
O Brasil precisará resolver os problemas de insegurança jurídica e de imprevisibilidade se quiser atrair mais investimentos para o agronegócio, setor estratégico para a economia nacional. Esse foi um dos pontos-chave levantados por autoridades e especialistas convidados para o CB Fórum: Cenário dos Investimentos Estrangeiros no Agronegócio Brasileiro, realizado ontem na sede do jornal.
O investimento estrangeiro é essencial para a economia brasileira, com aplicação em diversos setores. Mas enfrenta dificuldades regulatórias e legais. Entre os temas que precisam ser debatidos com urgência está a regulamentação do uso de terras por estrangeiros. Para muitos especialistas, a atual legislação é anacrônica.
Autor de um projeto de lei que delibera sobre a compra, a posse e o arrendamento de propriedades rurais no Brasil, o senador Irajá Silvestre (PSD-TO) disse haver "preconceito" contra investimentos estrangeiros no agronegócio. Segundo o parlamentar, o capital estrangeiro já está presente em diversas áreas estratégicas da economia nacional.
“Não é possível que ainda existam pessoas que tenham algum tipo de preconceito com esse tipo de investimento. O bom investidor estrangeiro respeita as leis brasileiras, respeita a nossa soberania, gera emprego e traz inovação e tecnologia”, disse Silvestre. A proposta do parlamentar foi aprovada no Senado e está em análise na Câmara.
Presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o deputado federal Pedro Lupion (PP-PR) defendeu a necessidade de enfrentar o tema, ainda que seja controverso. Ele disse que na Câmara há um debate maior que no Senado, com divergências até na própria FPA. Mas avaliou o projeto do senador Irajá Silvestre como “extremamente positivo”.
“Não tem como simplesmente fecharmos as portas para esses investimentos, mas precisamos equilibrar isso com a preocupação sobre a soberania nacional”, pontuou, ressaltando a questão das terras em regiões fronteiriças.
Lupion defendeu sobriedade no debate. “É um tema que a gente tem que tratar com razoabilidade técnica e não ideológica. Infelizmente, vira um debate ideológico absurdo nos extremos, tanto da extrema-esquerda quanto da extrema-direita. Na esquerda, criam cenários apocalípticos de que compras de terras por estrangeiros destruiriam a soberania, de que os chineses tomariam conta de tudo. São narrativas que a gente sabe que são completamente irreais e que impedem o avanço de um debate técnico, efetivamente”, disse o deputado.
“É óbvio que tem muita gente, muito mais gente que poderia estar investindo aqui, que não está investindo por causa da burocracia. E uma burocracia completamente atrapalhada, que gera consensos completamente equivocados e permite discursos e posicionamentos mais ideologizados nesse tema. Então, a gente precisa conseguir, efetivamente, botar esse tema no dia a dia do Congresso e debatê-lo frontalmente, ou seja, apresentando propostas”, disse o presidente da FPA.
Também partidário de uma solução urgente para o impasse, o senador Silvestre criticou a lentidão por parte do Estado em resolver a questão. “A gente tem que entregar ao país um marco regulatório compatível com a realidade”, afirmou. “Uma terra sem dono é uma terra sem lei. E é assim que se encontram milhões e milhões de hectares no Brasil”, alertou.
Logística preocupa
Tanto Lupion quanto Silvestre lembraram que os investimentos estrangeiros podem ajudar em um problema crônico do agronegócio nacional: os gargalos logísticos. A falta de um escoamento adequado para a produção em um país de dimensões continentais pode deixar o Brasil em uma posição de “atraso” frente a outras economias do mundo.
O senador tocantinense comparou o modal rodoviário brasileiro com a hidrovia do Rio Mississipi, nos Estados Unidos. “É incompreensível que a gente continue insistindo em um modal mais caro e poluente, quando poderíamos investir em hidrovias, que reduzem pela metade o custo do transporte e são muito mais viáveis do ponto de vista ambiental”, afirmou. Segundo ele, o transporte hidroviário poderia baixar o custo da tonelada da soja exportada de US$ 110 para US$ 70.
