
O investimento estrangeiro em terras rurais no Brasil está no centro de discussões econômicas e jurídicas, diante do impasse regulatório e dos impactos potenciais no setor agropecuário e mineral. Um estudo da LCA Consultoria Econômica indica que restrições à aquisição e ao arrendamento de terras por empresas brasileiras com capital estrangeiro podem prejudicar o crescimento econômico do país.
Desde 1971, a Lei 5.709 impõe limites à compra de terras por estrangeiros. Em 2010, a Advocacia-Geral da União (AGU) ampliou as restrições, equiparando empresas brasileiras com capital estrangeiro a pessoas jurídicas estrangeiras. Essa interpretação motivou uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 342, em análise no Supremo Tribunal Federal (STF).
O estudo da LCA destaca que empresas estrangeiras têm papel fundamental nos setores intensivos em terra, como agropecuária, mineração e produção florestal. Dados apontam que essas empresas são responsáveis por 22% dos empregos nesses setores e representam 4% da massa salarial das empresas que recebem Investimento Direto no País (IDP). Além disso, essas corporações foram responsáveis por 34,3% das exportações de bens e serviços em 2022, com um saldo positivo de US$ 44,2 bilhões na balança comercial.
Para o economista Bernardo Gouthier Macedo, da LCA, a restrição ao capital estrangeiro pode desencadear uma onda de insegurança no setor: “Identificamos 113 transações entre 2010 e 2023 envolvendo empresas que utilizam terras rurais em suas operações. A incerteza jurídica pode levar à venda forçada de ativos, disputas judiciais e inviabilização de investimentos, o que traria impactos econômicos negativos expressivos”.
Insegurança jurídica
Um caso rumoroso reflete essa insegurança. A aquisição do complexo industrial da Eldorado Celulose, em Três Lagoas (MS), pela Paper Excellence, criou um impasse com a J&F. A J&F alega que a empresa estrangeira deveria ter obtido autorização prévia do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e do Congresso Nacional. A Paper, por sua vez, argumenta que comprou um complexo industrial, não terras. Caso prevaleça a interpretação mais restritiva sobre a compra de terras, fusões e aquisições no setor rural podem ser travadas, impactando diretamente o mercado e os atos jurídicos previamente celebrados.
Para o advogado Francisco Godoy, especialista em direito agrário, a legislação atual não reflete a dinâmica dos negócios modernos. “A Lei 5.709/71 foi criada sob um paradigma fundiário ultrapassado. Hoje, terras rurais são utilizadas para usinas fotovoltaicas, exploração de óleo e gás, mineração e até projetos imobiliários. As restrições dificultam investimentos essenciais para o desenvolvimento do Brasil”, afirma.
A insegurança jurídica também impacta o mercado de fusões e aquisições. “Se todos os investimentos que envolvem terras rurais tiverem que passar pelo Incra, o órgão precisaria ser reestruturado para lidar com a complexidade dos negócios”, pontua Godoy.
Na próxima semana, o Correio promoverá a edição do CB Fórum, com o tema “Cenário dos investimentos estrangeiros no agronegócio brasileiro”. O evento será realizado no dia 25, a partir de 9h30, no Auditório do Correio Braziliense. O evento contará com três paineis. O primeiro falará dos Investimento Estrangeiro no Agronegócio Brasileiro; o segundo sobre Investimentos Estrangeiros e Terras Rurais; e o terceiro sobre Insegurança jurídica para o estrangeiro investir no Brasil.