Pacote fiscal

Dólar a R$ 6 afeta o preço de produtos e pressiona a inflação

Após o mercado financeiro receber mal as medidas de contenção de gastos, a moeda norte-americana disparou. Com isso, os preços de mercadorias, como a carne, tendem a subir

A estratégia do governo de anunciar uma medida populista, com renúncia de receita do Imposto de Renda junto com o pacote de corte de gastos, na quarta-feira (27), vem fazendo um estrago no mercado de câmbio. A reação negativa dos agentes financeiros fez com que o dólar disparasse e batesse recorde por três dias seguidos.

Nesta sexta-feira (29), pela primeira vez desde o início do Plano Real, a moeda norte-americana fechou o pregão cotada a R$ 6,001 para a venda, como alta de 0,20% em relação à véspera, acumulando no ano valorização de 25%. Com isso, foi inaugurado um novo patamar no câmbio, que pode tirar o sono de quem já tem o orçamento apertado e está pensando em comprar produtos importados para o Natal ou mesmo viajar para o exterior no período das festas.

O dólar acima de R$ 5,80 é uma preocupação a mais para o Banco Central, porque as expectativas de inflação, que já estão ruins, tendem a piorar, superando os 5% para este ano, acima do teto da meta, de 4,50%. Analistas não descartam estouro da meta também em 2025. Eles lembram que os alimentos, que estão entre os vilões da inflação, podem ficar ainda mais caros com o dólar no atual patamar, especialmente a picanha do churrasco, pois os produtores vão preferir exportar mais do que vender no mercado interno.

Além disso, como o pacote anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, prevendo R$ 70 bilhões em cortes de despesas até 2026, é considerado modesto, o Banco Central vai ser obrigado a acelerar ainda mais o ritmo de alta dos juros. O piso para a taxa básica da economia (Selic) no término do atual ciclo de aperto monetário já passou para algo entre 13% e 14% anuais, mas há quem não descarte que ela poderá chegar a 15% ao ano.

“Se o Banco Central seguir os modelos para que a inflação volte para o centro da meta de 3%, no próximo ano, mesmo considerando o dólar em R$ 5,80, a Selic vai precisar ir para 15%”, alertou a economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro  do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).

Na avaliação da especialista, a forma como o governo fez o anúncio do pacote foi “um tiro no pé”. “Falar em isenção do Imposto de Renda quando o governo não consegue entregar superavit primário é algo insano e injusto. Primeiro, o governo precisa melhorar a arrecadação, equilibrar as contas para falar em renúncia fiscal”, destacou.

Atualmente, a taxa Selic está em 11,25% ao ano, e as apostas para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, nos dias 10 e 11 de dezembro, passou de 0,50 para 0,75 ponto percentual, para 12% anuais.

Contudo, Rodolfo Margato, Economista da XP Investimentos, destacou que, depois do pacote de corte de gastos frustrado, há alguns analistas que não descartam que o Copom poderá elevar a Selic em 1,0 ponto percentual. “A nossa previsão para a taxa básica no fim do ciclo de aperto monetário está em 13,25%, mas estamos fazendo uma revisão para cima”, disse Margato. “As projeções de inflação vinham piorando mesmo antes do pacote e, com certeza, vão piorar no próximo boletim Focus do Banco Central, que é um dos insumos da modelagem para as decisões do Copom. Por isso, não podemos descartar níveis mais elevados de taxas de juros”, frisou.

A insatisfação do mercado com o pacote de Haddad, que é considerado pouco crível e modesto, fez com que o dólar chegasse a ser negociado a R$ 6,115, na manhã de ontem. Nem mesmo a notícia de que o desemprego bateu a menor taxa da história, de 6,2%, animou os investidores.

Valdo Virgo - ECO-Dolar2

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