A pandemia de covid-19 nos obrigou a mudar. Criamos novos hábitos, aprendemos a nos relacionar a distância, passamos a ficar mais em casa e a conviver mais tempo perto daqueles com quem dividimos o nosso lar. O impacto foi enorme nas crianças e nos adolescentes, que precisaram adaptar-se, da noite para o dia, a uma nova realidade no cotidiano educacional. E isso teve um forte reflexo emocional.
O especial Novas diretrizes da educação, do Correio Braziliense, trouxe para o debate a orientadora pedagógica do Colégio Marista Asa Sul, Sara Azevedo. O tema: dicas de educação para orientar seu filho a lidar com as emoções. “A pandemia é um momento muito novo para todos, inclusive de aumento do tempo que passamos dentro de casa. A depender do turno do colégio, os filhos saíam pela manhã e alguns ficavam em período integral ou, ainda, em atividades complementares de esportes. Crianças com necessidades especiais faziam acompanhamento com especialistas para dar continuidade ao desenvolvimento. Famílias e jovens não estavam acostumados com a casa, e esse desajuste aconteceu para todos.”
Tamanha mudança na rotina acaba provocando uma nova realidade para todos dentro de casa. O que antes se fazia apenas no tempo livre, esporadicamente, agora precisa ser ampliado para várias horas ao dia. “Um exemplo: tem criança que adora montar blocos, tem adolescente que adora cozinhar. É a oportunidade de fazer com que o adolescente saia do quarto, do contexto do on-line. Então, é propor: minha filha, vamos fazer um bolo hoje? Isso dá horas de tranquilidade e harmonia na casa. A mesma coisa é montar com a criança. Faz com que eu me sinta tranquilo, acolhido, e a harmonia chega”, destaca Sara.
Nesse contexto, a aproximação entre família e escola é fundamental. Assim, a instituição de ensino consegue entender a rotina daquela casa, como a criança está inserida naquele contexto. “A primeira pergunta: quem é a criança que queremos que chegue à vida adulta? A partir daí, precisamos olhar. Uma criança com autonomia, que resolve suas questões, que o adulto apoia, mas que não faz por ela. Se ela, desde pequena, organiza-se, guarda pertences, sabe da sua rotina, essa autonomia vai costurando a questão socioemocional”, explica a especialista.
Competências socioemocionais
Com todos esses elementos em evidência, o Colégio Marista Asa Sul atua no desenvolvimento de competências socioemocionais em projetos e disciplinas presentes em todos os segmentos e faixas etárias. Na educação infantil, atividades lúdicas e projetos de investigação ajudam as crianças a identificar e começar a lidar com seus sentimentos e emoções. A instituição conta, por exemplo, com o projeto Asas da Infância, que visa incorporar nas aulas on-line e, posteriormente, nas presenciais, atividades lúdicas de cunho motor e cognitivo que possam reestabelecer vínculos e motivar as criancas.
O projeto, que inicia em setembro, promoverá momentos que favorecem o desenvolvimento das capacidades motoras, corporais e culturais associadas às habilidades socioemocionais. As atividades vão desde dança criativa a contação de histórias, oficinas de meditação e espiritualização orientada, resgate de brincadeiras antigas e combinados de nanoatitudes a serem cumpridas no dia a dia.
No ensino fundamental, as crianças desenvolvem Projetos de Intervenção Social, em que exercitam seu protagonismo e podem escolher a melhor forma de trabalhar o tema proposto, seja com ações na comunidade e na família, seja na comunidade escolar. Já no ensino médio, os jovens são convidados a pensarem no seu projeto de vida e em qual a trajetória que desejam seguir após a formatura, além de ajudar na escolha profissional.
“Cada colégio precisa ter essa inteligência de entender que não apenas aquilo que é cognitivo, que é pedagógico, tem que ser oferecido”, aponta Sara. Ela ressalta que é necessário oferecer também momentos para os meninos rirem juntos, ainda que diante da tela do computador. “Propomos que as crianças tenham momentos de interação, como a hora do lanche, em que atuam mais livremente. É exatamente nesse momento que a convivência acontece de forma independente e orgânica.”
Sara destaca que a educação híbrida chegou para ficar, independentemente da pandemia. Por isso, foi preciso também uma adaptação dos professores. “Inicialmente, tínhamos professores inseguros de darem aulas on-line, pois eles entram na casa da família”, afirma. E, em meio ao isolamento social, perdeu-se aquele contato próximo diário em sala de aula. Por isso, Sara orienta o corpo docente a encontrar formas de estabelecer conexões com os estudantes. “Eu sempre falo: ‘Fique mais 10 minutos aqui, converse, porque o professor tem o feeling de saber quem precisa dele, que aquele olhar, aquela fala que a criança trouxe na tela não estava tão bacana. Ele consegue acolher. Essa criança, no outro dia, volta diferente porque foi ouvida.”
A importância do adulto
E quando, no meio desta pandemia, vem aquele pico de ansiedade que provoca birra, faz a criança cair no choro e se descontrolar, não querendo mais assistir às aulas on-line? A orientadora pedagógica do Marista Asa Sul, Sara Azevedo, explica que o adulto é de uma importância fundamental nesse momento. O primeiro passo é entender a causa dessa explosão, o chamado gatilho que desencadeou essa reação.
“Nem sempre a criança vai falar. Às vezes, chora, faz xixi na cama. Tem que entender de onde está vindo essa ansiedade. Se a criança não quer o on-line naquele momento, as escolas estão muito preparadas para atender essas famílias e escutá-las. O que eu posso combinar com essa casa, o que posso melhorar para que a ansiedade diminua?”, afirma. Então, é momento de propor alternativas para acalmá-la. “É brincar com um amigo? Que tal propor um encontro entre essas crianças? Ou fazer um cartaz e mostrar de dentro do carro. É sugerir: você está longe do seu amigo, mas eu vou brincar com você. Vamos montar essa torre? Isso vai diminuindo a ansiedade da criança?”
Nesse sentido, Sara ressalta que a mesa de refeições é fundamental. O almoço e o jantar são excelentes momentos para compartilhar angústias e buscar soluções em familia. “Sentar à mesa, falar sobre isso, é muito bacana. Estamos passando por uma pandemia e os horários vão mudar, o sono também. Isso tudo precisa ser combinado”, exemplifica.
E não existe uma regra. Cada família tem a sua necessidade. Se há alguma criança menor em casa é preciso obedecer o ritmo dela. “Por mais que o nosso ritmo tenha se descontrolado um pouco, a criança menor tem hora para comer, para dormir, para tomar banho. Essa rotina bem estabelecida traz segurança. Com isso, tudo funciona melhor.”