
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, fez um balanço da gestão à frente da autoridade monetária, nesta quinta-feira (19/12), e admitiu que a intervenção no câmbio da instituição foi resultado do comportamento atípico do fluxo de moeda estrangeira, e garantiu que o câmbio continua flutuante e que “o BC tem muita reserva (cambial) e vai atuar quando for necessário”.
“Nós entendemos que começou a ter uma saída atípica (de dólares) no fim do ano. A parte de dividendos paga pelas empresas estava acima da média. A gente começou a perceber que o fluxo financeiro estava bastante negativo”, afirmou Campos Neto, aos jornalistas, durante a apresentação do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), ao lado do futuro presidente do BC, Gabriel Galípolo, em que a autoridade monetária elevou as estimativas para o Produto Interno Bruto (PIB) e para a inflação.
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Ao justificar os leilões realizados hoje, Campos Neto afirmou que o BC começou a ver uma saída maior de pessoas físicas e de volume menores de operações, o que justificou a nova intervenção no câmbio na segunda série. “A gente vai continuar monitorando o fluxo e a gente entende que nesse período que o fluxo é acima da média, o BC vai atuar da forma como está atuando”, afirmou. Ele disse que a intervenção atual não tem a ver com o risco de dominância fiscal e o BC não busca um patamar para o dólar. “Não fazemos projeções de câmbio”, frisou.
O presidente do BC reforçou que as intervenções recentes no mercado de câmbio à vista estão em uma interpretação que está ocorrendo para combater as disfuncionalidades do mercado. Ele reforçou que atuação histórica da autoridade monetária mostra uma reação da disfuncionalidade no fluxo e não porque houve piora dos prêmios de risco. “A nossa função é reorganizar o rumo”, disse.
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Apesar das intervenções do BC no mercado hoje, o dólar comercial continuava a registrar alta e chegou a ser negociado a R$ 6,32, e, após a fala de Campos Neto, recuou para R$ 6,14. Além dos US$ 3 bilhões anunciados ontem, o BC injetou mais US$ 5 bilhões nesta manhã. E, desde o último dia 16, foram injetados US$ 12,9 bilhões no mercado.
Galípolo e Campos Neto negaram a possibilidade de uma reunião extraordinária do Comitê de Política Monetária (Copom) por conta da forte desvalorização do câmbio. “A gente deu um passo claro e transparente de colocar a taxa de juros num patamar restritivo. A gente está caminhando nessa direção”, afirmou Galípolo. Ele, inclusive, negou que esteja ocorrendo ataque especulativo sobre o real.
Apesar de o mandato de Campos Neto terminar no dia 31, ele informou que ficará no cargo até amanhã (20/12) e, depois, entrará em recesso. Com isso, Galípolo já assumirá a presidência do BC interinamente e se manterá no cargo no novo mandato a partir de janeiro de 2025.
O futuro presidente da instituição avaliou que a sinalização do Banco Central em aumentar a taxa básica da economia (Selic) em mais dois pontos percentuais na próxima reunião, elevando os juros para 14,25% ao ano em março de 2025, foi resultado da “materialização das preocupações” do BC e do mercado. Na semana passada, o BC elevou a taxa básica em 100 pontos-base, para 12,25% ao ano e deu a sinalização futura para as duas próximas reuniões. “O tamanho do anúncio eu entendo que é necessário e o importante é dizer que não há nenhuma dúvida de que o BC colocou os juros em um patamar restritivo com mais segurança”, disse Galípolo.
Problemas fiscais
O economista reconheceu que há muito ruído na comunicação junto ao mercado e, quanto à questão fiscal, voltou a afirmar que não há nenhuma bala de prata para resolver o problema. “Existem sim problemas fiscais a serem endereçados. Nenhum programa vai ser uma bala de prata e não dá para buscar falsos atalhos”, afirmou Galípolo.
De acordo com ele, as conversas recentes com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estão sendo na direção de tentar buscar um trabalho contínuo em busca do equilíbrio fiscal, e, nesse sentido, o BC não faz nenhuma orientação, apenas “transmite o que está acontecendo com as reações do mercado na formação de preços dos ativos”.
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“A política monetária está mais num concurso de beleza e não com quem a gente acha. O que importa são os preços reais e a interpretação do que está acontecendo na política fiscal”, destacou Galípolo.
Troca de bastão
Campos Neto ainda ressaltou que sempre não acreditava em recondução no cargo e que trabalhou de forma pacífica na transição com Galípolo. Para ele, nas últimas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) o peso das opiniões dos novos diretores tem sido maior do que as dele. “Entendemos que isso facilitava a passagem de bastão”, justificou.
Na avaliação de Campos Neto, mesmo com sua saída, o Banco Central estará “bem preparado e equipado” para continuar o trabalho de preservar o valor da moeda brasileira. E, nesse sentido, com a sua saída, ele frisou que continuará “defendendo autonomia e aprimoramento da autonomia do BC”.
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Segundo Campos Neto, o BC continuará perseguindo o centro da meta de inflação, de 3% com teto de 4,5%. “E vamos fazer isso da melhor forma possível, buscando credibilidade e gerando o menor custo possível para a população”, frisou. Galípolo, na sequência, reforçou a fala de Campos Neto e garantiu que, nesse trabalho de buscar a meta de inflação, o BC vai “utilizar a taxa de juros necessária”.
Em relação ao descumprimento da meta neste ano, pela terceira vez com ele à frente do BC, Campos Neto minimizou o fato, citando a pandemia da covid-19. Em relação à mudança da meta, ele disse que isso “não ganha grau de liberdade” e, sim, perde grau de liberdade”.