O deputado Pedro Lupion, por sua vez, ressaltou os problemas com armazenamento, em prejuízo à previsibilidade da produção. “Nosso armazenamento é um caminhão indo para o porto ou para a cooperativa”, resumiu. “Falta um investimento contundente em armazenagem e silos, como ocorre nos Estados Unidos e na Europa”, observou. O presidente da FPA comentou ainda que o capital estrangeiro já tem contribuído para melhorar os sistemas de irrigação no país, fundamentais para diversas culturas.
Protagonismo
Modernizar a legislação, de modo a atrair mais investimentos, pode levar o país a fortalecer seu protagonismo em um contexto de rápidas mudanças econômicas. Na avaliação do ex-senador Romero Jucá (MDB-RR), o Brasil, embora seja “o maior player ambiental do mundo”, precisa tomar as rédeas da regulamentação no setor, pensando, principalmente, em expandir suas exportações para a Europa.
Para Jucá, o país precisa superar a ideia de que a sustentabilidade consiste apenas na preservação ambiental e trabalhar para promover o equilíbrio econômico. “Nós estamos, infelizmente, em uma linha ambiental antiga, ultrapassada. Sustentação ambiental hoje não é preservação. Sustentação ambiental hoje é equilíbrio econômico. O melhor negócio para o futuro será salvar o planeta”, disse Jucá.
O ex-senador afirmou que o Brasil só atingirá seu potencial econômico máximo quando passar mais credibilidade para o mundo. “A economia vive de expectativa. Vive de credibilidade. Se a gente cria uma discussão de não ter credibilidade nas decisões jurídicas, não ter credibilidade na discussão dos contratos sociais, não ter credibilidade e previsibilidade no resultado econômico do investimento, a gente não será nunca o país que a gente precisa ser, com o potencial todo que a gente tem”, concluiu.
ESG é fonte de riqueza, diz Gilmar
Convidado para o encerramento do CB Fórum, o ministro decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, destacou as potencialidades do agronegócio brasileiro em meio ao protagonismo da agenda sustentável no ambiente de negócios. Segundo ele, “é preciso buscar equilíbrio entre a economia, o bem-estar social e o meio ambiente”.
Gilmar Mendes lembrou que, ao longo da história, o agronegócio brasileiro desenvolveu-se majoritariamente a partir da exploração extrativista, intensiva e não sustentável de recursos naturais, frequentemente desacompanhada de análises de impactos socioambientais e de governança.
Com o Acordo de Paris, assinado em 2015, “o tema ambiental tornou-se o centro da diplomacia atual e orientador da agenda de organizações e agências internacionais de investimentos”, observou o ministro. E ressaltou: “O agronegócio tem o potencial para assumir um papel estratégico, tornando-se um agente indutor de práticas sustentáveis e um aliado fundamental para o desenvolvimento econômico responsável”.
Agenda ESG
Com o avanço da Agenda ESG (Environmental, Social and Governance — Ambiental, Social e Governança), Mendes afirmou que se faz necessário pensar em um novo modelo de produção. “É preciso o compromisso de pensar um futuro diferente para o nosso país, dando vazão a um pacto civilizatório”, enfatizou.
O ministro ressaltou ainda que a exploração de terras brasileiras por estrangeiros não pode ser alvo de radicalização. “É fundamental que nós tenhamos todos os cuidados para analisar essas questões com múltiplas perspectivas, sobretudo para restabelecermos a capacidade de diálogo”, disse.
Neste momento, o decano do Supremo considerou oportuna a realização do CB Fórum. “Aí está mais uma vez a importância de eventos como esse, que nos convidam a pensar coletivamente em linha com a boa governança e a gestão democrática de nossos recursos naturais e humanos”, encerrou.
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Israel Medeiros
RepórterSetorista no Congresso Nacional. Foi editor no Poder360, analista político e tem passagens pelo Brasil 61 e TSE. Tem especialização em macroeconomia e finanças internacionais.

Rafaela Gonçalves
RepórterJornalista formada pela Universidade Católica de Brasília (UCB). Atua na cobertura econômica e política desde 2019. Tem passagens pelo portal Brasil 61 e Coluna Esplanada.