A falta de jovens no campo preocupa o futuro do agronegócio em Minas Gerais. Entidades do setor, como a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg) e a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater–MG), identificam razões para o afastamento da juventude do meio rural. Em resposta, desenvolvem estratégias para atrair essa faixa etária de volta e promover a sucessão familiar no campo.
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Silvana Novais, gerente da Mulher, do Jovem e de Inovação do Sistema Faemg Senar, aponta algumas das causas para a ausência da juventude no campo, um fenômeno em crescimento. Entre os fatores, destaca o êxodo rural, que, nessa faixa etária, está principalmente ligado à mudança de cidade para fins educacionais. Com essa transferência, Silvana observa que o jovem acaba se distanciando da rotina do agronegócio.
“É preciso ter um olhar atento sobre como apresentar as potencialidades do agro a eles, lembrando que tiveram a oportunidade de conhecer o mundo. Esse é o maior desafio: mostrar que o agro pode ser parte do futuro, assim como qualquer outra profissão, e que eles podem viver da propriedade”, afirma Silvana.
Para a gerente, outro desafio para a permanência das novas gerações no campo é o uso da tecnologia. “Precisamos que a tecnologia chegue à propriedade para que eles queiram ficar. Não vão querer permanecer isolados, utilizando as mesmas ferramentas que os pais e avós usavam”, afirma.
Otávio Maia, presidente da Emater-MG, endossa as questões levantadas por Silvana Novais e destaca que o envelhecimento da população no campo e o êxodo de jovens são realidades do meio rural mineiro. Segundo ele, existem várias razões por trás desse fenômeno, mas elas se resumem à falta de oportunidades.
"O jovem busca melhores condições de vida. Muitas vezes, no campo, ele não encontra essas oportunidades. Por isso, acaba buscando estudos e empregos nas cidades”, afirma Otávio Maia. No entanto, o presidente da Emater-MG alerta que essa expectativa pode ser uma ilusão, pois é comum os recém-formados se mudarem para as cidades e se depararem com condições precárias.
Jovens no agro
Luiza Cabral, de 19 anos, faz parte do grupo de jovens que escolheram não seguir no agro, embora sua trajetória tenha sido ligada ao meio rural até então. A estudante conta que cresceu no campo, filha de um fazendeiro em Santo Antônio do Jacinto, no Vale do Jequitinhonha, e cursou o ensino médio com técnico em zootecnia no Instituto Federal de Almenara.
“Ao longo do curso, eu me afastei da fazenda do meu pai e passei a me concentrar mais na escola. Houve um desinteresse”, conta Luiza. Ela também menciona que a perspectiva do retorno financeiro no campo foi um fator importante para decidir seguir outro caminho. A família de Luiza também a incentivava a explorar outras áreas. “Meu pai dizia que uma médica pode ser médica e fazendeira, mas uma fazendeira não pode ser médica”, relata.
Atualmente, Luiza presta vestibular para Medicina, mas não descarta a vida no campo em seu futuro. Sua expectativa é conseguir conciliar a medicina e a fazenda, inclusive por meio de investimentos no agro. “Não é porque decidi não fazer uma faculdade nesse ramo agora que, no futuro, não possa retornar. Eu vim dele e gosto muito”, afirma.
A trajetória de Giovana Oliveira, de 18 anos, é semelhante à de Luiza. A jovem cresceu imersa no agro, em razão da fazenda do pai, localizada a 3 km de Palmópolis, município na Região do Vale do Jequitinhonha, onde morava. Aos 15 anos, também se deslocou para Almenara para cursar técnico em zootecnia no Instituto Federal.
Diferente de Luiza, com os estudos, Giovana afirma que “a paixão só aumentou. Fui adquirindo aprendizados e colocando-os em prática”. Atualmente, ela cursa o segundo semestre de Medicina Veterinária em Vitória da Conquista, na Bahia, e vê seu futuro no universo agro.
Para Giovana, o diferencial para seguir no ramo agropecuário foi ter tido mais autonomia e participação na propriedade do pai durante a pandemia e, mais tarde, quando ele foi diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica. Naquele período, Giovana realizava diversas atividades, como manejo sanitário, pesagem dos animais, venda de gado e castração de carneiros. Atualmente, seu plano é continuar com a fazenda do pai, trabalhar para outras pessoas e também para si mesma. “Se tiver oportunidade de emprego, pretendo atender a região”, afirma.
