Com o objetivo de oferecer mais segurança jurídica, o Anteprojeto do Código de Processo do Trabalho (CPT) chegou às mãos do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), após quatro anos de trabalho da Academia Brasileira de Direito do Trabalho (ABDT). A comissão formada pelo ministro Alexandre Agra Belmonte, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), presidente do colegiado, identificou lacunas preenchidas atualmente com interpretações do Código de Processo Civil (CPC) na parte processual da Consolidação das leis do Trabalho (CLT). No Brasil, ainda não há Código de Processo do Trabalho para tratar desses dispositivos.
O ministro do TST recebeu o Correio para falar sobre o assunto. A seguir, trechos da entrevista:
Por que é necessário termos o Anteprojeto de Código de Processo do Trabalho e como isso impacta na vida das pessoas?
O impacto não é apenas para o trabalhador, mas também é para a vida do empresário e da sociedade. Temos o Código Civil, que enuncia os direitos e deveres que os sujeitos das relações jurídicas têm em sociedade, nos mais diversos campos: da economia, da família, das sucessões, e outros. E, além dele, existe o Código de Processo Civil — que regula como estar em juízo, como postular em juízo, tanto o direito de postulação como o direito de defesa, sentença, etc. No caso trabalhista, nós temos a CLT (Consolidação de Leis do Trabalho, de 1943). Nela, temos a parte dos direitos e deveres de empregados e empregadores, e também uma parte destinada, pequena, ao processo do trabalho, ou seja, como esses direitos devem ser postulados em juízo e como os empregadores devem se defender de juízo. Como são poucos os artigos, como é uma CLT e não um Código de Processo do Trabalho, o que acontece é que a lei determina que, na omissão da CLT em relação ao processo, deve ser aplicado, então, o Código de Processo Civil.
Isso significa que…
Cada juiz, a partir do momento em que se determina que a aplicação é subsidiária e que deve se aplicar o Código de Processo Civil aplica à sua maneira; a própria CLT à sua maneira. Então, ele faz uma mistura de ambos à sua maneira, e isso não é bom. Nem para os empresários, nem para os trabalhadores e nem para a sociedade, pois causa insegurança. Por outro lado, o processo do trabalho tem características muito especiais, ou seja, além da quantidade de demandas que nós temos na Justiça do trabalho, em razão da quantidade de trabalhadores, dos diversos litígios que podem ocorrer nas relações de trabalho, tanto litígios individuais como litígios de natureza coletiva. Os modelos do Processo Civil não servem. É uma camisa que não serve para vestir no processo do trabalho.
O que é necessário agora?
Nós precisamos de soluções próprias. Quando eu era presidente da Academia Brasileira de Direito do Trabalho (ABDT), durante a pandemia de covid-19, formei uma comissão para estudar a possibilidade de um Anteprojeto de Código de Processo do Trabalho, e compus uma comissão mista com advogados, procuradores do trabalho, juízes, desembargadores, ministros. Esse trabalho durou quatro anos, e está publicado. O Anteprojeto de Código do Processo do Trabalho tem várias soluções que se destinam à aplicação da lei trabalhista.
É um trabalho de aperfeiçoamento, certo?
Sim. São inúmeras situações na execução que são absolutamente específicas do processo do trabalho que não encontramos solução no Código de Processo Civil, e não é o caso de se inventar, mas, sim, de se regular para que todo mundo possa ter segurança. Trata-se de uma regulação específica para o processo do trabalho, com 991 artigos propostos.
O senhor acredita na boa aceitação desse anteprojeto no Congresso?
Acredito, sim. Ele regula o processo do trabalho, ponto. Apenas isso. O anteprojeto não tem tendências, regula da melhor forma possível, com a simplicidade característica do processo do trabalho, a rapidez característica do processo do trabalho e com segurança, que é o que estamos precisando nessas relações de natureza processual. Durou quatro anos para elaboração. Agora, quanto tempo irá tramitar no poder Legislativo, não sabemos.
O senhor acredita que a reforma trabalhista de 2017 ajudou ou atrapalhou a Justiça do trabalho?
Não é questão de ajudar nem atrapalhar. Eu penso que a reforma trabalhista foi uma reforma feita para dar maior segurança, mas que deveria ter ouvido mais o trabalhador, mais o Ministério Público, mais o Poder Judiciário. Acho que deveria ouvir mais os outros setores. Ou seja, o setor empresarial nessa reforma foi privilegiado. O equilíbrio é sempre mais interessante. Tanto assim que há inúmeras questões que estão sendo levadas ao Supremo Tribunal Federal (STF). É sinal de que houve um exagero. E esse exagero está sendo podado.
Seria o caso, então, de pensar em mais uma reforma trabalhista?
Sim. Inclusive, porque de lá para cá, várias situações em termos tecnológicos ocorreram. Precisamos de normas destinadas à proteção em relação à automação, que está na Constituição, essa necessidade, mas até hoje a norma não foi regulamentada não apenas para a proteção contra a inteligência artificial — que não é só em relação ao trabalhador — mas em relação à sociedade. Por outro lado, contra os dados que são recolhidos e o tratamento que deve ser dado em relação aos dados recolhidos do trabalhador em especial. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) tem um tratamento genérico sobre o assunto, é preciso que se tenha um tratamento específico sobre o assunto em relação ao trabalhador.