos e seguros e que desenvolvam autonomia. Diante da privação do convívio no ambiente escolar, que naturalmente estabelece regras e horários, é importante que, especialmente durante a pandemia, o lar espelhe esta rotina e que se dê continuidade a atividades intelectuais, físicas e sociais, dentro do possível.
“É preciso que esse espaço seja organizado, porque isso traz uma segurança para a criança. A organização impõe um limite, impõe os termos, isso deixa a pessoa mais segura. A rotina, as regras no lar e as regras na escola, é importante para dar essa ideia de socialização, pertencimento e conscientização do outro”, explica o psicopedagogo Eugênio Cunha, doutor em educação. De acordo com o especialista, a falta de regras e de limites em casa pode culminar em episódios de desobediência e rispidez das crianças.
Para Alice Happ Botler, professora de educação e sociologia na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), é importante que os pais mantenham diálogo com os filhos. “Na medida em que você conscientiza e informa, a criança passa a constituir sua própria autonomia. Mas o adulto tem que mobilizar o sentido para isso. E escutar, principalmente. Tem que procurar entender qual a dificuldade da criança e auxiliá-la.”
Além disso, a professora defende a importância de manter a rotina o mais próximo possível de como era durante o período de aulas presenciais. “Ou seja, você toma café, dá banho, veste o uniforme, porque isso também faz a criança associar ao ambiente escolar e ela é colocada em um espaço em que vai ficar em contato direito com professor para poder desenvolver as atividades com concentração”, observa.
Os especialistas alertam também para a necessidade de flexibilização de alguns horários e preservação das atividades de lazer. A capacidade de atenção de crianças em videoconferências é reduzida, então, é necessário que haja uma adaptação. “É importante não expor excessivamente as crianças às telas do celular e intercalar as atividades escolares com outras que possam dar um respiro à mente, uma descontração, um momento mais lúdico e menos estressante”, avalia Eugênio Cunha.
Pais e filhos
É necessário que os pais também tenham uma rotina — a organização precisa ser familiar. “As crianças aprendem, geralmente, pelo espelho. Então, elas reproduzem o que os adultos mais próximos fazem”, explica Tiago Aquino Paçoca, diretor da Brincadeiras e Jogos, plataforma de compartilhamento de conhecimentos em educação. Além disso, ele defende a importância de envolver as crianças nas tarefas domésticas de casa para construção da autonomia e formação cidadã delas.
“O adulto é responsável por incentivar, mas a criança é responsável por resolver a tarefa. Após ser contemplada pela criança, é importante a celebração dessa conquista, o reconhecimento pela atividade bem-sucedida”, defende o educador.
A criação de quadros pode ser uma boa solução, na medida em que materializa a lista de tarefas. É um recurso utilizado pelas escolas que pode facilmente ser transportado para dentro dos lares, com murais ou quadros divididos entre dias e horários. “O quadro é importante porque deixa a mensagem de forma concreta. A criança até 8 ou 9 anos tem uma mente muito abstrata. Sabe o ditado ‘Não está entendendo? Quer que eu desenhe?’ Quando você escreve, desenha, monta um mapa, a criança se localiza na situação”, relata Tiago Aquino.
Gabriel Ribeiro, 11 anos, está no 6º ano do ensino fundamental e conseguiu se adaptar bem à nova rotina. De acordo com o pai, Ivan Antonio Ribeiro, 55, ele é dedicado e tem bastante autonomia nas atividades escolares, sem esquecer também a hora do lazer. “Ele gosta de assistir sozinho às aulas. Mas, mais tarde, quando tem dúvida em alguma matéria, acaba perguntando e a gente dá o apoio”, relata o pai.
“A única coisa que ele ainda não tem, que eu acho que é um problema para todos, é o contato com os amigos dele”, conta Ivan. Além disso, a falta da prática de futebol também precisou ser substituída por exercícios em casa. “Às vezes, ele faz sozinho. Outras vezes, fazemos todos juntos.”