Maratona Faemg
Estratégias para motivar a sucessão familiar e aumentar a presença e a liderança da juventude no campo têm sido implementadas por entidades ligadas ao agro. Uma delas é a Maratona Faemg Jovem, que, de acordo com Silvana Novais, tem como objetivo mostrar à nova geração, na prática, o que é o segmento. O projeto também busca aproximar os jovens dos sindicatos rurais.
“Formamos equipes de jovens associadas aos sindicatos de produtores rurais, e essas equipes devem realizar uma série de atividades, como escrever e implementar projetos, além de redigir um relatório final sobre o impacto da ação”, explica Silvana. As equipes, compostas por pessoas de 18 a 30 anos, recebem pontuações com base nas atividades entregues. Ao final, os três grupos com mais pontos são premiados.
A cerimônia de gratificação da Maratona Faemg Jovem, segunda edição do projeto, aconteceu na última quarta-feira (20/11), durante a abertura da Semana Internacional do Café. O evento também contou com uma programação voltada para potenciais empreendedores e produtores da cafeicultura, reunindo mais de 1.200 participantes. De acordo com o Sistema Faemg, o projeto contou com a inscrição de mais de 67 equipes e a participação direta de 420 jovens, com o tema deste ano sendo “Pensar globalmente, agir localmente”.
A equipe do Sindicato de Produtores Rurais de Santo Antônio do Amparo, localizado no Centro-Oeste de Minas, foi a vencedora da maratona deste ano. Para conquistar o prêmio, os participantes precisaram desenvolver cinco projetos técnicos e cinco sociais. Dayane Andrade, integrante da equipe, relata que todos os projetos abordaram a região do Campo das Vertentes, na mesorregião de Minas.
"A maioria dos jovens da equipe são cafeicultores e deram continuidade à sucessão familiar. Alguns já estão na terceira geração. Como vivenciamos isso, é muito gratificante compartilhar esse conhecimento e tentar engajar a juventude para que também sigam no campo", explica Dayane, proprietária da Berilo Cafés Especiais.
Além de eventos como a Maratona Faemg Jovem e encontros, Silvana destaca que o Sistema Faemg Senar incentiva os sindicatos de produtores rurais a formar grupos de jovens e a estabelecer diálogo com eles. A gerente também menciona o CNA Jovem, programa em parceria com o Senar, que tem como objetivo formar lideranças no setor agropecuário em nível nacional.
Futuro no Campo
Por sua vez, Otávio Maia também destaca algumas medidas da Emater-MG voltadas para os "novatos". Entre elas, o projeto Futuro no Campo, que foca na capacitação, no fomento e na implementação de um projeto produtivo assistido pela Emater. O público-alvo são jovens de 16 a 29 anos, agricultores, filhos de agricultores ou aqueles inseridos no núcleo de uma propriedade rural.
Com essa ação, a Emater dá o pontapé inicial no projeto e oferece assistência técnica contínua. “O que nós queremos com esse programa é otimizar a sucessão rural: o jovem interessado em permanecer ou retornar para o campo”, diz Otávio. O presidente da Emater-MG ressalta que acredita no dinamismo e na capacidade de implementar inovações das novas gerações.
“O inscrito em apicultura, por exemplo, receberá um kit do projeto, capacitações em formato virtual e presencial, e acompanhamento técnico por 12 meses. O extensionista da Emater-MG guiará os participantes, desde o início do trabalho até a parte de comercialização da produção. Além da capacitação na área específica, estarão disponíveis também capacitações na área de gestão do empreendimento”, explicou o coordenador técnico estadual da Emater-MG, José Custódio do Nascimento Júnior, à Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais.
O Futuro no Campo atenderá 500 jovens e englobará os projetos Jovens do Café, Jovens do Leite e Jovem Empreendedor Rural — com foco em olericultura, fruticultura, apicultura e avicultura de postura. O valor para implantação do programa é de cerca de R$ 2 milhões. As inscrições para a próxima edição foram encerradas na última sexta-feira (22/11) e o resultado será divulgado no site da Emater-MG até o próximo dia 2 de dezembro.
* Estagiária sob supervisão de Rafael Oliveira